Reportagem / Perfil
Mário Simões - Num estado ampliado de consciência
“Aquele retrato chama-se “Mitos Pessoais”. É uma sala Manuelina onde estou e venho de uma com luz, vou para outra com mais luz ainda. Vou acompanhado pelo meu totem, o animal que mais aprecio, a águia. Na mão levo um bastão que me ajuda a caminhar, mas que ajuda também a defender-me e serve para apontar o caminho. E eu venho por uma sala onde as lajes estão todas muito organizadas e onde estão marcados séculos, supostamente eu teria passado por aqueles séculos, uma ou outra vez como viajante do futuro e depois voltasse a um século passado. Possivelmente, eu próprio já viajei no tempo. E aqui à minha frente está tudo desorganizado, as lajes das minhas pegadas estão desalinhadas … o passado, aquilo que se sucedeu na vida, está “precipitado”. Houve uma consciência que precipitou um potencial de sucessos e já não pode ser alterado (Na Física Quântica, o Fenómeno da Dupla Fenda mostra que se, há uma consciência que precipitou um fenómeno, ele já não pode ser alterado, é precipitado como partícula). Caminho para um lugar que ainda não se sabe o que é, mas estou numa sala onde as paredes desaparecem e se vê um céu estrelado, esta sala seria o planeta Terra. A sala simboliza o planeta onde estou a fazer experiências de vida. Neste céu algo invoca uma constelação, Orion, e as “3 Marias” que estão lá no seu cinturão e que em algumas tradições correspondem às pirâmides do Egipto ou ao cinturão de um rapaz chamado Orion. Este seria um rapaz de aldeia, caçador e que desconhecia algumas regras que lhe queriam impor, vive em contacto com a natureza e tem o sentido da descoberta. Estão aqui muitos mitos pessoais que me dizem respeito”.
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É assim que se apresenta Mário Simões, num quadro pintado por Margarida Cepêda.
Recebe-me no seu Laboratório LIMMIT - Laboratório Interação Mente-Matéria de Intenção Terapêutica – financiado pela Fundação Bial em 2012, mas que inicia a sua atividade em 2015, quando lhe foi cedido um espaço. É um laboratório de investigação científica, que se dedica às ciências da consciência, nomeadamente da interação mente-matéria. O LIMMIT habita dentro da Faculdade que é a sua de formação e profissão.
Professor Auxiliar com Agregação na Área Disciplinar de Psiquiatria e Saúde Mental, da Faculdade de Medicina da Universidade de Lisboa, Mário Simões deu a sua última aula no passado mês de outubro.
À porta do LIMMIT deixara um post-it, “pode tocar, estou cá dentro”. Anfitrião de excelência recebe com uma humildade invulgar, como se a sua casa fosse mais dos outros que sua, já assim se assumira ao receber os convidados da sua última aula sobre Estados Ampliados da Consciência. Faz a visita guiada a todos os recantos harmoniosamente arrumados, e aproveitados. Explica a razão do logo do LIMMIT que tem inspiração no shen do antigo Egipto e refere os diversos posters que estão na parede e defendem as correntes nas quais acredita. Logo à entrada um agradecimento emoldurado a Luis Portela, grande impulsionador deste financiamento e destas áreas; a máquina de café dada pelo Comendador Nabeiro e as diversas máquinas que, de formas diferentes, refletem os “campos de forças” que cada pessoa emana. Tudo isto fala um pouco de Mário Simões, conceituado médico Psiquiatra que, para além de Professor e investigador, também exerceu atividade como Assistente Hospitalar Graduado do Hospital de Santa Maria, sem nunca deixar a Psiquiatra e Psicoterapia no privado.
Apaixonou muitos anónimos com temas ligados à hipnose, mostrando que as viagens ao subconsciente poderiam revelar histórias impensáveis de cada ser humano. Foi tema de grandes reportagens televisivas, um caso de popularidade e controvérsia. Pelo percurso teve tantos pacientes à sua procura que teve de recusar primeiras consultas, entre listas de espera longas de pessoas que o queriam ouvir, foi investigando e escrevendo, os seus 5 livros refletem esse trabalho e o pensamento.
Nasceu a 24 de Outubro de 1948 e apesar de lisboeta de nascimento, a sua terra adotiva foi sempre a Figueira da Foz, onde passou a sua infância e adolescência. Aluno de liceu e a viver sempre junto ao mar ficava apaixonado a ver o porto de navios, onde via e sabia de cor o nome de todos os barcos que chegavam e partiam. Do sonho de ser Engenheiro naval, por inspiração à terra, e aos estaleiros que lhe eram vizinhos, diz que recebeu o seu primeiro sinal de que o universo tinha para ele intenções que nem o próprio planeara. Foi ao chumbar na prova de desenho geométrico, apesar de bom aluno a todas as outras cadeiras, que percebeu que não poderia ser Engenheiro de coisa alguma. Ouvindo quem estava à sua volta e dentro do universo das ciências entendeu então que seguiria Medicina. Entrou em Coimbra, em Medicina e aí ficou até ao 3º ano, altura em que diz ter recebido outro sinal. Ao estudar Anatomia e tendo de dissecar a mão humana no exame respetivo, algo correu mal e sentiu que não se identificava com aquele caminho. Então e se fosse “cirurgião da mente” e assim não teria de fazer operações? Pensou. Interessou-se pela Psicologia e começou a olhar mais para ela. Mas a saída de Coimbra era-lhe inevitável com a crise académica e desacordo com algumas correntes ideológicas estudantis.
Diante dos seus atuais 70 anos fala com um fascínio expresso no rosto quando descreve que encontrou em Lisboa, na Faculdade de Medicina, os seus mestres, Barahona Fernandes, Tomé Vilar, Ducla Soares, Belo Moraes, Almeida Lima ou Fernando Pádua. As notas melhoravam exponencialmente e destaca-se, particularmente, nas áreas da Neurologia e Psiquiatria e Clínica Médica. Foi no final do 6º ano que, através do assistente de Psiquiatria Carlos Alcântara, foi aprendendo, na biblioteca do Hospital Júlio de Matos, as primeiras técnicas da hipnose. Afirma que “voar na mente” foi o seu grande desafio, já que a imaginação não se trava em regras ou limites. Mas nos idos de 73 e apesar de se praticar hipnose, ela era pouco praticada e consensual.
Seguiu-se o estágio clínico onde já se ia afirmando como o “Psiquiatra” do seu grupo e andou por terriolas de Portugal. Nessa altura, decidiu concorrer a bolsas de Psiquiatria no estrangeiro, Suíça, Alemanha e Áustria, foram os destinos escolhidos. Levava uma recomendação do Professor Barahona Fernandes que muito o incentivara a seguir o rumo internacional. A primeira resposta veio da Suíça, mas na verdade, tempos depois, seguiram-se outras respostas positivas, todas às quais se tinha candidatado. Voltemos à Suíça, onde lhe propuseram a Clínica Burghölzli, em Zurique, onde estiveram o pai e filho Eugen e Manfred Bleuler (ligados ao diagnóstico da Esquizofrenia) e Carl Jung. Durante dois anos, Mário Simões dedicou-se à sua tese sobre o processo de adaptação dos emigrantes portugueses, justificando que aqueles que emigraram mostraram ser os mais corajosos (risk taking) e adaptáveis a qualquer meio, sobrevivendo a “quase tudo”. Foi esta sua tese que viria a dar equivalência em Portugal à tese de mestrado em Psiquiatria.
Mas a Suíça não lhe permitiu apenas saber da resiliência dos emigrantes portugueses, fez com que contactasse com pessoas que investigavam psicofármacos e sobre os estados alterados da consciência, muito próximos ao estudo da hipnose. De volta ao país trazia consigo estas novas investigações dos estados alterados da consciência, com recurso ao uso de plantas (cogumelos, cactos e fungos, respetivamente psilocibina, mescalina e LSD) que recriassem o modelo da psicose, doença clássica conhecida por esquizofrenia.
Seguiu-se novo estudo na Alemanha, em Freiburg, onde aperfeiçoou o conhecimento na Parapsicologia Científica ou de Laboratório. E lá estudou os fenómenos de Poltergeist e outros, como os de transferência de informação de modo paranormal.
Com a outra bolsa que tinha recebido, em simultâneo com as anteriores, foi para a Áustria. Em Viena contactou com a Psicanálise e com a Logoterapia. Esta foi-lhe transmitida por Viktor Frankl com quem ainda teve aulas na Universidade.
Desde há 40 anos que faz hipnose, publicando papers e mantendo investigações paralelas que façam ter múltiplas janelas abertas para olhar o subconsciente dos outros e para o seu. Ainda não tem prova de tudo aquilo em que acredita, sabe que, no meio onde se move, é olhado com desconfiança e alguma benevolência associada de um distanciamento que muitas vezes o tentou desacreditar intelectualmente. Devagar, discretamente, em pés de lã e com o coração aberto aos outros, como se caracteriza, foi traçando o seu percurso e escrevendo na história académica e clínica tudo aquilo que quis. E aprovado, ou não, pelos seus pares, facto é que na sua última aula muitos ficaram à porta por já não haver mais lugar para o ouvir falar sobre os Estados Ampliados de Consciência e que acabou com aplauso intenso, prolongado e de pé.
Porque é que é importante alterar a consciência do ser humano? Para poder entrar mais a fundo no ego da pessoa?
Mário Simões: A pessoa está num estado de vigília que lhe permite que as áreas ativas do seu cérebro sirvam para que façam a manutenção da vida, planeando e organizando. Nestes estados alterados ou melhor, modificados, passamos a uma vigília diferenciada, continuamos acordados, mas permite que outras áreas fiquem a funcionar e que geralmente, sendo áreas associativas, não estão a trabalhar. Isso consegue-se fechando os olhos e relaxando, com a hipnose que funciona apenas com a palavra e assim temos acesso a uma totalidade da vida psíquica momentânea, refletida na palavra e símbolo AUM (palavra hindu).
E lá está tudo. Vamos ter acesso à realidade fora de nós, acesso aos pensamentos e que só quando falamos deles eles se difundem; vamos aceder aos sonhos sempre muito fechados e acesso a algo que tem um véu que só é rompido quando se altera a consciência.
E esse estado de relaxamento pode ser induzido pelas tais plantas que me falava ainda há pouco?
Mário Simões: Plantas, música, pelo batuque comum - só som, pela frequência de um som que pode funcionar como frequência curativa, como na meloterapia. Tantas formas. Rompendo o tal véu que todos temos (no topo da imagem do AUM e onde parece haver uma estrela), só aí chegamos ao mundo espiritual. Mas esta espiritualidade diz respeito à dimensão humana e não a algo estranho, ou assustador. Vem desde os nossos primórdios, quando se utilizavam as antas e dólmens e que diz respeito à crença de uma outra vida, ou ao contacto com seres que já cá não estão; ou até àqueles que não são humanos e assumem outras dimensões. A questão é que tudo isto faz apelo a temas que não são tão habituais no Ocidente. Encontrávamos estas ideias nas ditas sociedades primitivas, que na verdade de primitivas tinham pouco; já no seu tempo tinham os seus médicos ou xamãs que os punham em contacto com estas dimensões. O Ocidente chama a esta dimensão de alma, ou de espírito, nestas sociedades étnicas.
Falava ainda há pouco do caso de Poltergeist e contava-me que houve um caso em Portugal que estudou. Será que a dificuldade de afirmar estes estudos como evidências científicas está no facto de não haver repetição continuada de fenómenos e “à hora marcada”?
Mário Simões: Este tipo de fenómenos chamados paranormais têm algo problemático, porque são de difícil reprodução. A Ciência exige reprodutibilidade nas mesmas condições para criar leis, mas os fenómenos paranormais são geralmente excecionais, o que não quer dizer que não existam, apenas não se manifestam com a mesma regularidade. Então, o que vamos conseguir em laboratório é ter dados que nos dizem que ultrapassam aquilo que seria esperar pelo acaso, são fenómenos muito bem controlados e onde na verdade se exclui o truque, ou a simulação. São fenómenos que a maior parte dos casos têm grande probabilidade de serem reproduzidos em laboratório, mas não sempre, embora ultrapassem o acaso. A telepatia, transferência de pensamento, a captação de informação sobre o futuro durante um sonho, entre outros, existem mas não se mantêm sempre. E eles têm uma característica muito estranha, quanto mais se tentam “agarrar”, mais eles nos escapam. É por isso que, dada a dificuldade de reprodutibilidade em laboratório, não se pode considerar ainda como se fosse uma Ciência, mas sim uma disciplina científica que utiliza metodologia de outras ciências, cujos fenómenos estudados não têm uma matéria só.
Também estudou Antropologia. Ela vem ajudar a explicar algumas destas questões menos palpáveis?
Mário Simões: Vem sim. Após acabar Medicina percebi que estes fenómenos tinham maior explicação antropológica e que eram fundamentadas com explicações animistas, ou seja ligadas à alma. Questionava-me como é que eles explicavam a doença, por exemplo. E fui estudar e ler. Percebi que eu próprio encontrava mais fundamentos aqui para explicar os tais fenómenos. Se não me explicou, pelo menos, fez-me compreender uma fenomenologia que eu via na Psiquiatria, quando observava pessoas delirantes. O delírio mostra-nos casos de pessoas que não se conseguem argumentar pela lógica e, como tal, não percebem o certo ou errado. Não aceitam a nossa argumentação e justificam tudo o que sabem pelas vozes que ouvem, eles vivem neste mundo e acreditam nele. Então pensei que tinha de entrar mais nestes mundos para os tentar ajudar. Por isso decidi ser Psiquiatra.
Deixe-me voltar à imagem do AUM e do véu e que volta a encaixar nestes exemplos clínicos que nos dá. Porque é que quer passar o véu e chegar ao espiritual da pessoa? Para a ajudar de forma mais eficaz?
Mário Simões: Por duas motivações. A primeira porque tinha de compreender esse mundo e só estando perto dos doentes é que os podia ajudar.
A segunda, por uma busca pessoal de uma dimensão espiritual.
Estas pessoas não devem ser olhadas como loucas, por terem delírios?
Mário Simões: Não. Cada vez mais as pessoas referem o acesso a este tipo de fenómenos do paranormal. Hoje, há muitos estudos que dizem que ouvir vozes, ou crer em certos pensamentos, com esquemas múltiplos de raciocínio, não torna a pessoa louca, ou fanática. Veja o Daesh, não são doentes, eles querem, além de outras coisas, impor na Península Ibérica o califado, ora isso não é uma doença senão, desculpá-los-ia, eventualmente considerados inimputáveis, têm é ideias sobrevalorizadas. Ou casos de pessoas que ouvem vozes e sentem um apelo por qualquer coisa, até por uma via religiosa. Todos estes seriam doentes?
Peguemos no tema da Religião. Ela é uma inimiga destas investigações dos fenómenos paranormais, não é?
Mário Simões: Geralmente, sim. Porque estas convicções põem em causa dogmas e uma autoridade que não era questionada e parece-me que têm um certo receio de perder o poder e que se abalem alguns fundamentos. Enquanto as religiões do Ocidente dizem que a vida é um vale de lágrimas pelo qual se tem que passar, o Oriente justifica tudo com um karma, ou seja, o que se fez de errado em vidas passadas, pagam-se nesta vida. Assim se vê que a Religião tem sempre resposta para tudo. A Ciência vem tentar perceber e dizer que há outras respostas possíveis.
Mas também não podemos dizer que a Ciência seja uma aliada destas investigações que defende… Perante as suas descrições dos estados ampliados da consciência há provavelmente alguns olhares como se falasse de feitiçaria.
Mário Simões: É verdade, muitos olham para isso assim. Estamos quase num domínio do realismo fantástico. Ou seja, falamos de situações que existem e que se verificam, que se levam para o laboratório, que muitas vezes não atingimos os 100%, mas que ultrapassam o acaso. Mas não há o racional, a explicação para isso. E a Ciência precisa do racional. Eu diria que a última fronteira ultrapassada foi a aceitação da acupunctura. Agora… continuamos ainda à procura da razão destes fenómenos paranormais existirem e para que servem. Mas não há dúvidas que existem! E quem contesta é porque não está minimamente informado.
Ou porque pode ter medo?
Mário Simões: Há quem tenha medo, de certo modo. Tudo isto abala a nossa conceção do mundo. Para tudo o que acontece nós temos de ter uma causa tangível, tocada. Repare como estamos sempre à procura da causa de tudo. Carl Jung tornou-se “maldito” porque, ao afastar-se de Freud, queria explicar que não há só uma forma de explicarmos a causa das coisas, há várias. Ele veio, por exemplo, falar de uma circunstância para a qual se achava tudo muito estranho, a Sincronicidade. Um exemplo, estou a pensar que me vou encontrar consigo, só que não sei em que gabinete está, mas vou andando e levo o pensamento dentro de mim; pelo caminho encontro uma pessoa que não conheço e pergunto-lhe “sabe onde trabalha a Joana?” e ela diz-me “então não sei, está mesmo ao meu lado”. Isto é uma sincronicidade. Parece haver aqui uma relação causal. Jung explica, que algo que está dentro de mim (informação que busco) e da outra pessoa (informação que possui) que, não sabendo nada do que penso, coincide comigo e nos une. Mas qual é a razão? Não há, é só o sentido por si só.
O problema é esse. Não havendo uma razão, refuta-se…
Mário Simões: A Ciência, bem como o ser humano, tem a necessidade de querer controlar a razão das coisas. Uma criança que bate com a cabeça numa janela que já estava aberta, reage a bater de volta nessa mesma janela. Teve necessidade de fazer uma atribuição de causalidade, neste caso de intenção de o querer magoar. Nós, ao longo da vida, vamos vivendo com essa atitude. Porque no nosso pensamento se nos acontece algo, então, é porque há uma causa ou culpa. E a Ciência impõe esta situação causal.
Por causalidade, faz-se lembrar uma frase muito provocatória de Peter Atkins (Químico, professor jubilado da Universidade de Oxford e autor de vários livros) que diz “Quando a Ciência explicar a origem do universo, Deus já não é necessário”.
Mário Simões: (Dá uma gargalhada) Quando tivermos essa resposta, se calhar surgirá uma nova pergunta como, “então e quem criou a primeira ideia de criar o Universo?”. Sempre que tenhamos uma resposta, haverá necessidade do ser humano para uma nova proposta de investigação. Não acabará aí. Chegamos sempre a um ponto em que perguntamos “e agora?”. Por isso acho que existirá sempre o mistério para que a seguir venha a necessidade humana de tentar perceber o porquê. Sabe que eu penso que, se não alterarmos a nossa consciência ordinária, a lógica pára aqui…. Nós, só pela razão, chegamos a um ponto em que paramos. A própria Ciência, em geral e dentro da minha área em especial, não trouxe quase nada de novo nos últimos anos, salvo em tecnologia. Como diz o Luis Portela e muitos outros autores, será que trazemos memórias extra-cerebrais e que isso possa ser um novo caminho de explicações?
Dê-me um exemplo de memória extra-cerebral.
Mário Simões: Uma criança que não se sente integrada na família onde nasceu e que tem memórias de outros tempos, outros contextos e que depois de se ir confirmar e estudar o assunto, verificam-se essas mesmas histórias, mesmo quando ocorreram a milhares de quilómetros de distância. Ou seja, são as memórias que não dizem respeito a este cérebro que adquirimos. Foi Ian Stevenson, um colega meu, que estudou casos destes de crianças. E elas contavam histórias completamente diferentes dos seus contextos reais e sem terem nunca lá estado e foram confirmadas.
Mas também podemos assumir como hipótese que essas pessoas, adultos ou crianças, estejam apenas a imaginar.
Mário Simões: Mas então têm uma imaginação que ultrapassa tudo o que nós temos hoje de conhecimento sobre a imaginação. E que é conhecer algo que não passou ainda pela sua mente. É uma riqueza de pormenores que fazem ultrapassar aquilo que viria só pela imaginação. Estas crianças apresentam informação que não residia naquele seu cérebro. E então aí começamos a pensar, será que a nossa consciência não é um produto do cérebro? E que a nossa vida mental utiliza o cérebro para se exprimir, sendo ele quase um sistema operativo?
Quer dizer que existe uma energia muito superior àquilo que é o nosso físico?
Mário Simões: É a energia, consciência ou instância que utiliza o meu corpo para se exprimir e captar mais informação e mais informação paranormal e que é isso que permite captar algumas situações futuras não previsíveis de modo natural, ou antecipar um acontecimento. Põe-se esta hipótese. E claro que no somatório de todas estas hipóteses acabam por colocar em causa os fundamentos da Ciência de que a matéria é que produz vida mental. Depois outras correntes dizem que é a consciência que é suscetível de alterar a matéria. Eu prefiro defender a interação entre mente e matérias e não um contra o outro. Considero-me um dualista pragmático. Por isso é que este Laboratório se chama LIMMIT, pela intenção terapêutica da junção dos dois.
Professor, como é que os seus pares olham para si?
Mário Simões: Como alguém peculiar. Alguns estão comigo nesta via de pensamento, mas muito poucos. São muito poucos…
Sente-se sozinho?
Mário Simões: Bastante. Especialmente quando passamos para um nível universitário. Embora lhe deva dizer que nesta Faculdade há muitos simpatizantes da causa, mas que não a assumem. (Sorri) Conversamos em privado e em casa, mas depois formalmente não a assumem, preferindo ter uma postura de acordo com os paradigmas da Ciência ocidental. E por isso sinto-me sozinho quando tenho de afirmar estas convicções em estudos. Agora pergunta-me como é que me fui assumindo na minha carreira? Tentei afirmar desde cedo, no meio científico, as minhas convicções e sei que causei alguns risos na tentativa de ridicularização. Mas nunca me opus a ninguém, nem fui militante dos meus ideais. Muitas vezes me calei e deixai passar os assuntos e, tornando-me inofensivo, fui fazendo o meu mestrado, depois o doutoramento, depois a agregação. Sempre a sorrir de forma benevolente e aceitando as diferenças dos outros. Mas atenção, quando alguém me diz no nosso meio “Mário eu sei pouco disso, mas não há fundamento”, eu aí reajo e replico, “Quem sabe pouco sou eu, o colega disto não sabe nada, porque soubesse algo aceitaria a existência dos fenómenos”.
Ao longo destes anos os alunos mostraram-lhe interesse por estas matérias?
Mário Simões: Com os alunos, deixe-me dizer-lhe que, há um interesse muito forte. O Prof. Martins e Silva, antigo Diretor desta casa, foi quem me deu a maior abertura para os cursos mais variados. Foi aí que surgiu o curso de Hipnose Clínica. Tive mais de 500 alunos a interessar-se por estas matérias, alguns já licenciados e que voltavam. Cheguei a ter um Curso de Terapia regressiva, chamando-lhe, mais adequadamente Terapia pela reestruturação vivencial e cognitiva e na verdade nunca falei em terapia das vidas passadas. Vieram pessoas das mais diversas áreas e os cursos estiveram a funcionar durante anos. Nos últimos tempos ficou apenas a Hipnose clínica e experimental e depois na cadeira de opção de Introdução às ciências da consciência tive sempre entre 10 a 15% dos alunos totais do curso.
Mesmo no final da sua última aula deve ter reparado nas inúmeras pessoas que pôs a chorar, numa longa ovação de pé.
Mário Simões: Não estava à espera de ver a sala tão cheia e não esperava aquele aplauso intenso e com as pessoas levantadas. Parecia que não acabava. Olhei e vi grande emoção em muitos dos que foram meus alunos, uns mais velhos, outros muito recentes e então senti que deixei alguma coisa, alguma mensagem. Deixei algo que ainda não é o mainstream, mas quem sabe possa vir a ser.
No momento em que colocou o seu último slide, citou Galileu – eppur si muove. Estaria a dizer que, como Galileu, muitos anos depois de defender o heliocentrismo e de ter sido queimado pela inquisição que o acusava de feitiçaria, o Professor, daqui por muitos anos, também verá as suas convicções afirmadas e defendidas socialmente, cientificamente?
Mário Simões: (Emociona-se) sabe que o Papa João Paulo II pediu desculpa em nome da Igreja… Eu quis dizer duas coisas, que vou andar por aqui a estudar sobre estas matérias. E outra coisa, é que sabendo eu que me veem como um lunático que acredita nestes temas ditos pouco sérios, acho que um dia tudo isto vai ser comprovado.
Mário Simões manterá funções na Faculdade, como Diretor do LIMMIT, até dezembro de 2019 onde continuará a orientar ou coorientar 14 teses de doutoramento. Até lá, manter-se-á no seu espaço, o LIMMIT, esperando que surja o seguidor perfeito para dar continuidade ao seu projeto.
No final da entrevista o Professor negou a mão estendida em forma de despedida e pediu que a trocássemos por um abraço. Ensinou-me que os abraços deveriam juntar sempre o lado esquerdo de duas pessoas que se unem, para manter perto os corações.
Então até breve, Professor!
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Joana Sousa
Equipa Editorial