Mais e Melhor
Estilos de Vida Saudáveis – Uma sinergia entre o poder local e a academia
Projeto Sintra Cresce Saudável
No enquadramento dos princípios da promoção da saúde e educação para a saúde, a escola é considerada um ator chave. Os princípios das escolas promotoras de saúde baseiam-se na Carta de Otawa (OMS, 1986) e na Convenção dos Direitos da Criança (1989). Deste modo, a escola apresenta um papel fundamental no desenvolvimento de comportamentos promotores de um estilo de vida saudável, onde se incluiu a alimentação e a atividade física. A escola é o local onde as crianças passam a maior parte do seu dia e onde fazem, pelo menos três das refeições diárias. É na infância que se consegue melhores resultados para desenvolvimento de conhecimento, atitudes e comportamentos que prevalecem na vida adulta.
A evidência científica mostra-nos a necessidade de intervir na modificação de hábitos alimentares e recomenda que deve existir uma abordagem multidisciplinar para a obtenção de melhores resultados. Assim, é mais eficaz envolver todos os stakeholders para alcançar os objetivos da promoção da saúde. Deste modo, no contexto escolar, o grupo de ação deve ser constituído por representantes das escolas, professores, pessoal não docente, pais, crianças e profissionais de saúde.
Para além destes elementos, a intervenção deve ser multicêntrica, atuando em diferentes domínios de forma integrativa: currículo escolar, ambiente escolar, alimentação escolar, a comunidade escolar e os serviços de saúde. No entanto, dependendo do contexto e da realidade que se vive, deverão ser definidos quais os interesses e preocupações para a comunidade em questão.
No que diz respeito ao currículo escolar, a educação alimentar é um elemento crucial para o desenvolvimento de hábitos de vida saudáveis em crianças, sendo importante que as mensagens da escola sejam consistentes, reforçando-se mutuamente e estando refletidas em todo o currículo, “formal, não formal e oculto”. No entanto, estas matérias requerem profissionais adequadamente qualificados e recursos apropriados para o seu ensino. O currículo escolar no âmbito das food skills deve abranger várias categorias: a nutrição e saúde; a preparação, conservação e armazenamento de alimentos; a sensibilização de consumidores, direitos dos mesmos e literacia mediática; a produção, processamento e distribuição de alimentos; a sustentabilidade e ecologia alimentar. Com o ensino destas matérias as crianças tornam-se mais conscientes da importância de seguir uma dieta saudável, aprendem a preparar alimentos de forma económica e ecológica e desenvolvem habilidades de preparação e confeção para além de ficarem capacitadas para fazer escolhas mais informadas sobre os alimentos que devem consumir, compreendendo rótulos alimentares, valor nutricional dos alimentos, bem como as próprias necessidades diárias.
Da relevância desta área na atualidade e das atribuições legais do poder local no âmbito da promoção para a saúde, nasce o Projeto Sintra Cresce Saudável (SCS) | Promoção de Estilos de Vida Saudáveis em Contexto Escolar, promovido pela Câmara Municipal de Sintra, em sinergia com a academia. É um projeto de intervenção para promoção de estilos de vida saudável, dirigido a crianças do 1º ciclo do ensino básico, assente numa metodologia de investigação participada de base comunitária, que integra ciclos de avaliação-planeamento-intervenção. Este projeto conta com a colaboração de parceiros da academia em áreas do conhecimento distintas (Saúde e nutrição; atividade física; comunicação), sendo que Faculdade de Medicina da Universidade de Lisboa (FMUL), assume a liderança técnico-científica do projeto, existindo para o efeito uma investigadora responsável - Dra. Telma Nogueira. De salientar ainda a existência de um Conselho Consultivo constituído por entidades de referencia nacionais nas principais áreas de atuação do projeto.
O projeto tem como objetivos major desenvolver um modelo de intervenção de promoção de estilos de vida saudáveis em contexto escolar, avaliando o impacto da intervenção e potenciando a definição e disseminação do modelo de intervenção.
A intervenção do SCS centra-se ao nível de todos os atores da comunidade escolar: alunos, famílias, professores e pessoal não docente, e prioriza 3 eixos:
- Desenvolvimento e implementação de Atividade de Enriquecimento Curricular (AEC) ou Oferta Complementar
- Intervenção no Ambiente Alimentar Escolar - definição e implementação de Política Alimentar Escolar
- Intervenção no Currículo Escolar - integração de princípios de alimentação saudável em atividades curriculares
A interação destes eixos e a intervenção participada promovem uma abordagem inovadora, potenciando o desenvolvimento das dimensões de capacitação para a promoção da saúde (comportamentos promotores de alimentação e atividade física saudáveis) e o desenvolvimento de competências como a autorregulação, resolução de problemas, comunicação e pensamento criativo e crítico, previstas no Perfil dos Alunos à saída da escolaridade obrigatória.
Este projeto para além do seu carácter inovador apresenta robustez científica e pode ter capacidade de alterar comportamentos, com vista a ganhos em saúde a curto e a longo prazo, alicerçados na tríade escola-família-poder local, potenciados pela academia.
O projeto piloto ocorreu no ano letivo 2017/2018 num agrupamento de escolas onde se envolveram cerca de 500 crianças no grupo de intervenção, existindo para efeitos de avaliação um grupo de controlo com um número idêntico de crianças (outro agrupamento de escolas do concelho).
Durante o último ano foram desenvolvidas várias atividades: diagnóstico de necessidades, envolvimento da comunidade escolar, criação de rede de parcerias, planeamento da intervenção com a comunidade escolar, envolvendo todos os atores e responsabilizando-os para a implementação, e avaliação.
Os trabalhos encontram-se atualmente na fase de disseminação por mais 2 agrupamentos de escolas (cerca de 1300 crianças).
No âmbito do eixo de intervenção no ambiente alimentar escolar, desenvolveram-se os instrumentos e metodologia de avaliação de lanches consumidos em contexto escolar, sendo estes observados e avaliados qualitativa e quantitativamente. Perante os resultados, define-se e implementa-se a política alimentar da escola.
A FMUL regozija-se desta parceria e de contribuir com o seu know how científico num projeto tão relevante em Saúde Pública, em que os ganhos em saúde e os resultados a longo prazo serão seguramente muito positivos para a população infantil do concelho de Sintra.
Joana Sousa
Professora da FMUL de Ciências da Nutrição