Mais e Melhor
Há projetos oficiais pensados na integração do Estudante
Foi em 2018 que a Faculdade assumiu a importância do Gabinete de Apoio ao Estudante, questão muito debatida e defendida pelos alunos, aquando da apresentação do segundo mandato do atual Diretor, o Professor Fausto J. Pinto.

Nesse Gabinete, cujo trabalho diário é gerido pela Ana Rita Sobral, da Faculdade de Medicina, e com supervisão do Diretor Executivo, Dr. Luís Pereira, contemplaram-se bolsas para dois projetos. As bolsas de coordenação foram atribuídas a dois estudantes do 4º ano de Medicina, o João Valente, do Mentoring e a Romila Ismail, do Solvin'it.
Apesar de em 2004 ter sido criado um gabinete equivalente, o Gabinete de Apoio e Acompanhamento ao Estudante, aquando a direção do Professor Martins e Silva, este acabou por ser extinto após mudança de direção.
Foi então apenas em 2018 que se voltou a falar novamente do assunto. E apesar de ter surgido oficialmente o Gabinete de Apoio ao Estudante, o Mentoring já contava, desde 2017, com uma parceria com a Faculdade, ano em que se atribuía a primeira bolsa na fase piloto com o Projeto. A ponte era já assegurada por Rita Sobral, na altura elemento da Unidade Académica e que fazia a coordenação e comunicação da experiência piloto não estando ainda agregada a nenhum gabinete em particular.
O Solvin'it, projeto mais recente, recebia em 2018 a sua primeira bolsa, na verdade, a segunda financiada pela FMUL. A proposta veio da Associação de Estudantes que abordou sobre a melhor forma de integrar o projeto, assumindo-o como uma ferramenta útil para o estudo e que já recolhia reconhecimento externo, faltando apenas consolidar-se internamente. Ideia originalmente nascida da AEFML, começaram por dirigir a um tutor de Anatomia e outro de Bioquímica, o convite de supervisionar os materiais de sessões mais personalizadas para os estudantes, facilitadas por pares – os monitores. As sessões foram crescendo, assumindo uma organização cada vez maior e com mais participantes. Nos anos seguintes, quem tinha assistido como participante, tornava-se agora também monitor.
Sempre numa ginástica intensa entre exames, horas paralelas em que trabalham nos projetos e o tempo que precisam para estudar, recebem-me numa hora que abdica de um almoço, no local de atendimento do Gabinete de Apoio ao Estudante. Aqui decorrem parte das reuniões destes dois projetos, bem como as consultas do Espaço S que dá apoio psicológico aos alunos. O Gabinete encontra-se no Edifício Egas Moniz no Instituto de Medicina Preventiva.

O João Valente está ligado ao Mentoring já de trás. Começou como mentorando e a experiência permitiu-lhe concorrer à bolsa de coordenação do projeto, num valor de €1200. Nascido igualmente da vontade da Associação de Estudantes, esta forma de integração de quem chega, pela parte de quem já cá está, foi criando uma rede de trabalho tal, que a Faculdade quis sedimentar a credibilidade e utilidade da iniciativa.

A Romila está no Solvin'it desde a sua 1ª edição, começou como participante, gostou tanto que resolveu tornar-se monitora. Entrou na comissão organizadora e agora assume o cargo de bolseira e coordenadora, seguindo o Solvin'it de forma cada vez mais responsabilizada.
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João qual é a importância que dás a esta parceria entre a Faculdade e o Projeto Mentoring?
João Valente: Desde que se assumiu esta parceria (entre AEFML e FMUL), achei este passo muito importante, porque muitas vezes o contacto que nós alunos temos com a Faculdade é redundante ao ambiente de aula, sendo apenas isso que nos liga à Instituição. É importante a forma como a Faculdade investe nesta parte relacional entre os alunos. No caso do Mentoring é uma forma muito positiva de os integrar na própria Faculdade em si.
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E que importância assume pessoalmente para ti o Projeto?
João Valente: Entrar foi não só por acreditar muito no projeto, mas também porque achei que eu podia fazer alguma diferença. Então, fiquei totalmente alerta quando recebemos um e-mail por parte da Faculdade onde referia a abertura de uma vaga para coordenador e em que se assumia um trabalho conjunto com a Associação de Estudantes.
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Rita, isto quer dizer que o João assume aqui um papel de Co-coordenação com a Faculdade e depois em dinâmica com a AEFML, é assim?
Rita Sobral: Sim, o João tem uma articulação mais próxima comigo enquanto parte da Faculdade, mas há ainda uma outra interação com o Marco Tomás coordenador da área AEFML. Reunimos os três, mas maioritariamente as reuniões são entre mim e o João, onde fazemos os pontos de situação desta articulação.
João Valente: É também importante falar da articulação com as Comissões Organizadoras, porque eles estiveram na origem desta criação e acompanham muito esta evolução (CO-MENT e COSI). Depois, reforçar que o investimento da Faculdade nesta bolsa, e onde dão foco e confiam num estudante em particular, para podermos desenvolver ainda mais o trabalho do Mentoring, mostra também a toda a população de estudantes, a relevância que este projeto e o Solvin'it têm para a Instituição. E analisando o progresso imediato desta aposta, até me parece que o Solvin'it cresceu ainda mais depressa, porque conta muito com o empenho dos próprios Professores. Ainda assim, o crescimento e enriquecimento do Mentoring são também notórios, porque foram mais além e criaram novas ligações ao exterior e com novas faculdades, através da Rede Portuguesa de Mentoria. E agora com o Mentoring 2.0 o boom foi enorme e sozinhos, só com a Associação de Estudantes, não conseguiríamos chegar tão longe.
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Qual é a diferença do Mentoring e do Mentoring 2.0?
João Valente: O Mentoring já acontece há 5 anos. É um projeto de mentoria em que os alunos recém chegados à Faculdade acabam por ter um mentor que estará num ano mais avançado que o seu e que, portanto, já passou por aquilo que o mentorando vai passar, ou algo semelhante. Estes alunos recém chegados, para além dos alunos 1º ano – 1ª vez no Ensino Superior, incluem também os alunos que vêm da Universidade da Madeira (onde iniciaram o curso) e que são integrados diretamente no 3º ano, e ainda os alunos candidatos pelo regime de licenciados. O grande objetivo do Mentoring é promover uma melhor integração no Ensino Superior, na cidade e na própria Instituição, colmatando as dificuldades que se possam sentir.

O Mentoring 2.0 é um projeto de mentoria profissional. Aqui os mentores são Internos de Ano Comum, Internos de Especialidade e ainda Médicos Especialistas. Já os mentorandos são alunos dos anos clínicos, isto é, do 4º ao 6º ano. Este ano, como piloto, conseguimos mais de 120 inscritos, entre mentorandos e mentores. O principal objetivo passa por dar a conhecer a realidade da profissão e dos vários caminhos possíveis após a finalização do curso, ao mesmo tempo que os alunos têm oportunidade de ver de perto especialidades do seu interesse.
Como a grande ajuda do Mentoring é a integração, em qualquer ponto de curso se pode ajudar nesse entrosamento do ambiente, mas depois, por arrasto, também há uma grande ajuda em termos de estudo. E este ano tivemos outra evolução importante, a integração dos licenciados neste projeto, São pessoas, na sua maioria, mais velhas que já vêm de outros cursos e quando chegavam não tinham por hábito se inscrever no Mentoring. Este ano letivo tivemos uma reunião com eles, fomos à sessão inicial para dar a conhecer o Projeto. Facto é que mais de metade se inscreveu. E tivemos vários casos, uns que optaram por mentores mais velhos e que já teriam aparentemente mais experiência, mas também outros não se importaram nada de ter mentores mais novos, que na verdade em termos de anos letivos até estão mais próximos. O feedback foi mesmo muito positivo!
Rita Sobral: Participaram em imensas atividades nossas. Este ano a nossa preocupação, mais do que estudante do ensino superior do primeiro ano e pela primeira vez, foi olhar para o estudante que viesse ele de onde viesse, estivesse ou não na Faculdade pela primeira vez. E ainda temos que pensar mais no futuro nestas situações, independentemente do grau de ensino. Isto porque ainda estamos muito direcionados para os primeiros ciclos, mas a verdade é que também estudantes que estão em mestrados têm dificuldades de integração. Inclusivamente, estudantes de doutoramento já nos deram feedback a mostrar que gostariam de ser integrados de alguma maneira.
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Romila, apresenta-nos o Solvin'ít.
Romila Ismail: É um projeto de peer teatching, que significa educação pelos pares. É feito de alunos para alunos, onde se trocam informalmente conhecimento, ajudando o percurso de um aluno na sua vida académica. Criamos sessões onde há partilha de informação de um monitor mais velho que teve "inspiração divina" naquela matéria e quis dar um pouco de si aos alunos que estão e que querem saber mais. Tudo isto conta com o apoio dos Institutos e dos Tutores que ano após ano vai crescendo e envolvendo, assumindo uma estratégia que, não substituindo teóricas nem aulas práticas, complementa o estudo dos alunos e motiva-os a estudar.
Rita Sobral: E quem quer ser monitor do Solvin’it tem de ter uma formação onde aprende estratégias de comunicação e formação adequada. É com pares e com o Departamento de Educação Médica que se trabalha, onde é dada a formação para que saibam como ser um bom monitor, dar feedback e ganhar ferramentas que permitam depois exigir mais qualidade.
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Isto quer dizer que o Solvin'it tem a validação dos Professores?
Romila Ismail: Toda a informação que é dada aos participantes, validada primeiro com o Professor ou Assistente que chamamos de tutor. Esse tutor valida todos os nossos powerpoints, perguntas e fichas de avaliação. Logo, não queremos contornar os docentes, mas sim é após a aprovação deles que partimos para o nosso trabalho.
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Ainda relativamente à integração dos alunos fica um dado curioso no ar. Estejam em que target etário estiverem, as pessoas não têm pudor em pedir ajuda na integração. Bom sinal, não é?
Rita Sobral: Havia uma ideia que o Mentoring era apenas para os recém chegados, os mais novos, e esta nossa abordagem para os estudantes da Madeira, mesmo antes deles chegarem, ajudou a quebrar esta ideia. Ajudou a que as pessoas ficassem muito mais desinibidas. É engraçado que na reunião dos licenciados estava lá uma pessoa que já era interna e que tinha ingressado em Medicina por esse regime e defendeu, precisamente, que não é preciso ter vergonha em ter alguém 10 anos mais novo a ajudar e a fazer informalmente de mentor.
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E esta bolsa anual permite fazer o quê em concreto?
João Valente: Como tem um bolo anual de €1200, cada mês recebo €100 e no fundo deve-se ao facto de estar trabalhar no desenvolvimento do projeto enquanto co-coordenador. Para além dessa coordenação conjunta e desse desenvolvimento, tenho ainda no Gabinete de Apoio ao Estudante, onde cumpro um horário de atendimento para receber participantes do Mentoring, efetuar inscrições no Projeto, resolver problemas de match mentor-mentorando, tirar dúvidas, emitir e dar certificados de workshops, bem como algum material necessário para algum tipo de formação ligado ao Mentoring, etc. Aconteceu muito no começo do ano, receber individualmente mentores que não tinham conseguido ir às sessões de esclarecimento e fui falando mais com eles, o que permitiu que eles não perdessem a capacidade de continuar a acompanhar as ações, e com isso conseguimos aumentar a adesão ao Mentoring. Para além de tudo isso, e entre tantas outras coisas, em ambos os semestres desenvolvemos um kit de sobrevivência, que atribuímos aos nossos novos alunos, onde damos dicas de “como sobreviver”, não só na Faculdade, como sobre a própria cidade, já que muitos vêm de fora.
Rita Sobral: Deixem-me acrescentar algumas iniciativas importantes para a integração do estudante:
A importância do Espaço S que incide bastante sobre as questões associadas à integração na faculdade e gestão de stress e ansiedade mas também vai para além da integração. Aqui o objetivo é atuar preventivamente e não só sobre as ações quando elas decorrem. Por exemplo, o Dia do Deslocado foi uma iniciativa do Espaço S, com o apoio do Mentoring, e pretendia promover uma tarde entre todos os deslocados.
Mas há também outro aspeto interessante que é a promoção das competências transversais entre pares, nas soft skills, caso disso foi a "gestão de stress", "gestão de tempo" e "gestão emocional" com a colaboração do Serviço de Psiquiatria e Saúde Mental do HSM, todas formas de integração, para que as pessoas se sintam mais compreendidas. É, aliás, cada vez mais preocupação do GAE aproximar estas três áreas (Mentoring, Solvin’it e Espaço S), com vista a uma transversalidade de ações.
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Rita, uma coisa que percebo e que nos vais transmitindo, é que este cuidado com o outro já vai muito além destas portas. Neste momento estás envolvida em Encontros e reuniões que já transcende a vida desta Faculdade.
Rita Sobral: A rede portuguesa de mentoria inter-pares teve início num congresso internacional, onde foram convidados alguns projetos para demonstrar as suas boas práticas, entre as quais o Mentoring. Correu tão bem ou tão mal que fomos convidados a participar numa segunda reunião. A EXARP que foi impulsionada pela Direção Geral de Ensino Superior, contactou-me, a dizer que tinha gostado muito da iniciativa e gostava de começar a realizar atividades connosco. O Mentoring já recebeu um selo Exarp e o Solvin'it está agora a ser proposto. Isto quer dizer que temos o reconhecimento público que somos uma boa prática de integração no ensino superior e isso é muito importante. Havia, de facto, uma preocupação institucional dos vários projetos envolvidos e que foram convidados a participar, entre outras reuniões, para definir uma rede portuguesa de mentoria, mesmo antes da preocupação da integração. Todos temos preocupações comuns, mas com alguns pontos diferentes, se Aveiro se preocupa muito com a integração do estudante internacional, já a faculdade do Porto dá grande foco à integração das minorias. E nós, não tendo tanto estas atenções viradas, sabemos que possivelmente por uma razão ou outra teremos de começar a dar-lhes mais foco. Há outra curiosidade, o Mentoring é o único projeto que não foi institucional, se nos outros casos das universidades e faculdades ele começou como uma iniciativa institucional, aqui ele nasceu no seio dos estudantes. E isso teve um reconhecimento muito grande. Neste momento a rede já foi oficializada, com o seu lançamento no dia 27 de março, na presença do Secretário de Estado. Neste momento, mais do que um site, ou uma rede de partilha de boas práticas, nós queremos ir mais além e vamos ter o segundo seminário internacional de redes de mentoria, na Universidade de Aveiro, onde vão participar as entidades fundadoras, novas entidades vão assinar a carta e projetos internacionais convidados.
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João, do teu 1º ano para este 4º e quando olhas para o tema da integração, vês mudanças significativas?
João Valente: Vejo, até pelo número de alunos interessados nesse tema - que tem vindo a crescer bastante. No meu 1º ano de Faculdade o projeto existia há 2 anos e estava num estado muito inicial. Mas teve um impacto tão grande nas pessoas, que elas quiseram fazer parte e não o deixar. É curioso porque temos uma pool (4º e do 5º ano) de pessoas que, aparentemente, não teria tanta vontade de receber pessoas do 1º ano, mas o facto é que continuam a querer participar.
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Só este ano o Solvin’it atingiu, num semestre, o número total de participantes do ano passado. A acrescentar a esse dado cresceram ainda com 17 sessões novas, assumindo até 3 tutores em algumas áreas.
O Solvin'it, o Mentoring e o próprio Espaço S confluem para a integração do outro, olhando para cada um à medida, estabelecendo a melhor forma de ajuda e de interação com o outro, de modo cada vez mais personalizado.
Cresceram porque ouviram atentamente o que queriam os estudantes receber. Através de formulários de avaliação conseguiram estabelecer pontos de partida, aspirando novas metas. Isso não impediu que não sugerissem novas abordagens, fazendo nascer novos caminhos e perspetivas, mesmo sem terem sido pedidos, sinal que assumem um papel de responsabilidade de quem tem de antecipar os próprios acontecimentos. Esta equipa de coordenação faz questão de salientar que Solvin'it e Mentoring existem porque contam com a ajuda de diversos voluntários, especialmente as Comissões Organizadoras, que se dispõem a um trabalho de equipa que dão ritmo à engrenagem. Só assim os projetos têm funcionado e aumentado.
Num futuro próximo importa ao Gabinete de Apoio ao Estudante alargar o espectro de integração para outras áreas; as minorias, ou os alunos internacionais serão os próximos patamares. Também os nossos alunos que vão estudar para outros países merecem já redobrada atenção, uma vez que se começou a desenhar o mecanismo para implementar consultas com o psicólogo do Espaço S via skype e à distância, para que não percam o elo de ligação à casa e às raízes.
A Romila Ismail é portuguesa, tem 22 anos, mas com 1 ano e durante os 18 seguintes foi viver com os pais para Moçambique, Maputo. Estudou sempre numa escola portuguesa e diz que desde que se lembra de existir sempre quis ser médica. Mas essa aspiração não lhe chegava, queria ser médica em Santa Maria. Lembra-se de vir com o avô às consultas do Hospital e olhava para tudo e projetava-se naquele lugar. Filha de um Economista e de uma mãe doméstica, nunca teve médicos na família. Apaixonada pelo que faz, gostaria de seguir a parte clínica e apesar de falar da difícil situação dos estudantes, que não seguem todos a área que querem. Gostaria de ser Assistente de uma cadeira, porque leva muito a sério o ensino, ou não coordenasse ela o Solvin'it. .
O João Valente tem 22 anos e apesar de não ter dúvidas sobre a sua apetência para a área da Saúde, sempre gostou de a associar à Comunicação. Diz que foi esse o puzzle que montou para o seu futuro. É a importância de saber falar com os outros e de os ouvir, que fez com olhasse para a Comunicação Social como um foco iluminado que não lhe desviava o olhar. Talvez isso explique a sua intervenção no Mentoring. O João não dissocia o cuidado com o outro e a boa interação, com a ambivalência necessária que o médico tem de ter para ser um verdadeiro médico. Médico sim, porque também é a clínica que vai escolher. Refere que tem convivido com excelentes exemplos na Faculdade, Professores e Médicos, que lhe fortalecem esta ideia de caminho comum, "Eu vejo-os e penso, quero sair assim quando for grande". Do puzzle arquitetado entre o trato humano e a clínica, refere que talvez se afaste das cirurgias, porque precisa mais da escuta ativa, "à mão na massa".
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Joana Sousa
Equipa Editorial
