Espaço Ciência
Fármacos anti-sarampo – uma investigação liderada por Miguel Castanho
Depois de muitas décadas controlado e praticamente esquecido, em resultado de políticas rigorosas de vacinação, o sarampo tem ressurgido e feito vítimas mortais. Este é também o caso de Portugal, onde se têm verificado ultimamente vários casos de sarampo. Recordemos que o sarampo é um dos vírus mais infeciosos que se conhece. A causa do seu ressurgimento prende-se sobretudo com ideologias anti-vacinação, que têm levado ao aparecimento de populações não vacinadas, que o vírus pode infetar e a partir da qual pode alastrar. Os bebés abaixo da idade de vacinação ficam particularmente expostos aos vírus circulantes. As correntes anti-vacinação têm levantado enorme polémica, com repercussões assinaláveis no domínio da saúde pública. O efeito prático é que, hoje em dia, surgiu a necessidade inédita de medicamentos para tratar e fazer a profilaxia do sarampo.
Um estudo agora publicado debruça-se sobre moléculas que conseguem estes dois papéis em modelos animais da doença. A equipa do iMM/FMUL liderada pelo investigador e professor Miguel Castanho descobriu que um conjunto de moléculas de natureza mista entre proteína e lípido têm a capacidade de se organizar formando estruturas "inteligentes" que se ligam entre si ou desligam consoante estão, ou não, na presença do vírus do sarampo. O efeito final resulta na incapacidade destes infetarem células. Esta correlação direta entre acontecimentos microscópicos, ao nível molecular, e efeito farmacológico foi, nas palavras de Miguel Castanho “muito difícil de ser alcançado e exigiu o uso de técnicas bastante sofisticadas com recurso a conhecimento especializado”.
O estudo foi desenvolvido no iMM/FMUL e contou com a colaboração de investigadores do Centro Médico da Universidade de Columbia, em Nova Iorque. Um grupo do Instituto de Tecnologia Química e Biológica António Xavier (ITQB-UNL) fez ainda estudos de simulação computacional da molécula. O artigo desta investigação foi publicado na ACS Nano, uma revista publicada pela American Chemical Society, a maior sociedade científica de química do mundo.
Transmitido por contacto direto com as gotículas infeciosas, ou por propagação no ar quando a pessoa infetada tosse ou espirra, o vírus do sarampo é altamente contagioso e voltou a ser motivo de alarme quando já se considerava, por dados da Organização Mundial da Saúde (OMS), que Portugal estava livre desta epidemia desde 2016.
A Direção-Geral de Saúde (DGS) tem emitido recentemente alertas sobre o sarampo, recomendando que os cidadãos em território português verifiquem os boletins de vacinas e que, caso seja necessário, se vacinem contra este vírus.
Os sintomas de sarampo aparecem geralmente entre 10 a 12 dias depois da infeção e começam habitualmente com febre, erupção cutânea, tosse, conjuntivite e corrimento nasal. Os doentes são considerados contagiosos desde quatro dias antes até quatro dias depois do aparecimento da erupção cutânea que caracteriza esta infeção.
Com dois surtos simultâneos em 2017, o sarampo voltou em força para Portugal e infetou quase 30 pessoas, causando a morte a uma jovem.
Segundo os dados da DGS relativos a 2017, mais de 87% das pessoas que contraíram sarampo não estavam vacinadas.
Portugal não está isolado nestas estatísticas; de acordo com a Organização Mundial de Saúde e num relatório sobre a região europeia, só no primeiro semestre de 2018 atingiu-se o recorde de casos de sarampo na Europa. O recorde anual tinha sido registado no ano passado, quando foram contabilizados 23 mil casos num ano inteiro.
Quer a OMS como a DGS são consensuais, diante deste vírus “extremamente contagioso” afirmando que a única solução eficaz é a vacinação.
A vacina contra o sarampo faz parte do Programa Nacional de Vacinação e deve ser administrada aos 12 meses e aos cinco anos.