Do lado de cá
Sara Neto – a aluna de Medicina que está no ranking da Women's Tennis Association
No meio de dezenas de e-mails, havia um por abrir, dizia o seguinte:
“Gostaria de saber se estão interessados em publicar um artigo sobre uma atleta de competição que treina em Cascais, no clube de ténis do Estoril e que está no top 10 do ranking nacional e é a número 1 no apuramento para o masters nacional da FPT onde são apurados os 8 melhores jogadores nacionais. Está igualmente no 6º ano do curso de Medicina da FMUL, sem nunca ter deixado uma cadeira por fazer. Esta atleta treina diariamente, conciliando a faculdade com os treinos e compete praticamente todas as semanas, quer a nível nacional, quer internacionalmente. Pode ser um exemplo inspirador para muitos jovens.” – João Pedro Rocha (preparador físico da Sara)
Chama-se Sara Neto e cada dia da sua vida é um puzzle perfeito onde nenhuma peça pode encaixar um milímetro ao lado.
Aluna da Faculdade de Medicina da Universidade de Lisboa diz que se deixa esmorecer no curso quando, por alguma lesão, falta aos treinos. É como se um elemento já não lhe fizesse sentido sem o outro. Simples? Não, nada simples. Sara acorda às 06h da manhã e aproveita as primeiras horas da manhã para estudar, segue-se um treino entre as 09h30 e as 12h e às 14h já está a caminho do seu estágio curricular, no Hospital das Forças Armadas, no Lumiar, ao mesmo tempo trabalha na tese de final de curso. Até ao fim do ano seguirá para o Hospital de Cascais e para o Hospital de Santa Maria para terminar o estágio.
Depois, mais a tarde volta a treinar, guardando energia para estudar mais um pouco até às 23h, hora a que vai descansar.
Atualmente no 6º lugar nacional do ranking português de ténis, conquistou ainda internacionalmente 1 ponto no ranking da Women's Tennis Association (WTA), “ este ranking é a classificação mundial do circuito profissional de ténis, onde todas as atletas “sonham” entrar e progredir. É muito competitivo e exigente em todos os níveis”. Explica que as viagens internacionais ficam reservadas para a altura das férias, altura em que consegue gerir melhor agendas desportivas e que, durante o ano letivo, compete apenas nacionalmente, o que a obriga a ir no mesmo mês várias vezes a Coimbra e ao Porto.
Seja dentro do país, ou fora, é o treino após treino, que a leva à progressão. Mas isso obriga-a a escolhas permanentes, “Implica muito esforço, horas de treino, e abdicar de muitos aspetos da vida social e familiar para poder estar disponível a 100% para jogar. Devo sair à noite só duas vezes por ano, mal vejo os meus amigos”.
Altamente motivada para os desafios, admite que o ténis muitas vezes é uma “relação de amor/ódio”, o que faz com que, por vezes, quebre “mas são fases menos boas, onde é preciso ter força para dar a volta por cima confiar nas pessoas certas e continuar a trabalhar até os resultados aparecerem!”.
E aparecem mesmo, o sucesso de Sara Neto não se faz sozinho e não existiria sem o apoio do seu treinador de ténis, Ricardo Cochicho e de algumas marcas que a patrocinam com produtos de desporto e suplementos de alimentação, já que os custos de logística e deslocação são comportados pela família e pelo “pouco” dinheiro que vai ganhando nos torneios. Sara conta ainda com outras motivações, as institucionais, a Faculdade e Escola de ténis do Estoril ajustam horários às suas necessidades para que não falhe enquanto aluna e atleta. “Os Professores de ambas as escolas ajudam-me imenso e mudam-me horários para que eu conseguia acompanhar as aulas, mas também tenho imensa sorte com os amigos que tenho no curso porque me estão sempre a passar apontamentos e a dar informação quando falto, há um espírito de entreajuda incrível!”.
Quando lhe perguntamos onde se agarra quando tudo falha, Sara lembra-se de um jogo em concreto, “num torneio longe de casa, onde tinha ido sozinha e demorei 5 horas em transportes, estava quase a perder e a jogar mal, com uma atitude derrotada! Lembro-me então de ter pensado para mim: “então, fizeste este caminho todo sozinha, gastas dinheiro e chegas aqui e perdes na 1ª ronda?! Não pode ser!!!” A partir daí agarrei-me de tal maneira ao jogo que ganhei o jogo em 3 sets, e acabei por ganhar o torneio!”.
Pelo caminho seguem em paralelo o ténis e a Medicina. Sabe que daqui a um ano, precisamente, estará a fazer a nova Prova Nacional de Seriação. Fará parte do primeiro grupo que se defrontará com um novo sistema de provas que contempla o Harrison, mas tantos mais casos agora mais práticos, diz-nos. No futuro vê-se a exercer Medicina interna, porque tem de circular pela área das urgências, ou não lhe fosse a adrenalina a sua melhor conselheira. E por isso o ténis andará a par e passo da sua atividade principal, mesmo que tenha de rever os seus objetivos competitivos atuais, como nos disse.
Sara é uma inspiração para outros alunos de Medicina que muitas vezes sentem que não conseguem gerir o seu tempo, mas é também uma inspiração para quem quer desistir diante da adversidade.
Quanto a nós resta-nos desejar que a futura Dra. Sara Neto vá somando vários pontos, sejam eles ou não WTA.
Joana Sousa
Equipa Editorial