Protocolos
Os estágios de Medicina Tropical e as memórias de Cabo Verde
Em 2004 surgiu um projecto inovador, na Faculdade de Medicina da Universidade de Lisboa (FMUL), iniciado e incentivado pelo Prof. Doutor Francisco Antunes, então responsável pela Clínica Universitária de Doenças Infecciosas. Pretendia-se levar alunos da FMUL para hospitais de países Africanos, onde pudessem realizar um estágio clínico durante períodos de quatro ou cinco semanas. Este projecto teve início com alunos do 4º ano e com o Hospital Dr. Agostinho Neto, na Cidade da Praia, Cabo Verde, mas rapidamente se alargou a outros hospitais, em Angola (Hospital Américo Boavida), Moçambique (Hospital Central de Maputo), São Tomé e Príncipe (Hospital Ayres de Meneses) e, mais recentemente, ao Hospital Dr. Baptista de Sousa, no Mindelo, também em Cabo Verde. Até agora, já 134 alunos completaram, com sucesso, esse estágio, chamado Prática Clínica Tutoral (África).
Estes estágios são uma oportunidade única de aprendizagem, onde os alunos têm a possibilidade de experimentar outras perspectivas da Medicina. Durante algumas semanas, têm oportunidade de contactar com realidades diferentes, onde os recursos humanos, médicos e tecnológicos são muito diferentes, onde a avaliação clínica do doente ainda é mais importante e a escolha de exames complementares de diagnóstico é mais criteriosa.
Nos primeiros dias de estágio, que o Prof. Thomas Hanscheid (Instituto de Microbiologia) e eu temos acompanhado, para além da distribuição pelos tutores e pelos serviços hospitalares, os alunos são expostos a uma cultura diferente, talvez até a uma língua diferente. O clima, as montanhas "verde suculento", as praias, os sorrisos permanentes na cara de quem tem tão pouco, ajudam à rápida integração, apoiada por um enorme entusiasmo e vontade de conhecer novas realidades. Neste curto período, os alunos aprendem Medicina mas aprendem, sobretudo, como é o mundo para além das fronteiras da FMUL. E eu tenho o privilégio de poder participar nesta já longa aventura.
Aproveito para deixar aqui um enorme agradecimento às centenas de profissionais de saúde, em quatro países diferentes, que acompanharam, ajudaram e ensinaram os nossos alunos desde há 15 anos. E ninguém melhor que um dos 134 alunos para descrever a experiência médica e pessoal vivida em Cabo Verde.
Emília Valadas
Professora, Doenças Infecciosas
Clínica Universitária de Doenças Infecciosas e Parasitárias
Testemunhos:
“O estágio de Medicina Tropical em Cabo Verde foi sem dúvida uma experiência inesquecível e uma oportunidade única de crescimento pessoal e académico. Neste pude ganhar mais confiança na realização da anamnese e exame objetivo, além de praticar suturas e outros gestos clínicos sob orientação de tutores extremamente disponíveis e interessados em ensinar-nos. Para além disso, permitiu-me consciencializar para a necessidade de uma prática clínica humana e com boa gestão dos recursos disponíveis”.
Ana Silva (2018)
"Cabo Verde foi uma oportunidade de crescimento numa vertente humana e médica. Tivemos, desde o primeiro dia, a possibilidade de contactar em primeira mão com um sistema nacional de saúde e uma população diferente das enfermarias portuguesas, e com todas as oportunidades de aprendizagem e desafios intrínsecos a esta realidade. Senti, que ao longo desta experiência, ganhei autonomia, e uma nova perspetiva, graças a todos os médicos e enfermeiros com quem tive o prazer de aprender".
Telma Pais (2018)
"Volvidos 2 meses do nosso regresso de Cabo Verde, reflicto com “sodade”, daquele tempo que passou tão apressado. Contidas e expectantes, aterrámos na noite escura do dia 14 de Agosto na cidade da Praia. Mal sabíamos as 1001 aventuras que nos esperariam e a luz que aquele país traria às nossas vidas. Além do aprendizado médico, a experiência humana que vivemos deixou marcas que terão, certamente, influência na nossa caminhada pessoal e profissional".
Ivânia Soares (2018)
"O Estágio de Medicina Tropical em Cabo Verde marcou-me de uma forma inigualável, tanto pela magia deste país tão especial como pelo estágio propriamente dito. Aqui tive oportunidade de evoluir enquanto estudante de medicina, praticando mais a colheita de história clínica e exame objetivo do que alguma vez fiz em Portugal, e principalmente enquanto pessoa, tendo aprendido o valor do empenho e de fazer tanto quando se tem tão pouco, o valor da humildade e de saber trabalhar sempre com o objetivo de melhorar, o valor da generosidade e muito mais do que sei dizer".
Rita Carvalho (2018)
"Cabo Verde representa um mistério. Este enigma corre nas veias dos seus habitantes, nasce do solo e floresce no espírito. A cada passo que damos neste arquipélago de sonhos, semeamos um bocado de nós mesmos com as sementes da sua cultura. A mudança pode ser impercetível a princípio, mas as suas raízes são profundas, crescendo com o sustento do coração. O paradoxo encontra-se precisamente aqui: quem deixa Cabo Verde é mais leve do que quem chega, apesar de voltar com a alma carregada.
Sábios são os cabo-verdianos, que ouvidos possuem para ouvir as canções da terra e pernas para dançar os compassos da vida. Pois, compreendendo a incapacidade de descreverem o amor particular que lhes batia no peito com o léxico português, procederam à criação de uma nova palavra: Morabeza. Nenhum dicionário jamais capturará em suas páginas o significado de Morabeza, porque apenas quem sente Cabo Verde conseguirá entendê-la totalmente. Morabeza é no coração e no sorriso leveza, são os olhos prontos para ver a beleza, é carregar no peito a certeza de que o amor lava todas as impurezas e deixa apenas a gentileza.
Penso ser desnecessário descrever o quanto esta viagem me marcou, tanto como estudante de medicina quanto como ser humano. As experiências que levei comigo de Cabo Verde são para mim mais valiosas do que qualquer tesouro, mais preciosas do que qualquer joia. E assim irei carregá-las para sempre, sabendo mesmo nas horas mais difíceis que a minha alma sabe falar e ouvir o crioulo comum a todos nós".
Erik Dornelles (2016)
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