Reportagem / Perfil
Entrevista ao Diretor da FMUL, Prof. Doutor Fausto J. Pinto
Na edição que marca a abertura de um novo ano académico a equipa da Newsletter entrevistou o novo diretor da escola. Fomos saber como encara este desafio.
N: Como referiu na carta de Motivação à sua Candidatura, a Direção de uma Faculdade de Medicina é um desafio. Qual a dimensão desse desafio e como o encara?
Prof. FP: Quando decidi candidatar-me, fi-lo com o sentido de dever e responsabilidade perante a Escola onde me formei, o seu futuro e sobretudo o dos seus estudantes, que procuram uma educação e formação profissional que os prepare para a Medicina do século XXI. Uma Faculdade de Medicina moderna deve ter como objetivo principal a formação de médicos. Como tal, a Direção da Faculdade tem de estar completamente sintonizada com o que é a realidade médica atual, o desenvolvimento científico e tecnológico, a inovação e a prática médica. Procurarei ser um diretor unificador, respeitando as diferenças, mas procurando encontrar os consensos necessários para conseguir as melhores soluções para a Escola e promovendo cooperação leal e efetiva com os conselhos Científico e Pedagógico, bem como com a Administração do nosso hospital nuclear de ensino e investigação e com a Direção do Instituto de Medicina Molecular, no âmbito das atribuições e objetivos do Centro Académico de Medicina de Lisboa (CAML). Estou, pois, bem ciente da dimensão extraordinária deste desafio e pronto a assumi-lo num espírito de equipa.
N: Como pensa ser possível assegurar à FMUL um lugar cimeiro como instituição de referência do ensino médico em Portugal?
Prof. FP: A origem desta casa remonta à Real Escola de Cirurgia criada em 1825 no Hospital de S. José, posteriormente designada em 1836 por Escola Médico-Cirúrgica de Lisboa e, finalmente, em 1911 como Faculdade de Medicina de Lisboa, que perdura até hoje. Várias gerações de médicos, incluindo grandes vultos da Medicina Portuguesa, passaram por estes bancos e honraram e prestigiaram a instituição onde se formaram e muitos deles trabalharam.
Hoje a FMUL estende-se para além do seu campus, tendo estabelecido vários protocolos de cooperação com vários Hospitais e Centros de Saúde para o ensino pré-graduado. As suas instalações foram ampliadas com o edifício Egas Moniz, inaugurado em 2004, que alberga vários institutos, incluindo o Instituto de Medicina Preventiva, Institutos de Ciências Básicas e o Instituto de Medicina Molecular. Está atualmente em fase de finalização um novo edifício destinado ao ensino e investigação - Edifício Reynaldo dos Santos - no âmbito do Contrato Programa para o desenvolvimento da Faculdade de Medicina. Neste contexto, assume particular relevância o desenvolvimento da nossa parceria com o Instituto Superior Técnico. O novo edifício Reynaldo dos Santos representa uma mais-valia para essa cooperação, tal como permitirá uma expansão e reestruturação de áreas científicas da FMUL.
O atual projeto em curso contempla vários componentes que permitirão colocar-nos numa plataforma competitiva internacional, tão necessária à afirmação da voz científica médica portuguesa. É fundamental ser exercida uma liderança responsável, mobilizadora e agregadora de vontades e conhecimento. É particularmente fundamental, no atual contexto, aprofundar os mecanismos de interação com o Hospital, pugnando conjuntamente pela revisão da legislação sobre os Hospitais Académicos/Universitários, de modo a conferir-lhes maior flexibilidade e capacidade de incorporação de inovação e desenvolvimento científico da praxis clínica.
N: A reformulação do Ensino Clinico não será uma tarefa fácil. A criação duma comissão de avaliação será essencial para a sua realização, contudo, entende que em 3 anos seja possível essa reformulação? Quais as metas primordiais?
Prof. FP: O Ensino Clínico constitui um dos seus esteios mais importantes e, como tal, deve ser constantemente analisado e revisto de forma racional, procurando manter um equilíbrio entre o que são as naturais mudanças temporais e conjeturais, que têm de ser levadas em linha de conta e a necessidade de estabilidade pedagógica, evitando sobressaltos desnecessários. A sua boa implementação efetiva requer, também, uma adequação do funcionamento das unidades hospitalares ligadas diretamente ao ensino, pelo que o diálogo franco com as administrações hospitalares e baseado em conhecimento, direto e vivido, é um requisito indispensável.
Ao longo dos últimos anos, e na sequência da revisão curricular dos anos pré-clínicos, tornou-se mais premente a necessidade de reformulação do ensino da Medicina Clínica, em especial tendo em conta o excessivo número de alunos de pré-graduação e a limitação de doentes internados. Criarei uma Comissão de Avaliação e Reestruturação do Ensino Clínico para analisar em detalhe toda a problemática em causa e procurarmos em conjunto soluções adequadas, realistas, com vista à implementação dum ensino clínico forte e estruturante.
N: Falou-nos na criação ou recriação do Departamento de Educação Médica. Qual será o papel e os objetivos deste departamento?
Prof. FP: Pretendo apostar fortemente na Educação Médica, com a criação de um Departamento de Educação Médica que será essencial para os processos de reformulação pedagógica e monitorização da qualidade e do desempenho pedagógico na FMUL, a par da importante missão de promoção da inovação pedagógica. Este deve ser abrangente, com capacidade de intervenção e obviamente interação com as várias estruturas da Escola e deve ter em conta não apenas a pré-graduação como as outras dimensões da Educação Médica, o que irá requerer uma melhor articulação com o Instituto de Formação Avançada e com os Conselhos Científico e Pedagógico. Deverá afirmar-se como um centro de pensamento e reflexão sobre a Educação Médica, que mobilize a Escola, incorpore as preocupações dos discentes e atue em cooperação com o Conselho Pedagógico.
Considero como objetivos fundamentais os seguintes: formação dos docentes da FMUL em métodos de aprendizagem e em métodos de avaliação, atualização do conhecimento em comunicação e outras abordagens pedagógicas e desenvolvimento de metodologia de avaliação da qualidade do ensino.
A investigação na área da Educação Médica deverá também ser uma prioridade, garantindo um acompanhamento científico como suporte de um ensino eficaz e atual.
Os Departamentos de Educação Médica têm tido um papel fulcral no desenvolvimento de novos métodos de ensino, nomeadamente baseados em simulação médica, e-learning, aulas de pequenos grupos e novos métodos de avaliação, mais aproximados do modelo anglosaxónico de ensino, o modelo tutorizado. Nesse sentido, procurarei estimular a generalização da utilização de Simulação Médica no ensino e, em conjunto com o HSM-CHLN, instalar um Centro de Simulação Avançada para a formação de médicos e outros profissionais de Saúde, e também para utilização em áreas relevantes para a formação médica pré-graduada.
O DEM terá assim como objetivos principais: Apoio organizativo e administrativo aos estudantes do Curso de Mestrado Integrado de Medicina (MIM) da FMUL; Monitorização da qualidade do ensino com a missão de orientar o desenvolvimento curricular do Curso e a consultoria pedagógica, disponibilizando-a aos docentes e aos Orgãos de Governo da FMUL; Avaliação interna da qualidade das atividades letivas; Desenvolvimento de atividades formativas para docentes; Valorização dos Trabalhos Finais de Mestrado desenvolvida pelos alunos da FMUL como reduto da investigação essencial ao desenvolvimento da Medicina; Promoção da investigação em Educação Médica; Criação de uma página dedicada no site da FMUL;
Considero ainda que a Formação Pós-graduada e Educação Médica Continuada são pilares essenciais que complementam a formação inicial do Curso e balizam um processo delifelong learning.
N: No que se refere à vertente Investigação. Qual será a aposta? Como prevê o desenvolvimento desta área na Faculdade?
Prof. FP: O desenvolvimento da Investigação Científica e o acesso à Inovação e desenvolvimento na FMUL constitui um outro pilar fundamental duma estrutura académica médica. Estou fortemente empenhado na concretização de uma Universidade e de uma Escola Médica que faça da investigação e da promoção do conhecimento um atributo e uma qualidade.
A minha atuação decorrerá em dois planos de intervenção:
a. O primeiro, na reafirmação da cooperação ativa e participativa com o IMM, que nasceu da convergência de Centros de Investigação classificados como Excelente da Faculdade de Medicina, cujos líderes científicos são diretamente ou por afiliação Professores da Faculdade e que funciona nas instalações da Faculdade de Medicina, no edifício Egas Moniz. Trata-se dum instrumento de excelência para promoção e implementação de investigação.
b. Simultaneamente, procurarei estimular o desenvolvimento e consolidação de Centros e Institutos de Investigação da Faculdade, como o ISAMB e o CCUL (Centro Cardiovascular da Universidade de Lisboa), fomentando o desenvolvimento de projetos e iniciativas de investigação em programas cooperativos nacionais, no âmbito da ULisboa e internacionais.
N: Como prevê o reforço da colaboração entre os elementos que constituem o CAML? O que é necessário ser desenvolvido nesta fase?
Prof. FP: O conceito de CAML, criado em 2009, também desenvolvido noutros países, teve como objetivo dominante concentrar numa só estrutura funcional os três grandes pilares do Edifício Médico Académico: prestação de cuidados médicos diferenciados, ensino pré e pós graduado e investigação científica. Partilho da visão deste conceito e procurarei defender a sua expansão. Só assim se conseguirá uma melhor integração da área académica com a área clínica, fundamental na formação de novos médicos, bem como no desenvolvimento de programas de investigação e de pós graduação fortemente ligados à componente clínica.
Desenvolverei, ainda, todos os esforços para reforçar a necessidade de criar em Portugal um estatuto de Hospital Académico/Universitário com regras diferentes de financiamento e de organização consonantes com a sua tripla missão de prestação de cuidados de saúde, ensino e investigação. Em particular, atuarei com empenho e dedicação para reforçar o entrosamento das instituições que integram o CAML, procurando criar cada vez mais oportunidades e iniciativas de âmbito comum.
O CAML colocou-nos numa posição de vanguarda no contexto nacional da organização do ensino, investigação e prática médica, sendo uma oportunidade única a não desperdiçar. Mostrarei o meu total empenhamento em ultrapassar inércias e constrangimentos no seu desenvolvimento progressivo, em consonância com outros projetos análogos na Europa, Estados Unidos e Ásia, cujo funcionamento tive a oportunidade de apreciar diretamente.
A criação recente da ADCAML (Associação de Desenvolvimento do CAML) representa um passo significativo na criação de instrumentos que permitam a concretização deste projeto e a implementação daquilo que são os seus principais objetivos.
Equipa Editorial
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