Introdução Prática à Inteligência Artificial em Medicina
Está a nascer uma nova Unidade Curricular Optativa na nossa Faculdade e que pode ser frequentada por estudantes de Medicina do 2.º ao 5.º ano e que permite trabalhar na Medicina do futuro através do uso da Inteligência Artificial (IA). As aulas irão decorrer no Teaching LAB da Fundação Champalimaud com início já agendado para próximo dia 26 de Fevereiro de 2024, com presenças já confirmadas da Google e da Microsoft.
A apresentação oficial aconteceu em outubro na Fundação Champalimaud, no Open Day do Cancro da Mama e foi o nosso docente Pedro Gouveia quem apresentou parte da equipa que constitui o Laboratório de Cirurgia Digital dentro da Unidade de Mama.
Cirurgião da Mama na Fundação, desde 2013 e recentemente nosso docente, Pedro Gouveia tem sido o grande impulsionador da Realidade Aumentada, dinamizando o estudo da imagem e a sua aplicabilidade tecnológica em bloco operatório. Com o objetivo de aproximar a tecnologia à saúde, criou uma equipa de ouro e desenhou uma nova disciplina, pensando sempre na importância de munir os mais jovens com as ferramentas certas para desenhar o futuro de precisão. Foi por isso que nasceu a cadeira de Introdução Prática à IA em Medicina que pretende dotar os estudantes de capacidades várias: apresentar diferentes propostas de algoritmos de IA; Discutir erros comuns na utilização de IA; Introduzir linguagem de programação; Ensinar IA para análise de imagens médicas em diferentes aplicações, ou ensinar a criar modelos digitais 3D de pacientes/órgãos para planeamento cirúrgico.
Nós fomos visitar a Fundação e conhecer parte da equipa docente e hoje apresentamos alguns desses rostos e lançamos o desafio para que os nossos estudantes se inscrevam, pois afinal só 16 poderão alcançar a vaga para um contacto com a tecnologia.
Pedro Gouveia
Formado pela Nova de Lisboa, acabaria por escolher a FMUL para trabalhar na sua tese de doutoramento que lhe levaria 5 anos a desenvolver – “3D digital breast cancer surgery with augmented reality”.
Membro do Comité de Treino e Educação no Grupo de Mama, pertencente à Sociedade Europeia de Cirurgia Oncológica desde outubro 2022. É investigador principal do laboratório de Cirurgia Digital desde dezembro 2022.
Tiago Marques
Formou-se em Física Tecnológica no Técnico e doutorou-se em Neurociência na Fundação Champalimaud.
O seu grande foco era tentar perceber como é que circuitos no cérebro percecionam os estímulos visuais e constroem representações. Sempre com sede de novos passos seguiria para o MIT, onde faria um Pós-Doutoramento na interceção entre Neurociência e Inteligência Artificial / Machine Learning, e continuando na área da Visão. Foi aí que desenvolveu modelos computacionais que eram inspirados em visão neurológica, mas que adquiriam uma robustez que os algoritmos de computer vision não têm. Como o próprio explicaria, "um dos grandes problemas dos algoritmos, e que têm visão de computador, é que eles falham muitas vezes quando as imagens aparecem perturbadas, já a nossa visão não, tem essa robustez". Ora a ideia seria usar precisamente essa robustez referida para aplicar ao conhecimento já obtido da Neurociência e do funcionamento do cérebro para melhorar a IA, tornando-a mais humana. Foi no seguimento de um trabalho de investigação no MIT, ao longo de 4 anos, que Tiago Marques conheceu Pedro Gouveia, depois de uma palestra em fevereiro de 2022.Também ele com o olhar sempre colocado no horizonte que vislumbra o futuro, Pedro Gouveia desafiou Tiago a liderar a parte de Visão e assim ficou. Neste momento Tiago Marques tenta aplicar o conhecimento que aperfeiçoou em uma nova tecnologia que usa a IA e a realidade aumentada, para melhorar as capacidades dos cirurgiões durante a cirurgia.
O grande passo da tecnologia vem combater os atuais métodos tradicionais que são mais invasivos e muitas vezes ainda imprecisos, basta ver no cancro da mama. "30% das cirurgias resultam de uma necessidade de segunda intervenção, porque não se removeu tudo e a guia metálica que é inserida dentro da mama da doente, que vai até ao tumor, vai dizer ao cirurgião, durante a cirurgia, onde ele está. Facto é que pode haver erros na inserção da guia, podendo esta deslocar-se até à cirurgia, ou até haver erros para lá da guia metálica e que o cirurgião não tem mais elementos de informação". O cirurgião terá sempre esses dados em relatórios feitos previamente, mas em tempo real não dispõe destes.
O que esta dupla de trabalho vem agora fazer e ensinar, é que é possível haver uma transposição da linguagem clínica, para a linguagem da imagem. "A tecnologia que estamos a desenvolver, pega nos dados que surgem de uma ressonância magnética, é segmentada automaticamente todos os tecidos mamários e depois é possível prever como é que os tecidos se movem com os movimentos da doente e os seus movimentos. Sabendo isso e com um sistema avançado de imagens em bloco operatório, que mede a cor das imagens e profundidade dos objetos, construímos um mapa de superfície da doente e alinhamos o modelo digital de 3D da mama, com todos os tecidos e com a superfície da doente no bloco, alinhando assim todos os dados. O tumor fica assim alinhado com a posição da doente".
Os algoritmos fazem uma reprogramação das imagens, fazendo a transformação das posições da mama, levando para o bloco operatório um sistema que adquire a imagem da doente e constrói a superfície e alinha o modelo 3D com a doente no bloco. Só depois se mostra ao cirurgião a imagem digital, usando os óculos de realidade aumentada.
Falta ainda desenvolver alguns algoritmos da tecnologia para que então por fim se leve todo este trabalho até ao bloco e à doente.
Quanto à nova área disciplinar optativa, os docentes Pedro Gouveia e Tiago Marques procuraram criar uma lista de competências para que os alunos de Medicina possam tirar proveito das novas tecnologias digitais na sua atividade médica. É por isso que da equipa há elementos com formação em Engenharia, IA, Engenharia Física e Biomédica, Ciências da Computação e médicos. A ideia é dotar o médico de maior capacidade para trabalhar através da IA, como da realidade aumentada, para que possa usar ambas ao longo do exercício da atividade profissional.
Esta disciplina permitirá assim introduzir temáticas novas e aliciantes quanto programação, introdução a modelos de IA, modelos de linguagem que auxiliem o conhecimento médico, aumentando a sua própria atividade.
Esta disciplina ainda dará acesso a 3CTS, servindo de primeiro passo para abrir a curiosidade dos futuros clínicos.
Rafaela Timóteo
Atualmente aluna de doutoramento, vem de Engenharia informática para desenvolver as imagens através de 3D.
A sua especialidade é conseguir alinhar as imagens com o sistema de camaras que fazem o scan das doentes no bloco operatório e correspondê-las à realidade aumentada nos óculos do médico.
Já a trabalhar na Unidade da Mama, na Champalimaud, conheceu na altura Pedro Gouveia que a convidou para fazer o doutoramento e apesar de não o ter pensado, aceitou o desafio por ser, precisamente, desafiada a sair do conforto e do óbvio.
Yasna Forghani
Investigadora iraniana, Yasna Forghani está em Portugal há cerca de 7 meses. A ideia foi desenvolver os seus conhecimentos na área das tecnologias, ao serviço da saúde. Viu uma call no linkedin em que a Champalimaud se propunha a receber estudantes de doutoramento. Yasna assim o fez. Concorreu e decidiu vir rumo a outro destino. Se no Irão trabalhava já há dois anos numa empresa de devices, agora em Portugal transporta com ela o conhecimento e alarga-o a uma nova escala. . A fazer o seu PhD na Champalimaud, aquilo que mais a fascinou foi perceber como o mundo avança dentro do bloco e diante de uma cirurgia. O o fascínio ainda aumenta mais quando vê tudo ligado à tecnologia.
A trabalhar no cancro da mama, a sua função é separar por imagens os tecidos da mama, as artérias e os vasos e perceber como se transportam eles para as Hololens, os óculos de realidade aumentada.
Ao longo de 3 anos ficará a trabalhar em Portugal, continuando a sua investigação e tentando que em 2026 obtenha a conclusão da tese, altura em que se pretende ter as primeiras conclusões deste projeto que casou diferentes continentes, experiências profissionais e pessoas.
José Pais
É finalista do 6º do MIM e quando fez o estágio da cirurgia geral, no 4º ano, estava na Champalimaud. No dia em que foi para a Unidade da Mama e conheceu Pedro Gouveia, falou-lhe de um projeto em 3D que desenvolvia com um grupo de outros alunos e docentes da FMUL e isso abriu-lhe portas para regressar à Fundação, ma desta vez mais ligado à tecnologia, afinando agora o foco à tese de fim de Mestrado. Aquilo que o ajudou foi a entender a segmentação das TACs, sabendo depois adaptar estas fases para a realidade aumentada.
Para o José, o grande avanço deste projeto é que dentro do bloco, os médicos possam ver de forma detalhada o doente, através da minúcia dos óculos. “Poder observar as suas artérias e órgãos do doente e interagir em plena fase de cirurgia nas decisões mais fulcrais é o grande passo. Mas mais do que isso, podemos mostrar ao doente o seu corpo adaptado em 3D e perceber o que ele tem e onde tem. Também para o médico a abordagem é diferente porque tudo o que vê é muito mais detalhado”.
Em maio ou junho o José Pais terá de apresentar a sua tese e será Pedro Gouveia o seu tutor. Professor muito disponível, conta-nos, “sempre se adaptou aos timings, dando larga margem de criação. Professor de uma geração jovem, tem forte vertente tecnológica e pelo facto de trazer outros mundos, consegue criar maior interesse a quem ainda está a aprender”.
Quanto à ligação de Pedro Gouveia a uma das Instituições mais pioneiras, como é a Champalimaud, torna-o ainda mais próximo dos estudantes e da tecnologia que marca um novo rumo de vida. "Não é muito fácil encontrar uma instituição como a Champalimaud que tem financiamentos para projetos tão disruptivos”, afirmou. E foi ainda mais longe, concluindo: "tenho a certeza que daqui a 50 anos qualquer pessoa conseguirá interagir com a realidade aumentada e usar as Hololens".
Sobre a restante equipa que dá corpo ao grupo de docentes:
Maria João Cardoso
É a coordenadora da cirurgia da Unidade de Mama da Fundação Champalimaud e Professora Associada da Faculdade de Medicina da Universidade de Lisboa. É coordenadora e investigadora principal do projeto CINDERELLA
João Santinha
Formado em Engenharia Biomédica. Tornou-se investigador na área de processamento de imagem biológica e mais tarde na área de imagem médica. Com um Doutoramento em Engenharia Eletrotécnica e Computadores o seu foco é a Inteligência Artificial Aplicada a Imagem Médica. Integra o Digital Surgery LAB onde é responsável pela coordenação do desenvolvimento de processos e modelos de IA para imagem médica.
Eva Batista
Médica Radiologista, dedica a sua carreira à patologia mamária.
Ana Isabel Ferreira
Médica Radiologista, fez a subespecialidade de Radiologia de Intervenção, sendo a responsável desta área no Hospital Universitário de Santa Maria.
Membro da direção da Associação Portuguesa de Radiologia de Intervenção (APRI), assim como do Núcleo de Radiologia de Intervenção de Portugal (NURIP) da Sociedade Portuguesa de Radiologia e Medicina Nuclear (SPRMN).
Grupo ambicioso e sonhador, transformam a vontade em imagens reais e levam-nas até ao bloco, para bem das tantas doentes que procurem por tratamento.
Agora basta decidir quem quer ocupar um dos 16 lugares destas 10 aulas teórico práticas de 3h concentradas durante a primeira semana de aulas (26 de fevereiro a 1 de março) e com projeto final desenvolvido fora de aulas, com entrega a 17 de Março.
As inscrições abrem já a 8 de janeiro.