As últimas visitas antes de abrir formalmente as portas do novo Edifício fazem-se na sexta anterior ao grande dia. Muito trabalho aconteceu até aqui. A equipa de audiovisuais está presente em peso a resolver os contratempos de última hora, recompõem-se mais uma vez as plantas frescas que dão ar puro ao auditório, testam-se microfones e volume do som, enquanto lá ao fundo do corredor branco e parede de vidro transparente está a Susana, responsável pela Biblioteca, a verificar os últimos detalhes da exposição daquele que dará o nome à grande obra. Engenheiras, manutenção e logística, todos guardam o espaço e cuidam-no como filho seu que não sabe ainda andar sozinho.
No último andar encontramos as Professoras responsáveis da Nutrição, há portas fechadas e procuram-se as chaves certas. Perdemo-nos entre andares e o recado que era para ser transmitido com urgência dilui-se porque queremos admirar a vista do terraço e absorver tudo com orgulho. Lá, em baixo, está a maestrina de tudo, onde há grandes mudanças e obras sabemos que tem a condução de Isabel Aguiar, assim como sabemos que estará lá no fim-de-semana para que se façam os últimos acertos.
O domingo de chuva faz-nos ter preocupações comuns que as trocamos entre mails e mensagens. Dão para o grande dia muita chuva e às 11h da manhã, hora a que inicia o evento, a precipitação é elevada, mas mais elevado é o protocolo que se é obrigado a cumprir quando se recebem tantos ilustres convidados.
A manhã nasce escura, todos chegam cedo e visitam novamente as instalações, como se a cada segundo fosse necessário verificar que tudo se mantém a postos.
Os Professores trocam impressões sobre as apresentações que em breve farão e da construção terminada, afinal ambos assumiram o papel de Diretores e debateram-se para que um antigo sonho fosse erguido em tijolo e cimento, Fausto J. Pinto e José Fernandes e Fernandes, um sucedeu ao outro, imperando sempre o mesmo ideal.
Não é todos os dias que uma faculdade apresenta tão grande obra e a Faculdade de Medicina da Universidade de Lisboa tem motivos para se orgulhar desta inauguração do seu novo Edifício, cuja obra é da Universidade de Lisboa.
O Edifício que recebe o nome de um dos mais ilustres médicos da Cirurgia Geral e Urologia do século XX, o Professor Reynaldo dos Santos, promete ser tão vanguardista quanto o seu mestre inspirador. Nele ficam instalados: o Centro de Bioimagem, Simulação Avançada, Cirurgia Experimental, o Centro Cardiovascular, de Nutrição, bem como o de Engenharia e Tecnologia Biomédica (em parceria com o Instituto Superior Técnico), contempla-se ainda um condomínio para investigação e ensino.
À sua porta, sucedem-se os cumprimentos e as caras que nos são tão próximas e onde nem sempre estamos certos se é por serem do nosso meio, ou rostos de quem comanda parcelas do país, ou o seu todo. Junta-se a imprensa que carrega câmaras e tripés, microfones e flashes e a vontade de saber tanto de política como da utilidade dos novos avanços para a saúde do país.
A cerimónia começa com o descerramento da placa do Edifício, conduzida pelo Diretor da Faculdade de Medicina, Fausto J. Pinto e pelo Reitor da Universidade de Lisboa, António da Cruz Serra. A acompanhá-los estão representantes do governo, o Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior, Manuel Heitor, a Secretária de Estado Adjunta e da Saúde, Jamila Madeira e o Presidente da Câmara de Lisboa, Fernando Medina; a representar o Conselho Geral da Universidade de Lisboa está a sua Presidente, Leonor Beleza; já dentro da área do campus, o Presidente do Conselho de Administração do Centro Hospitalar Lisboa Norte (CHULN) Daniel Ferro e o Presidente do Conselho de Escola, José Ferro, assim como a Presidente do Instituto de Medicina Molecular, Carmo Fonseca, nenhum pensaria faltar. O Professor Reynaldo dos Santos está também representado através dos seus familiares mais próximos. Sampaio da Nóvoa, ex-Reitor e embaixador de Portugal junto da UNESCO na área da educação, ciência e cultura, José Rodrigues, Presidente da Associação de Estudantes da Faculdade, assim como vários Diretores das Escolas da Ulisboa e de outras Escolas Médicas Nacionais, são todos elementos de relevância neste dia.
Professores da Faculdade misturam-se entre outros convidados, ilustres da política e da sociedade. Alguns conhecidos de longa data ou do meio académico, ou de participações governamentais passadas, admiram as instalações e comentam a importância de tamanha inovação. Na dianteira da fila os anfitriões dão provas ao atual governo e restantes convidados do investimento feito e da aposta na Ciência e na Medicina. Entre atropelos de fotógrafos que tentam captar o melhor plano, visitamos o futuro tecnológico que afinal vive já aqui connosco. Diante de nós, estão alguns dos melhores dos melhores, Professores da Faculdade, Diretores de grandes áreas hospitalares de Santa Maria, muitos passam por nós nos corredores discretos e rápidos porque o tempo não lhes dá tempo para fazer tudo o que precisam. Todos são apresentados pelo coordenador do novo Centro de Simulação Avançada, Lucindo Ormonde, que é igualmente o Diretor da Anestesiologia do hospital. Cada um, diante da sua área de especialidade, mostra o que faz e como treinam os outros através de novos simuladores, Diogo Ayres de Campos, Diretor de Obstetrícia, Rui Tato Marinho, Diretor de Gastrenterologia e Hepatologia, Luis Mendes Pedro, Diretor de Cirurgia Vascular, João Coutinho, Diretor de Cirurgia, Ana Abreu, Cardiologista e responsável pelo Programa de Reabilitação Cardiovascular, ou Catarina Sousa Guerreiro, coordenadora de Ciências de Nutrição, todos mostraram o seu canto da casa e os mais recentes modelos de alta precisão.
Lá em baixo, no 1º piso esperam dois auditórios repletos de convidados e elementos da Faculdade.
Os tripés estão colocados a postos para registar os discursos e a plateia aguarda. Fausto J. Pinto faz a abertura e toca nas teclas das principais preocupações, a abertura do Estatuto de Estudante Internacional de Medicina e maior autonomia de gestão às instituições de ensino, mas não só. “No ano em que se celebram os 40 anos do SNS é pois tempo de assumir a tão necessária restruturação dos Hospitais Universitários em Portugal de modo a conferir-lhes maior flexibilidade e capacidade de incorporação de inovação e desenvolvimento científico na praxis clínica, bem como a introdução de regras diferentes de financiamento e de organização, consonantes com a sua tripla missão de prestação de cuidados de saúde, ensino e investigação”.
Habitualmente conhecido por colocar os adjetivos exatos nas palavras que pensa, António da Cruz Serra relembra quem decidiu todo o projeto, Mariano Gago e os 19 anos de espera para terminar o novo Edifício, “demorámos o tempo que a democracia nos impõe para conseguir terminar estar obra. (…) Mas não podemos esperar 19 anos para construir um edifício”.
Professor Catedrático Jubilado, José Fernandes e Fernandes apresenta então o seu mestre, Reynaldo dos Santos. “O Professor brilhante que inspirou a escola médica e trouxe à cultura uma visão nova, ele que foi também um artista. Criador de beleza e de sonho em tudo que fazia e dizia”.
É o último a falar, enquanto um dos elementos do governo e já depois de ter ouvido algumas chamadas de atenção. Manuel Heitor, é o Ministro do Ensino Superior, aquele que olha para a Ciência e Tecnologia com mais foco, vendo-a transposta de forma pioneira através do Centro Académico Médico de Lisboa (CAML) e agora espelhada num novo Edifício que quer enaltecer esse espírito. “Há aqui uma investigação biomédica de excelência, mas um gap de investigação de translação. (…) Em Bruxelas a aposta é a investigação na área do cancro, pretende-se que 3 em cada 4 casos sejam tratados e se mantenham a longo prazo. Apesar de serem áreas críticas, é importante integrar o ensino da Medicina nas práticas médicas e na investigação de translação”.
A cerimónia é brindada a porto de honra. Numa breve exposição que apresenta a todos o mestre, podemos ver alguns utensílios do médico, quadros com a sua imagem, ou inúmeros documentos escritos. O Professor Reynaldo volta a estar diante dos seus, perto de si está uma das netas, a Alexandra Cid dos Santos, há também vários sobrinhos netos. Fotografamos todos juntos, são documento vivo do sangue do Professor e do seu filho, também ele médico, João Cid dos Santos.
Discreto e sem se apresentar está ao lado João Ferreira, jornalista de carreira, formou-se e doutorou-se em História e hoje apresenta a história escrita de Reynaldo. Aviso os presentes que “está aqui o autor do livro biográfico” e a fila adensa-se para pedir autógrafos, como se esperassem que o João pudesse transportar nele vida do Professor.
Já sozinhos pergunto-lhe se só na sua pesquisa histórica conheceu esta figura marcante da Medicina. Eram afinal velhos conhecidos, é que “o brilhante cirurgião, inovador no ensino da Medicina, inventor de terapêuticas até há pouco tempo usadas”, o esteta, o contador de histórias da arte, sempre mestre já nos livros, escreveu sobre a História da Arte e assim tornou-se conhecido do João aprendiz que hoje o relata ao mundo.
O dia segue, os convidados vão dispersando. O Edifício inundado de pessoas curiosas e espantadas volta a ficar todo branco, silencioso, reservado. Em breve abrirá as portas a todos e marcará muitos a partir daí.
Reynaldo dos Santos, agora Edifício, virá a ser um dos melhores centros de inovação e modernidade da Europa e servirá para internacionalizar a Faculdade de Medicina num patamar cimeiro, gerando uma pioneira interdisciplinaridade, conhecimento e avanço da Medicina que não é só local, mas cada vez mais do mundo.
Tal e qual o seu mentor.
Joana Sousa
Equipa Editorial