Do passado ao presente
E foi que de doença crua e feia…
James Lind (1716-1794), a quem chamaram o «Hipócrates da medicina naval», foi um médico escocês, célebre sobretudo pelo seu trabalho na descoberta da cura para o escorbuto e que contribuiu também para o avanço da medicina preventiva e da saúde pública.
Quanto à cura para o escorbuto, trata-se na verdade de um feito notável, atendendo ao facto de que esta doença, que hoje se sabe ser causada pela carência de vitamina C no organismo, matava, nesta época, mais marinheiros do que a própria guerra. A título de exemplo, na viagem de circum-navegação do almirante inglês George Anson, de uma tripulação de cerca de 1900 homens, aproximadamente 1400 morreram por ação da doença.
Lind concluiu que a ingestão de citrinos poderia conduzir a uma prevenção eficaz e à cura do escorbuto. Não foi o primeiro a pensar que a resolução do problema deveria passar por mudar a dieta dos marinheiros e, em particular, pela inclusão de citrinos, mas foi efetivamente pioneiro na condução de uma das primeiras experiências médicas controladas que, efetivamente o demonstraram.
Lind defendeu uma cuidada ventilação e arejamento das embarcações e uma mais cuidada higiene dos marinheiros, das suas roupas e lençóis.
Em 1753 publicou A Treatise of the Scurvy e, em 1757, An Essay on the Most Effectual Means of Preserving the Health of Seamen in the Royal Navy, onde dava conta das condições de vida deploráveis dos marinheiros e das suas dietas deficitárias.
A descoberta de Lind foi aplicada apenas cerca de 40 anos mais tarde, quando se deu ordens para incluir sumos de citrinos nas dietas dos marinheiros. Com esta simples medida, os casos de escorbuto desapareceram quase por completo da marinha britânica.
Os terríveis efeitos do escorbuto no organismo deixaram uma impressão terrível, não apenas entre os homens do mar, mas também nas populações em geral. Entre nós, ficaram celebres os versos de Camões n’Os Lusíadas (Canto V, 81-82):
E foi que de doença crua e feia,
A mais que eu nunca vi, desampararam
Muitos a vida, e em terra estranha e alheia
Os ossos para sempre sepultaram.
Quem haverá que, sem o ver, o creia?
Que tão disformemente ali lhe incharam
As gengivas na boca, que crescia
A carne, e juntamente apodrecia.
Apodrecia com um fétido e bruto
Cheiro, que o ar vizinho inficionava;
Não tínhamos ali médico astuto,
Cirurgião subtil menos se achava;
Mas qualquer, neste ofício pouco instructo,
Pela carne já podre assim cortava
Como se fora morta, e bem convinha,
Pois que morto ficava quem a tinha.
size="30"
Também entre os ingleses os efeitos do escorbuto encontraram expressão literária, como nestes versos, de pendor satírico:
Scurvy Pirate
What do you do with a scurvy pirate?
Load the cannon up and fire it.
What do you do with a scurvy pirate?
Make them walk the plank!
We’ll raid their scurvy pirate ship
and make them walk the plank.
Grab up all their treasure…
And put it in the bank!
size="20"
Os marinheiros ingleses ficaram desde então conhecidos, num termo pejorativo em calão usado por americanos e canadianos, por «limeys», com origem em «lime juice», pelo consumo de sumo de limão.
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LIND, James, 1716-1794
An essay on the most effectual means of preserving the health of seamen in the Royal Navy : and a dissertation on fevers and infection : together with observations on the jail distemper, and the proper methods of preventing and flopping its infection / James Lind. - 3rd ed. - London : D. Wilson and G. Nicol, 1774. - XX, 363, [1] p. ; 22 cm
Cota da Biblioteca-CDI da FML: RES. 1413
size="40"
LIND, James, 1716-1794
A treatise of the scurvy, in three parts : containing an inquiry into the nature, causes, and cure, of that disease : together with a critical and chronological view of what has been published on the subject / by James Lind .... - The third edition, enlarged and improved. - London : printed for S. Crowder, D. Wilson and G. Nicholls, T. Cadell, T. Becket and Co., G. Pearch, and W. Woodfall, MDCCLXXII [1772]. - 1 vol.
Cota da Biblioteca-CDI da FMUL: RES. 4087
size="60"
André Rodrigues
Área de Biblioteca e Informação
andresilva@medicina.ulisboa.pt
Quanto à cura para o escorbuto, trata-se na verdade de um feito notável, atendendo ao facto de que esta doença, que hoje se sabe ser causada pela carência de vitamina C no organismo, matava, nesta época, mais marinheiros do que a própria guerra. A título de exemplo, na viagem de circum-navegação do almirante inglês George Anson, de uma tripulação de cerca de 1900 homens, aproximadamente 1400 morreram por ação da doença.
Lind concluiu que a ingestão de citrinos poderia conduzir a uma prevenção eficaz e à cura do escorbuto. Não foi o primeiro a pensar que a resolução do problema deveria passar por mudar a dieta dos marinheiros e, em particular, pela inclusão de citrinos, mas foi efetivamente pioneiro na condução de uma das primeiras experiências médicas controladas que, efetivamente o demonstraram.
Lind defendeu uma cuidada ventilação e arejamento das embarcações e uma mais cuidada higiene dos marinheiros, das suas roupas e lençóis.
Em 1753 publicou A Treatise of the Scurvy e, em 1757, An Essay on the Most Effectual Means of Preserving the Health of Seamen in the Royal Navy, onde dava conta das condições de vida deploráveis dos marinheiros e das suas dietas deficitárias.
A descoberta de Lind foi aplicada apenas cerca de 40 anos mais tarde, quando se deu ordens para incluir sumos de citrinos nas dietas dos marinheiros. Com esta simples medida, os casos de escorbuto desapareceram quase por completo da marinha britânica.
Os terríveis efeitos do escorbuto no organismo deixaram uma impressão terrível, não apenas entre os homens do mar, mas também nas populações em geral. Entre nós, ficaram celebres os versos de Camões n’Os Lusíadas (Canto V, 81-82):
E foi que de doença crua e feia,
A mais que eu nunca vi, desampararam
Muitos a vida, e em terra estranha e alheia
Os ossos para sempre sepultaram.
Quem haverá que, sem o ver, o creia?
Que tão disformemente ali lhe incharam
As gengivas na boca, que crescia
A carne, e juntamente apodrecia.
Apodrecia com um fétido e bruto
Cheiro, que o ar vizinho inficionava;
Não tínhamos ali médico astuto,
Cirurgião subtil menos se achava;
Mas qualquer, neste ofício pouco instructo,
Pela carne já podre assim cortava
Como se fora morta, e bem convinha,
Pois que morto ficava quem a tinha.
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Também entre os ingleses os efeitos do escorbuto encontraram expressão literária, como nestes versos, de pendor satírico:
Scurvy Pirate
What do you do with a scurvy pirate?
Load the cannon up and fire it.
What do you do with a scurvy pirate?
Make them walk the plank!
We’ll raid their scurvy pirate ship
and make them walk the plank.
Grab up all their treasure…
And put it in the bank!
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Os marinheiros ingleses ficaram desde então conhecidos, num termo pejorativo em calão usado por americanos e canadianos, por «limeys», com origem em «lime juice», pelo consumo de sumo de limão.
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LIND, James, 1716-1794
An essay on the most effectual means of preserving the health of seamen in the Royal Navy : and a dissertation on fevers and infection : together with observations on the jail distemper, and the proper methods of preventing and flopping its infection / James Lind. - 3rd ed. - London : D. Wilson and G. Nicol, 1774. - XX, 363, [1] p. ; 22 cm
Cota da Biblioteca-CDI da FML: RES. 1413
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LIND, James, 1716-1794
A treatise of the scurvy, in three parts : containing an inquiry into the nature, causes, and cure, of that disease : together with a critical and chronological view of what has been published on the subject / by James Lind .... - The third edition, enlarged and improved. - London : printed for S. Crowder, D. Wilson and G. Nicholls, T. Cadell, T. Becket and Co., G. Pearch, and W. Woodfall, MDCCLXXII [1772]. - 1 vol.
Cota da Biblioteca-CDI da FMUL: RES. 4087
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André Rodrigues
Área de Biblioteca e Informação
andresilva@medicina.ulisboa.pt