Momentos
João Godinho – o contador de histórias através da imagem
É um ribatejano que não é de gema, natural da Chamusca, quem o conhece sabe da sua tolerância e descrição, conciliador, interrompe-me a esclarecer que às vezes também se chateia. Rótulos à parte, não gosta de touradas, mas dar uns tiros de caça já é atividade que lhe agrada, de resto diz que as raízes geográficas mais conservadoras "lhe passaram completamente ao lado". Pai de um casal de filhos e depois de aproveitados os tempos mais boémias de Lisboa e quando era solteiro, agora recolhe-se em família, quase todos os fins-de-semana, à sua terra natal e agradece ter sossego. João Godinho é o coordenador da equipa de Audiovisuais.
Começou por ser paginador do jornal regional "O Mirante" e por lá andou durante 5 anos. Resolveu fazer as malas e rumou a Lisboa onde continuou a paginar, desta vez o Índice Nacional Terapêutico, a "bíblia" que reúne todas as bulas dos medicamentos nacionais.
O Edifício Egas Moniz estava em fase de conclusão e era preciso reforçar equipas, isso permitiu que João Godinho entrasse em 2004 para a Faculdade de Medicina, nos Audiovisuais. Trazia na bagagem a experiência de lidar com programas de imagem e paciência de quem lidava com milhares e milhares de páginas. Mas ganhou também bagagem mal chegou, porque a sua primeira missão foi a abertura do Grande Auditório João Lobo Antunes. Videoconferências todos os dias com a Universidade da Madeira passaram a ser uma das suas rotinas, desafiando-o a aperfeiçoar técnicas e a aprender outras novas até para si. Foi sendo um autodidata e hoje todas as equipas o chamam para fazer vídeos. E apesar de a edição vídeo ser o seu maior gosto, não é a sua principal função, dá com a sua equipa apoio às aulas e às apresentações dos Professores. Com o tempo entendeu que podia ir mais longe e ajudar mais os outros, afinou o gosto e transformou-o em imagem e na mistura destes dois ingredientes foi criando trabalhos criativos, proporcionais à sua dedicação. Diariamente lida com a pressão, com pedidos urgentes e que surgem em simultâneo. Diplomata a gerir feitios e personalidades díspares, diz que há uma diferença de atitude dos mais novos para os mais velhos, que descomplicam mais, talvez por serem menos ansiosos. Mas não foi só o João que se foi modernizando nas técnicas de aprendizagem, os próprios Professores o fizeram ao longo do tempo, despedindo-se dos antigos slides, para os atuais power point's, os “data show's como chamam alguns Professores aos projetores de vídeo", diz a sorrir. Gosta de estar nos grandes eventos da Faculdade e tem especial motivação com as equipas estrangeiras já que diante de contratempos técnicos lidam calmamente com os planos B e C.
Refere que a sua equipa de trabalho é extensão da sua família, "revejo-me muito no Rui (Vila) e no Paulo (Caeiro), porque eles têm uma forma de estar muito tranquila, o que nos permite gerir melhor as situações de stress".
Foi precisamente o Rui que lhe ligou no dia do incêndio da Aula Magna. "Estava a fazer umas compras e ele liga a dizer que a SIC estava a noticiar que havia qualquer coisa a arder. De início até lhe disse para ele não brincar com uma coisa dessas. Mas ele insistiu tanto que era a sério que aí acreditei. Vim direto".
Elogia o trabalho e a eficácia dos bombeiros, mas muda a expressão enquanto fala, perdeu o sorriso, como se assistisse a um filme que não lhe dá tanto gozo de editar." Eu tentei chegar à Aula Magna e os bombeiros disseram-me que não podia avançar mais, estava ali junto ao Conselho, mas o fumo era tanto que nem se conseguia respirar naquele corredor. Foi horrível. Tive de recuar".
Logo naquela noite João sabia que algo correra muito mal e que tudo o que se planeara para a Aula Magna seria agora muito mais profundo em termos de obra, muito mais drástico. Desafiado pela sua diretora Isabel Aguiar e enquanto se interrogava sobre o que fazer para colocar a Aula Magna ao nível dos grandes auditórios nacionais e internacionais, foi espreitando o que ficara, cuidando das suas peças vítimas de um fogo avassalador.
Dedicou-se a limpar o material que se salvou, tentando reaproveitar tudo o que era possível, o que lhe deu mais trabalho foi um sistema de videoconferência, chamuscado e em mau estado, explica que “valia a pena a paciência da recuperação, já que tinha um custo muito elevado comprar um novo”. Por isso limpou-o todo a cotonetes e álcool e devolveu-lhe vida. "Quer na aquisição, quer na recuperação dos materiais eu trato como se fosse para mim, tentando evitar que se gaste demasiado com produtos que muitas vezes estão inflacionados no mercado".
Estudou as melhores soluções para um auditório que pretendia que fosse todo ele digital, sem euforias diz que a missão está cumprida, mas que há ainda pormenores a aperfeiçoar.
O que mudou tecnicamente da antiga Aula Magna para esta agora renovada?
João Godinho: Tecnicamente, a renovação da Aula Magna destaca-se pela mudança do sistema audiovisual anterior analógico para o agora digital. Todos os serviços prestados anteriormente serão mantidos, como streaming, gravações, videoconferências, entre outros, mas com uma melhor qualidade.
Muitas vezes eram solicitadas transmissões de streaming de forma improvisada, neste momento temos o equipamento específico para o fazer.
O fator mais relevante na renovação da sala prende-se na qualidade do som. Os equipamentos são mais sofisticados e permitem uma melhor acuidade auditiva.
Olhamos para tudo pronto e achamos que se calhar foi fácil compor esta sala. Mas conta-me os passos que precisaste dar com a tua equipa para chegarmos aqui.
João Godinho: Após ter superado o impacto do incêndio que destruiu a nossa Aula Magna, um espaço de referência para a realização de diferentes tipologias de eventos. Foi altura de colocar mãos à obra e devolver a sua magnitude.
Inicialmente foram elaborados vários contactos com empresas do mercado audiovisual, de modo a estar mais atualizado com novas técnicas e dinâmicas relacionadas com salas semelhantes. Após vários contactos e avaliações das sugestões e propostas encaminhadas, foi possível preparar um projeto que fosse ao encontro das espectativas do nosso público-alvo. A qualidade acústica foi um dos principais aspetos que foram tidos em conta na escolha dos equipamentos, e na disposição dos mesmos, sem por em causa o conforto e às questões estéticas.
Houve algum contratempo que recordes no balanço desta obra?
João Godinho: Os poucos contratempos que foram surgindo, facilmente foram superados com a colaboração da Drª Isabel Aguiar, nomeadamente as questões relacionadas com a renovação do espaço físico. Os trabalhos foram decorrendo muito bem de forma organizada, em sintonia com o pessoal da carpintaria, eletricidade, pintura, cadeiras, entre outros. A gestão das intervenções da empresa PLL Audiovisuais, em conjunto com as várias etapas das obras foi de extrema importância para a conclusão do projeto no prazo estabelecido.
Quando lhe pergunto se está pronto para o próximo auditório a ser remodelado diz que em cada crise há uma aprendizagem, mas que prefere ir devagar até porque os processos de obras lhe põem à prova a resiliência.
Joana Sousa
Equipa Editorial