![Aluna em frente ao iMM](/sites/default/files/inline-images/Dia_inscri%C3%A7%C3%A3o_0.jpeg)
Maria Pelarigo tem 20 anos e um sonho: Ser médica! Não se recorda exatamente quando se apercebeu desta vontade que se enraizou nela e nunca mais a deixou querer ser outras coisas. “Lembro-me de ser pequenina e dizer que queria ser médica. Sempre me senti bem em meio hospitalar. Lembro-me de ficar hospitalizada na sequência de crises de asma- ainda não diagnosticada- e de ser muito feliz.”
“O avô foi também uma influência muito grande, “disse. Porquê, perguntei, é médico? “não”- respondeu- “é doente.” Maria acompanhava-o nas consultas e vinha várias vezes a Lisboa, ao Hospital de Santa Maria. “Já naquela altura me senti fascinada pela fachada do edifício especialmente de noite quando está iluminado.” Mais tarde, durante a entrevista confessa que sempre quis vir para Lisboa, “gosto da cidade,” diz num tom calmo, mas determinado. Nota-se que chegou aonde pertence. “Sinto-me muito realizada,” diz. Mas, vamos lá perceber a razão destas palavras.
A série “Anatomia de Grey” foi determinante para escolher a especialidade: Cirurgiã! “embora a cardiologia e a oncologia sejam também fascinantes! Mas, vamos vendo, o curso são 6 anos e é para ir descobrindo.” A pediatria também já fez parte da lista de escolhas, mas a Maria tem razão, em 6 anos há muito para descobrir.
O gosto que nutria pela temática da medicina era uma coisa que se percebia. “Sempre que o meu avô tinha algum problema, eu ia ler sobre o assunto. Tenho uma pasta no meu telemóvel desde o 8º ano, que se chama “medicina”, e guardo lá muitas coisas como fotos e informação sobre o assunto.”
Há 2 anos veio ao campus da FMUL e comprou uma toca cirúrgica. “Para que é que eu queria a toca? Não sei, talvez porque tinha esperança que um dia a viria a usar?”.
É filha única e os pais têm profissões que nada têm a ver com a medicina, “nunca me pressionaram a ser médica, mas sempre me apoiaram e foi determinante para mim esse apoio.” A Maria não entrou em medicina da primeira vez em que concorreu, nem da segunda. Foi à terceira e com muito esforço e mérito!
Da primeira vez os exames foram fáceis, mas as notas de matemática muito altas. “Não entrei.” Decidi fazer melhoria de nota interna. Apostei nas disciplinas de Física e Aplicações Informáticas.” Teve 20 valores a ambas e em 2021 volta a repetir os exames. “Desta vez foram muito difíceis e se melhorei na nota interna, baixei na nota dos exames.” Não entrou por 5 décimas!
Desanimada, mas recusando baixar os braços, pensou em alternativas! “Medicina dentária ocorreu-me, mas era muito impessoal. Enfermagem, tem a parte humana e há uma excelente escola aqui em Santarém, ao pé da minha casa. Avancei.” Frequentou o curso, mas sentia-se incompleta. “Faltava-me sempre algo. Tinha necessidade de conhecer profundamente as coisas, queria saber mais.” Uma das aulas preferidas era dada por um neurocirurgião que “contava muitas histórias do bloco operatório. Eu ficava fascinada.” Foi aí que percebeu que não podia ser enfermeira. “Não podia ter uma profissão em que estava em contacto com a área que eu gostava e que não tinha conseguido atingir.”
Em casa “falei com os meus pais e disse-lhes que ia parar o curso de enfermagem. Ia dedicar-me a estudar todos os dias de manhã à noite, frequentar explicações e candidatar-me novamente a medicina. Aquela luta não era a dos meus pais, mas eles perceberam e estiveram comigo.” Em dezembro o plano passou a ser executado. “Só parava de estudar para comer e ir ao ginásio. Também tive sorte nos explicadores de matemática e de físico-química.” Volta a candidatar-se aos exames e “quando vi as notas fartei-me de chorar. A matemática tive 19.2 e a físico-química 18.1. Ficava uma décima abaixo do último colocada. Não queria acreditar. Pensei, pensei e decidi recorrer da nota. Consegui subir duas décimas.” É esta a luta da Maria, uma décima, duas décimas. É pouco, mas a diferença é abismal. Na vida dela significaram dois anos de investimento e de luta. Felizmente, acabaram por terminar onde era esperada: Na FMUL. Mas ainda falta uma parte da história.
![Estudante em frente ao iMM](/sites/default/files/inline-images/Em%202016_2.jpeg)
De tanta esperança lograda, a Maria começou a desenvolver uma espécie de proteção para sofrer os embates. Só pode ser essa a explicação para ter no mail a informação com o acesso ao ensino superior e ter aguardado cerca de 1 hora para abrir. “Estava a trabalhar nas piscinas de Santarém e aguardei a minha hora de almoço. A minha família e amigos vieram ter comigo e foi então, que sem esperança, triste e a mentalizar-me que não ia acontecer, abri o mail.” Desta vez o destino pregou-lhe uma surpresa boa e a Maria tinha finalmente acesso ao destino que tanto ambicionava. Ela estava na FMUL! “e não fui a última a entrar.”
Veio à semana da receção ao aluno e partilhou a sua história sentada numa cadeira do anfiteatro João Lobo Antunes. Houve um silêncio para ouvi-la falar e sentiu-se uma espécie de admiração no ar. O caminho pode não ser a direito, mas não quer dizer que não se chegue lá.
Maria vive na casa de uma amiga, porque “as rendas estão caríssimas e não se encontra nada com condições. “Está aqui há meia dúzia de dias e já se inscreveu como voluntária na Associação Amigos do Hospital de Santa Maria. “Sempre fiz voluntariado. No 11º ano fui voluntaria num hospital de oncologia e andava com um carrinho de comida a distribuir junto das pessoas que estavam a fazer tratamentos. Era eu e umas senhoras de idade!”. Passou ainda por um centro de vacinação Covid 19 e atualmente é voluntária na Cruz Vermelha. Está realizada, plena e confiante! “Não foi fácil chegar aqui, mas aprendi que com esforço tudo se consegue.” É assim com este espírito que vai abraçar os próximos anos, no Campus da FMUL, olhando a fachada “melancólica” do hospital onde veio tantas vezes acompanhar o avô.
Dora Estevens Guerreiro
Equipa Editorial
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