É de uma alegria contagiante, boa vibração que passa para os sentidos, mesmo ainda sem ter dito quase nada.
Há poucos dias atrás, tinha recebido uma mensagem sobre ele, “tens de o conhecer, ele quis ir para a linha da frente tratar de doentes infetados com Covid. Diz tudo o que pensa. Vais gostar dele!”.
Contato-o, confesso que reticente porque pode estar cansado, sei que tem de estudar e a pressão não deve estar fácil para estes que foram os dois piores meses de sempre da pandemia. Aceita no mesmo minuto em que o sondo sobre uma possível conversa, mas apenas quando mais lhe convier. Poucos dias depois estamos a conversar e nessa hora que me passou a voar ri mais do que em outro momento qualquer dos últimos tempos.
Diz que não é o típico estudante de Medicina, percebo o que me quer dizer ao longo do caminho da nossa conversa. É um descarrilado certinho. Quis sempre servir o outro, é esse o espírito sempre predominante em todas as suas palavras. Em pequeno queria ser bombeiro, à medida que foi crescendo vestiu no seu imaginário a segunda farda da profissão que queria seguir, a de militar. Influência do pai e do avô que foram militares e só posteriormente seguiram outros caminhos profissionais. Que não se pense que isso lhe reflete sinal de dureza, ou distanciamento dos afetos. Sempre agarrou todas as oportunidades para fazer voluntariado, o propósito era sempre o de ajuda ao outro. No 11º ano teve o seu primeiro contato no Hospital Pediátrico em Coimbra, ia brincar com as crianças internadas, muitas delas doentes oncológicas. Mesmo em cima do 12º ano percebeu que o perfil que a ele mais se ajustava era o de médico e candidatou-se a Medicina. Sempre de pensamento pragmático e direto ao ponto, o António Urbano é de uma pequena vila mesmo perto de Aveiro.
Concorreu inicialmente às hipóteses que tinha mais a norte, mais perto de casa, mas ficou colocado em uma das suas mais distantes opções, a Faculdade de Medicina da Universidade de Lisboa. Hoje diz, convicto, que diante do que a experiência lhe trouxe, teria sido um erro não vir para a FMUL. Foi isso que o fez largar Aveiro e mudar-se para a capital. Mas o primeiro ano académico não foi fácil. Em terra desconhecida e sem amigos mais velhos na instituição para o apoiar, foi trilhando caminho sozinho, contendo certamente muito do entusiasmo que agora lhe notamos e que nele tanto faísca, bastando ver apenas o olhar. Hoje, diz que os amigos da Faculdade são como irmãos e que um dos pontos fortes desta Instituição é a integração de quem chega no sistema e o acesso prático e quase imediato aos doentes, desde os anos mais iniciais deste Mestrado. Ano de adaptação, diz-me que foi dos piores, o ritmo de estudo exigiu-lhe uma adaptação militar, sem direito a grandes amizades, ou grande sucesso académico, sucesso a que estava habituado no secundário. Atualmente no 6º ano do MIM, está a fazer o estágio em Santa Maria, na Medicina 2C.
Nunca fez parte da Associação de Estudantes (AEFML), mas envolvia-se em vários projetos desta; integrou uma mesa de Assembleia Geral e um dos mais queridos projetos para ele, o Hospital dos Pequeninos, onde esteve dois anos.
Aquilo que me motivou a conhecer o António foi a sua bravura e sentido de missão para com o outro, para com a Instituição Hospitalar e Universitária que nele apostou, pela missão de ir prestar cuidados a doentes infetados pelo vírus SARS-CoV-2, mas rápido percebi que as crianças lhe são parte inerente, aliás, acima de qualquer uma outra.
Isso explica a passagem do António pelo estágio em Neonatologia, onde cedeu à tentação de ir acompanhar um banco nos Cuidados Intensivos do mesmo serviço. Foi aí que sedimentou a certeza que era essa a sua única hipótese a seguir, única sim, diz-me, porque se não entrar em Pediatria à primeira, tentará de novo, mas não abdica de alcançar a sua especialidade que lhe é de óbvia vocação.
É assim na vida, persistente, obstinado e confia que, se é o que quer, então vai empenhar-se ao máximo para que aconteça. A obstinação, a que o António chama de teimosia, deve-se muito à perseverança já passada pelo pai.
É um cuidador e o confronto com a vida pela frente, ou o fim dela não o fazem estremecer na compaixão pelo outro. Nos últimos tempos de vida da avó paterna, ajudou a cuidar dela, como se de uma criança se tratasse. Lidar com a degradação do corpo humano, de alguém que se ama é para ele condição que aceita como um ciclo que é, para todos nós, sequencial. A noção de que a vida tem este rumo é muito sustentada no pensamento da resiliência, logo chorar pela dor, não constrói caminho para o futuro e empata o tempo. "Não há tempo para parar e lamentar" diz-me, sem qualquer dureza nestas palavras.
Dizem os amigos próximos que o António tem o mesmo de sincero quanto de divertido, em encontros de amigos é presença indispensável para animar os grupos e ele agradece a vida agitada, já que tem energia tal que não aguenta estar sentado para ver sequer um filme integralmente, tempo demais parado que o faz passar em fast forward algumas cenas, só para terminar mais depressa. Tempos livres? Tem, mas não é para descansar, vai correr, ou faz ginásio em casa; correr as duas horas seguidas, para cumprir uma maratona, era uma das suas metas apetecíveis, mas agora mais confinado em casa, fala pelas duas amigas com quem divide casa e não dá espaço para meditação sem som. Silêncio consigo próprio é difícil, roça quase o desconfortável.
Chega a ser desconcertante perceber como é que um perfil atlético, talvez devido aos 10 anos de andebol distrital, ou pela natação que ainda faz, carregue nos braços tão ternamente um bebé. A primeira vez que pegou num, foi no berçário, levou-o ao colo até à mãe e nesse pequeno espaço de tempo que o transportou sozinho, pensou na fragilidade de um começo de vida que lhe cabia praticamente na palma da mão.
Isabel do Carmo, a Professora de Endocrinologia que já pertenceu à FMUL e esteve internada com Covid, no Hospital de Santa Maria, foi precisamente tratada e acompanhada pela equipa que recebeu agora o António Urbano, mas não para ser tratado, para o próprio ajudar a tratar. Começou o estágio na Medicina 2E, dia 18 de janeiro, quando começou o confinamento. Tinha-se proposto voluntariamente a ir para o "covidário" e foi integrado, sendo dos primeiros estudantes a autopropor-se e a entrar. Já tinha dado a sua primeira ajuda nas equipas da linha da Saúde 24, mas ir para o terreno e para a linha da frente era meta que ambicionava alcançar. Diante do cenário de ir para uma área de maior risco e de não ter ainda direito a vacina, luta para já inglória do próprio Diretor da Faculdade, que pede igualdade destes estudantes no acesso às vacinas, nada demoveu o voluntarismo de alguém que acha que não há tempo para receios perante a vida e que quando mete uma ideia na cabeça, persegue-a até a conseguir.
Como gere toda a sua agenda de um ainda estudante de Medicina?
O instinto pela perseverança responde a isso. Cada dia hospitalar começa às 8h e termina oficialmente às 15h; por vezes mantém-se porque me explica que há dias em que “é mesmo preciso continuar a ajudar”. Após essas horas no terreno, a equipa médica reúne para rever quem são os doentes Covid que vão encontrar no dia seguinte, analisam a situação de cada um deles e é após análise final da especialista daquela área, a Dra Patrícia Monteiro, que se decide a distribuição dos doentes. Cada pessoa fica com uma média de 2 a 3 doentes, assumindo todas as rotinas. Uma coisa é certa, cada dia é totalmente diferente e imprevisível do outro anterior. É precisamente isso que escreve no diário dos doentes, perto da hora de almoço, quando volta a fazer-se uma reunião para discutir as terapêuticas do próximo dia e algum balanço necessário do que nessa manhã se viveu. Às 15h os Serviços das Medicinas juntam-se para decidir a distribuição dos doentes Covid, mediante os estados de gravidade. Quanto ao António segue para casa e almoça perto das 15h, o resto do dia guarda para estudar, preparação que está em countdown para a Prova Nacional de Acesso, que lhe decidirá a tão ambicionada Pediatria. O cansaço equilibra-se para o inspirar a estudar, como se ouvisse a voz que o motiva, “estiveste a manhã toda a servir e a ajudar”. Estuda de seguida até às 19h e a pausa é apenas para treinar agora o corpo, retomando o treino da mente o estudo até às 23h. Desde que começou os estágios (setembro), sente o cérebro em aceleramento a rever o que tem para fazer no dia seguinte. Segundo a segundo revê o que precisa de fazer e rever nos seus doentes; recorda-os a todos, os que agora tem, os que já lhe passaram pela experiência e projeta essa bagagem para o futuro, recordando quem quer ser. Quando questionado se não "é melhor fugir do caos enquanto pode", responde a sorrir que, "há quem goste de fugir do fogo, mas o fogo a ele atrai-o", brincadeira que associa de imediato ao fato de bombeiro ser a sua grande primeira escolha de vida. Diante do perigo sempre se sentiu mais impelido a avançar do que a recuar. A calma é-lhe padrão dominante, perder o controlo não faz parte da disciplina natural e, na verdade, desconhece como seria se se descontrolasse. Entende que há sempre algo que se pode fazer pelos outros e se possível arrancar-lhes uma gargalhada. E como desportista que é, está na maratona para aguentar até ao fim e não para fazer um sprint e gastar todas as forças num só momento. O estágio, com estes doentes Covid, acaba dia 9 de abril, um dia depois do seu aniversário.
Protagonista ativo não só na felicidade da sua história, mas a querer que a dos outros também seja mais leve e feliz, não deixa de levar a sério o presente, mas olhando-o sempre pelo lado do copo meio cheio.
Daqui a muitos anos o António, que quer vir a ser avô, vai contar aos seus netos que fez parte de um dos momentos mais imprevisíveis da história do mundo, aquele momento em que um invisível vírus fez vergar todas as economias à sua vontade e lhes exigiu humildade e resiliência.
O que é que o fez oferecer-se para ir para a área de maior risco que há atualmente no Hospital?
António Urbano: Sei que me repito, mas eu sempre quis muito ajudar. Depois, sabendo que era uma crise nacional e que o país estava a passar uma fase difícil, senti que o meu patriotismo me dizia para prestar um serviço e não ser mais um apenas a assistir. Sabia que nestas áreas da Medicina a situação estava caótica e que aqueles doentes Covid seriam mais instáveis e precisariam de mais cuidados e, como tal, de mais pessoas a ajudar. A verdade é que tudo o que está mais ligado às áreas de Cuidados Intensivos desperta-me grande interesse, e foi mais uma motivação, a de ir para o "terreno de guerra". Eu sabia que ia aprender muito, porque a partir do momento em que um serviço está sobrelotado, isso também significa que há muitos casos diferentes entre si, portanto, mais margem de aprendizagem há. Neste momento (na Medicina 2C) eu assisto, todos os dias, a casos diferentes, com doentes com cenários diferentes e a descompensar com algo que surge de novo, e isso também me traz aprendizagem, porque não há um dia igual ao outro.
Teve alguma preparação especial para ir para esta linha da frente?
António Urbano: Não. Eu voluntariei-me e pediram-me que aguardasse ser contatado e que logo me dariam mais explicações. Todos os dias tinha aquela expetativa de ser chamado, mas não vinha a notícia se me tinham aceite. Até que, um dia, chegou uma nova aluna do 6º ano e apresentou-se para o lugar que eu ocupava. Foi assim que fiquei a perceber que eu ia ser transferido para a área a que me tinha proposto. Fiquei "entregue" à Dra Patrícia Monteiro, a nossa especialista da Medicina 2C, e fui delegado ao seu interno de segundo ano da especialidade de Medicina Interna, Dr. Henrique Barbacena. Ainda achei que ia assistir a algum tipo de explicação formal, mas o Henrique foi muito orgânico e explicou a informação mais necessária, e eu só tive que o seguir e observar tudo. Ele ia ensinando tudo à medida que eu o acompanhava. Estou muito contente, porque estou no contato direto com os doentes, e vou vê-los e posso escrever o diário desses mesmos doentes. Claro que é a Dra Patrícia que decide a terapêutica, mas ela permite-me dar a opinião e colaborar. Eu tenho o sonho de qualquer estagiário, já que posso pôr em prática tudo o que aprendi e não sou só espectador.
Quando o Dr Henrique lhe faz essa visita guiada e o apresenta à realidade, como foi o embate?
António Urbano: Admito que estava ansioso por ser algo novo e tão repentino. Entrar pela primeira vez numa área Covid e perceber se me estava a vestir adequadamente, como devia colocar as proteções, se ia ficar infetado, ou não, pensei em tudo e isso criou alguma ansiedade.
Teve vergonha de fazer perguntas, ou assumiu que tinha que perguntar para saber o que fazer?
António Urbano: Não tenho vergonha nenhuma de perguntar, estou sempre a fazê-lo e não tenho medo nenhum. Perguntava tudo ao Henrique e ele ajudou em tudo, explicava tudo e perguntava de volta para confirmar se eu tinha compreendido. Por isso a minha ansiedade inicial passou rapidamente, agora já vou muito tranquilo e nada nos meus dias me causa nervosismo, mas isso não invalida que haja doentes com questões mais complicadas. E nem sempre temos o seguimento do mesmo doente, um dia vejo um, no outro dia já é outro doente que está lá, e isso obriga-nos a adaptar a rotina e o nosso papel, sempre que se conhece de novo alguém.
Qual é o nível de gravidade dos doentes que estão na Medicina 2C?
António Urbano: Temos vários cenários: doentes que estão estáveis, depois de terem estado muito instáveis, doentes que atualmente estão instáveis e a caminho de piorarem e outros de reverterem esse quadro. E mesmo dentro dos doentes instáveis há vários níveis de gravidade. É de uma heterogeneidade tão grande que me permite aprender mais, mas que não dá para estarmos seguros que já sabemos o que vai acontecer.
Esse embate com o outro que por acréscimo assume tantos estados diferentes na doença, não é sempre um estado de ansiedade cíclico?
António Urbano: É um mundo à parte. Eu já tinha feito dois estágios em Santa Maria e era muito diferente. Havia muita agitação, é verdade, e agora a realidade transformou-se totalmente. A confusão é outra... Contudo, o foco mantém-se intocável, é o doente. O perfil do doente mudou, a forma de contato do médico com o doente também mudou, porque agora os médicos estão todos equipados e tapados com máscaras e viseiras, mas o cuidado está igual. O doente sente-se igualmente apoiado, mas todo o contexto mudou. Não imagina a cara de felicidade, daqueles que estão despertos, quando nos veem de novo a chegar às enfermarias. Têm um sentido de gratidão incrível, agradecem-nos porque atribuem as suas melhorias ao nosso trabalho e consideram que se não fossemos nós, se calhar já nem estariam ali. A relação médico / doente está intacta, isso causa-me uma satisfação imensa.
A gratidão dos doentes mexe com as vossas emoções? Como se o dever estivesse cumprido, quando há o reflexo dessa gratidão?
António Urbano: Sim... falo por mim, eu sempre senti com agrado a felicidade espelhada naqueles que se vão sentindo melhor. Estes casos ajudam-nos a contrabalançar com o outro grupo, que são os doentes que estão a piorar e alguns com desfechos de óbitos. Este é o meu grande contraste, num só dia, vejo óbitos e penso logo no outro lado da moeda, naqueles que ficam bem e salvos. Eu acho que esta é a verdadeira razão pela qual as pessoas vêm para Medicina, para salvar.
Não tem medo que pode ir ali parar a uma daquelas camas, por ficar hipoteticamente?
António Urbano: Não me confronto muito com esse medo, mas tenho medo pelos meus pais e avós. Vejo ali muitos doentes com a idade dos meus pais, ainda mais dos meus avós e isso incomoda. Faz-nos pensar muito nos nossos. Há um cenário que é importante destacar, o coronavírus não nos permite predizer quem vai sair pior daquilo tudo, porque temos pessoas com muita idade a recuperar, e outras muito mais novas que cedem. Nada do que tínhamos como certo se mantém certo. Já tive casos de doentes que entraram aparentemente bem e ficaram muito mal e outros que pareciam não aguentar mais um dia, e deram a volta.
Lidar com esse cenário é desafiante ou assustador?
António Urbano: Eu acho que o desafiante e assustador andam sempre de mãos dadas. Costumo pensar que, se há algo que não assusta, então também não é desafiante. Ter um pouco de medo é muito desafiante. Sabe que há ali doentes que, claro, a parte afetada é a respiratória, mas boa parte das pessoas que ali estão, a parte respiratória até se aguenta, depois têm é outras patologias que descompensam a pessoa. Aparecem todo o tipo de patologias que vão descompensar estas pessoas e isso é sempre um desafio, porque nos apanha de surpresa.
Enquanto espetadores das notícias aquilo que nos tem chegado é que os hospitais vivem uma espécie de cenário de guerra, onde já não há propriamente meios humanos, nem técnicos para suportar tudo o que se tem vivido. Qual é o cenário real que se vê? Caos ou calma aparente?
António Urbano: À primeira impressão é um serviço de Medicina Interna normal, só que as vagas estão todas cheias e sabemos que, no segundo em que alguma se liberte, fica tudo de imediato ocupada outra vez. Há sempre pessoas para qualquer vaga. O cenário pior é nos contentores onde se recebe, na primeira linha, os doentes. Eu já me voluntariei para ir para lá, quero ir ajudar os meus colegas, quero ir perceber como se lida com aquele caos que está instalado. Faltam médicos especializados, há muitos doentes com muitas patologias, muitos doentes descompensados. O cenário na nossa Medicina 2C é mais tranquilizador, porque pelo menos cada doente está na sua cama, mas ao mesmo tempo quando os doentes começam a descompensar, vê-se o serviço todo a correr para ir ajudar. Dantes não se sentia isto, se um doente descompensava, em vinte dos que estavam internados, agora em 20, quase todos descompensam a qualquer altura. Há sempre muita ação, problemas novos. É tudo muito imprevisível.
Há meios humanos que cheguem na sua área?
António Urbano: Temos conseguido chegar a tudo, contudo, temos apenas uma especialista para os nossos 20 doentes. Mas conseguimos porque contamos com internos e com o grupo todo em geral.
Como é que acha que vai lidar com uma área tão delicada como é a Pediatria. Onde as crianças parecem não ter meio-termo, ou recuperam muito depressa, ou ficam mesmo muito mal?
António Urbano: É engraçado como tenho tido essa discussão com colegas meus e essa falta de meio-termo, que desmoraliza alguns, é o que a mim mais me motiva. As crianças têm essa coisa especial, parece que para elas é mágico e corre tudo bem, não se apercebem quando estão doentes e quando as coisas passam, já nem pensam mais no assunto. Mesmo diante de situações em que a criança está a viver um momento difícil e pode ter um desfecho infeliz, esse lado também me motiva a fazer tudo para que não se dê o mau desfecho. E mesmo que seja para encarar esse mau desfecho, então que eu esteja lá para acompanhar essa criança.
Muitas vezes achamos que eles não percebem o que se se está a passar e eles percebem; outras vezes eles não entendem o que se passa com eles e nós temos de saber como lhes explicar, e isso é muito desafiante. Mesmo trabalhar com um recém-nascido é muito gratificante porque estamos a ajudar que aquela vida se mantenha, estamos a ajudá-la para chegar ao futuro. Esta é a visão que eu tenho da Pediatria, ela está a cuidar do presente, para dar um futuro gigante. Pegamos nelas ao colo e há uma magia enorme, porque tudo é imprevisível nas crianças. Esta minha visão da Pediatria, agora que estou na Medicina Interna e vejo situações em que penso que já não podemos fazer mais nada pelas pessoas e que apenas podemos manter uma terapêutica, ainda ganha mais relevância e magia na minha vida.
Explicava-me que a seguir a este estágio segue ainda a ronda pelo Hospital Beatriz Ângelo, Garcia de Orta e terminará num Centro de Saúde. O percurso em Santa Maria acabará em abril. Vai sentir falta deste lugar de caos, não vai?
António Urbano: Vou sentir falta a 100%. Santa Maria é a minha casa, muitas vezes a minha primeira casa. Foram seis anos de Santa Maria e da Faculdade. Vivi entre enfermarias, aulas, conheço cada corredor, cada recanto. Este lugar é muito especial, apesar de ser um Hospital antigo, este lugar, esta Faculdade, são a minha casa.
Joana Sousa
Equipa Editorial