Espaço Aberto
Cuidados Geriátricos e Paliativos
Em todo o mundo, e em particular nos países ditos industrializados, a população idosa, que na definição da OMS corresponde às pessoas com 65 ou mais anos, tem registado ao longo das últimas décadas um aumento progressivo. Previsões a vários níveis apontam para que este aumento se mantenha ou acentue, em especial no sub-grupo das pessoas muito idosas, devendo os idosos ultrapassar em número, em meados do século XXI, o grupo etário das crianças e adolescentes até aos catorze anos, um fenómeno novo na história da humanidade.
Diversos factores contribuíram para este fenómeno: melhores condições de trabalho, de habitabilidade, de saneamento básico, de segurança, mas também a descoberta de antibióticos e da quase totalidade dos medicamentos que hoje se conhecem, a progressiva melhoria dos cuidados de saúde, a diminuição da mortalidade materno-infantil e por doenças infecciosas, a vacinação generalizada da população, etc.
Um estereótipo muito prevalente na população em geral, mas também entre os profissionais de saúde, é ver as pessoas deste grupo etário como portadores de multipatologia, frequentadores habituais de consultas, consumidores de fármacos e de recursos em saúde, e em geral dependentes de terceiros para a realização de actividades de vida diária.
E no entanto nem todos são assim: o grupo etário dos idosos engloba pessoas de condição física, cognitiva ou funcional muito distinta, sendo por isso uma população não uniforme nem homogénea, com uma problemática que por ser multifacetada implica uma intervenção necessariamente complexa. (1)
Uma parte substancial destas pessoas permanece saudável e activa, por vezes durante décadas, não recorrendo por isso aos serviços de saúde. Outros, porém, arrastam ao longo de anos problemas de saúde crónicos, a maior parte das vezes incuráveis, com progressiva deterioração da capacidade funcional e da sua qualidade de vida. Se o cancro constitui um paradigma da doença em fase terminal, a insuficiência de órgão (renal, pulmonar, cardíaca ou hepática), e as demências, são frequentemente mais prevalentes entre os idosos. Outros ainda aproximam-se da fase final das suas vidas pelo normal processo de envelhecimento.
Face a esta população idosa e heterogénea múltiplos desafios se colocam ao profissional de saúde: a necessidade de abordar um leque variado de patologias e de instituir terapêuticas diversificadas, dificuldades de comunicação, ausência de familiares (2) ou outros cuidadores ou pelo contrário a presença de familiares muito presentes e demandantes, constrangimentos face aos custos das terapêuticas, à necessidade de referenciar a outros níveis de cuidados, etc.
Os cuidados paliativos baseiam-se em princípios científicos rigorosos e reconhecidos internacionalmente e são uma resposta activa aos problemas decorrentes da doença prolongada, incurável e progressiva, na tentativa de prevenir o sofrimento que ela gera e de proporcionar a máxima qualidade de vida possível a estes doentes e às suas famílias. (3)
Devem por isso ser aplicados em simultâneo com os cuidados curativos, mas de uma forma mais intensa na fase terminal, quando a expectativa de vida não ultrapassa algumas semanas ou meses (embora por vezes se prolongue por anos) e as necessidades do doente e da família se tornam prementes. O objectivo dos cuidados passa então da cura para o conforto e a qualidade de vida, definindo o doente os objectivos e as prioridades. (4)
Quanto mais precocemente forem introduzidos maior relação com a equipa terapêutica se pode estabelecer, permitindo por isso a abordagem de aspectos que vão muito para além do controlo sintomático, como as expectativas do idoso face ao futuro, as suas crenças religiosas ou necessidades espirituais, problemas familiares, relacionais, financeiros ou outros ainda não resolvidos e que para ele constituam motivo de preocupação, bem como o acompanhamento e apoio à família numa fase difícil da sua vida.
A prestação de cuidados paliativos exige por isso uma formação básica adequada, tanto a nível pré como pós graduado, de forma a dar resposta às necessidades dos pacientes de todos os grupos etários e, no presente caso, dos idosos.
Ainda que com formação básica em cuidados paliativos, carecem os profissionais de saúde do apoio de equipas (comunitárias e hospitalares) de profissionais com formação e experiência mais avançadas, capazes de dar resposta a situações complexas do ponto de vista clínico, psicológico, ético, espiritual ou social, proporcionando ao doente, através da prestação de cuidados humanizados como são os cuidados paliativos, a melhor qualidade de vida e permitindo-lhe viver de forma tão activa quanto possível até à morte.
Os cuidados paliativos são por isso um direito de toda a população idosa, e por prevenirem o sofrimento e contribuírem para a manutenção da dignidade das pessoas em fim de vida são também um imperativo ético e cívico a que nenhum médico se pode escusar.
Cristina Galvão
Centro de Saúde de Beja
Assessora da Região de Saúde do Alentejo para os Cuidados Paliativos
cristinamgalvao@gmail.com
Bibliografia
1. Nazareth JM: Prefácio. In: Fernandes, A.A. (Eds.) Velhice e Sociedade Demografia, família e políticas sociais em Portugal. Oeiras: Celta, 1999.
2. Guidelines for a Palliative Approach in Residential Aged Care. The National Palliative Care Program 2006. Australian Government. National Health and Medical Research Council. Disponível em: www.health.gov.au/palliativecare [acedido em 14/12/2007]
3. Cuidados Paliativos: o que são? Disponível em: http://www.apcp.com.pt/index.php?n=cuidados-paliativos&cod=79&subCat=79 [acedido em 01/07/2009]
4. Potash J, Horst P. Palliative Care at the end of life. In: Ham RJ, Sloane PD, Warshaw GA, eds. Primary Care Geriatrics. A case-based approach. Mosby, Inc. St Louis. 2002
Diversos factores contribuíram para este fenómeno: melhores condições de trabalho, de habitabilidade, de saneamento básico, de segurança, mas também a descoberta de antibióticos e da quase totalidade dos medicamentos que hoje se conhecem, a progressiva melhoria dos cuidados de saúde, a diminuição da mortalidade materno-infantil e por doenças infecciosas, a vacinação generalizada da população, etc.
Um estereótipo muito prevalente na população em geral, mas também entre os profissionais de saúde, é ver as pessoas deste grupo etário como portadores de multipatologia, frequentadores habituais de consultas, consumidores de fármacos e de recursos em saúde, e em geral dependentes de terceiros para a realização de actividades de vida diária.
E no entanto nem todos são assim: o grupo etário dos idosos engloba pessoas de condição física, cognitiva ou funcional muito distinta, sendo por isso uma população não uniforme nem homogénea, com uma problemática que por ser multifacetada implica uma intervenção necessariamente complexa. (1)
Uma parte substancial destas pessoas permanece saudável e activa, por vezes durante décadas, não recorrendo por isso aos serviços de saúde. Outros, porém, arrastam ao longo de anos problemas de saúde crónicos, a maior parte das vezes incuráveis, com progressiva deterioração da capacidade funcional e da sua qualidade de vida. Se o cancro constitui um paradigma da doença em fase terminal, a insuficiência de órgão (renal, pulmonar, cardíaca ou hepática), e as demências, são frequentemente mais prevalentes entre os idosos. Outros ainda aproximam-se da fase final das suas vidas pelo normal processo de envelhecimento.
Face a esta população idosa e heterogénea múltiplos desafios se colocam ao profissional de saúde: a necessidade de abordar um leque variado de patologias e de instituir terapêuticas diversificadas, dificuldades de comunicação, ausência de familiares (2) ou outros cuidadores ou pelo contrário a presença de familiares muito presentes e demandantes, constrangimentos face aos custos das terapêuticas, à necessidade de referenciar a outros níveis de cuidados, etc.
Os cuidados paliativos baseiam-se em princípios científicos rigorosos e reconhecidos internacionalmente e são uma resposta activa aos problemas decorrentes da doença prolongada, incurável e progressiva, na tentativa de prevenir o sofrimento que ela gera e de proporcionar a máxima qualidade de vida possível a estes doentes e às suas famílias. (3)
Devem por isso ser aplicados em simultâneo com os cuidados curativos, mas de uma forma mais intensa na fase terminal, quando a expectativa de vida não ultrapassa algumas semanas ou meses (embora por vezes se prolongue por anos) e as necessidades do doente e da família se tornam prementes. O objectivo dos cuidados passa então da cura para o conforto e a qualidade de vida, definindo o doente os objectivos e as prioridades. (4)
Quanto mais precocemente forem introduzidos maior relação com a equipa terapêutica se pode estabelecer, permitindo por isso a abordagem de aspectos que vão muito para além do controlo sintomático, como as expectativas do idoso face ao futuro, as suas crenças religiosas ou necessidades espirituais, problemas familiares, relacionais, financeiros ou outros ainda não resolvidos e que para ele constituam motivo de preocupação, bem como o acompanhamento e apoio à família numa fase difícil da sua vida.
A prestação de cuidados paliativos exige por isso uma formação básica adequada, tanto a nível pré como pós graduado, de forma a dar resposta às necessidades dos pacientes de todos os grupos etários e, no presente caso, dos idosos.
Ainda que com formação básica em cuidados paliativos, carecem os profissionais de saúde do apoio de equipas (comunitárias e hospitalares) de profissionais com formação e experiência mais avançadas, capazes de dar resposta a situações complexas do ponto de vista clínico, psicológico, ético, espiritual ou social, proporcionando ao doente, através da prestação de cuidados humanizados como são os cuidados paliativos, a melhor qualidade de vida e permitindo-lhe viver de forma tão activa quanto possível até à morte.
Os cuidados paliativos são por isso um direito de toda a população idosa, e por prevenirem o sofrimento e contribuírem para a manutenção da dignidade das pessoas em fim de vida são também um imperativo ético e cívico a que nenhum médico se pode escusar.
Cristina Galvão
Centro de Saúde de Beja
Assessora da Região de Saúde do Alentejo para os Cuidados Paliativos
cristinamgalvao@gmail.com
Bibliografia
1. Nazareth JM: Prefácio. In: Fernandes, A.A. (Eds.) Velhice e Sociedade Demografia, família e políticas sociais em Portugal. Oeiras: Celta, 1999.
2. Guidelines for a Palliative Approach in Residential Aged Care. The National Palliative Care Program 2006. Australian Government. National Health and Medical Research Council. Disponível em: www.health.gov.au/palliativecare [acedido em 14/12/2007]
3. Cuidados Paliativos: o que são? Disponível em: http://www.apcp.com.pt/index.php?n=cuidados-paliativos&cod=79&subCat=79 [acedido em 01/07/2009]
4. Potash J, Horst P. Palliative Care at the end of life. In: Ham RJ, Sloane PD, Warshaw GA, eds. Primary Care Geriatrics. A case-based approach. Mosby, Inc. St Louis. 2002
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