Espaço Ciência
Ligação Entre Progressão da Aterosesclerose e Perturbações Ósseas na Artrite Reumatóide
Os pacientes com doenças reumáticas inflamatórias morrem prematuramente, sobretudo de doença cardiovascular (CV). A aterosclerose, principal determinante da morbidade e mortalidade por CV, ocorre prematuramente em pacientes com Artrite Reumatóide (AR). [1].
Estes pacientes têm quase o dobro de episódios cardiovasculares que o resto da população, que contribuem para cerca de 40% das causas de morte nestes doentes [2, 3]. Por si só, este facto parece ser uma consequência da doença, reforçado por um aumento da prevalência de alguns factores de risco de CV [3-5].
A aterosclerose é uma doença inflamatória caracterizada pela acumulação de lípidos nos macrófagos infiltrados dentro da parede arterial provocando o seu espessamento [6]. A patogénese da aterosclerose inclui disfunção endotelial, edema intimal, formação de células espuma e migração de leucócitos e macrófagos, culminando na ruptura de uma placa e subsequente formação de trombos. [7]. A calcificação vascular, um processo controlado durante o qual os minerais são ectopicamente depositados nos vasos sanguíneos, é um marcador substituto para a aterosclerose e aumento de risco vascular. Pacientes com AR têm prevalência acrescida de calcificação vascular [8].
Existem várias características comuns entre o metabolismo ósseo e a aterosclerose, tais como o sistema RANK/RANKL/OPG, a via de sinalização Wnt ou as citoquinas pró-inflamatórias, como a interleucina (IL)-6 [9-11].
Tendo em consideração os dados actuais, a hipótese que avançamos é que, no caso de AR, as perturbações ósseas e vasculares têm mecanismos fisiopatológicos comuns, havendo ligação entre a progressão de ambas as condições.
Assim, o principal objectivo deste estudo é testar a associação entre o avanço da aterosclerose e as perturbações ósseas no contexto da AR e os efeitos do bloqueio das citoquinas na progressão da aterosclerose subclínica e perturbações ósseas.
De forma a atingirmos os nossos objectivos, iremos testar a associação entre a progressão de aterosclerose subclínica e os distúrbios metabólicos, estruturais e mecânicos do osso num modelo animal de artrite e aterosclerose. Depois testaremos o efeito do bloqueio de citoquinas na progressão de ambas as condições. Além disso, pretendemos avaliar a expressão de genes relacionados com a inflamação e de genes relacionados com o osso expressos em placas ateroscleróticas humanas e a sua correlação com marcadores séricos de inflamação e remodelação óssea.
Será produzido um modelo de ratinho com artrite e aterosclerose ministrando uma dieta à base de gordura aos ratinhos K/BxAg7, tal como descrito por Rose S. e colegas [12]. O modelo de ratinhos K/BxAg7 é um modelo de artrite que produz artrite inflamatória grave e expressa o receptor transgénico de células T (TCR) KRN e o complexo MHC de classe II alelo Ag7. ApoE-/- (um modelo de ratinho de aterosclerose espontânea) alimentado com dieta rica em gordura. Ratinhos K/Bx Ag7 alimentados com dieta padrão e ratinhos C57BL/6J alimentados com dieta rica em gordura serão utilizados como grupos de controlo. Usaremos 10 ratinhos (2 grupos de 5) de cada grupo. Os ratinhos iniciarão a dieta rica em gordura às 10 semanas de idade e serão eutanizados em vários momentos temporais (2, 4, 5, 6, 7 meses) a fim de acompanhar a progressão de ambas as doenças. A amostra de sangue será recolhida imediatamente para análise de biomarcadores séricos. As aortas serão removidas para quantificação de lesão aterosclerótica e também para histologia convencional. Utilizaremos igualmente as aortas para extracção de RNA e análise da expressão genética. Os ossos serão removidos para análise mecânica e estrutural e extracção de RNA.
A amostra de conveniência constituída por todos os pacientes consecutivos que serão submetidos a endarterectomia nos departamentos de Cirurgia Vascular do Hospital de Santa Maria (HSM) durante dois anos será analisada e esperamos recrutar 80 pacientes. Todas as cirurgias serão executadas recorrendo a técnicas cirúrgicas padrão e manipulação mínima da amostra. O estudo será realizado em conformidade com as normas relativas aos ensaios clínicos, como a Declaração de Helsínquia modificada em Edimburgo (2000), e aprovado pelas comissões de ética do HSM e HGO. Todos os pacientes assinarão um consentimento informado. Obteremos as placas ateroscleróticas carotídeas para análise da expressão genética, histologia e análise imuno-histoquímica. Recolheremos igualmente uma amostra de sangue de cada paciente para análise de biomarcadores séricos. Os pacientes serão igualmente submetidos a uma densitometria óssea por absorção de raios-X de dupla energia ((DXA) antes da intervenção cirúrgica.
A identificação de mecanismos comuns entre a evolução da aterosclerose e perturbações ósseas contribui para o conhecimento da fisiopatologia destas doenças. Assim, o presente estudo irá contribuir para a identificação de potenciais alvos para o desenvolvimento de novas estratégias de prevenção e/ou tratamento que visam um melhor controlo destas patologias, frequentemente associadas.
Referências Bibliográficas
1. Santos, M.J. and J.E. Fonseca, Metabolic syndrome, inflammation and atherosclerosis - the role of adipokines in health and in systemic inflammatory rheumatic diseases. Acta Reumatol Port, 2009. 34(4): 590-8.
2. Sidiropoulos, P.I., S.A. Karvounaris, and D.T. Boumpas, Metabolic syndrome in rheumatic diseases: epidemiology, pathophysiology, and clinical implications. Arthritis Res Ther, 2008. 10(3): 207.
3. Santos, M.J., et al., Cardiovascular risk profile in systemic lupus erythematosus and rheumatoid arthritis: a comparative study of female patients. Acta Reumatol Port, 2010. 35(3): 325-32.
4. Santos, M.J., et al., Body composition phenotypes in systemic lupus erythematosus and rheumatoid arthritis: a comparative study of Caucasian female patients. Clin Exp Rheumatol, 2011. 29.
5. Symmons, D.P. and S.E. Gabriel, Epidemiology of CVD in rheumatic disease, with a focus on RA and SLE. Nat Rev Rheumatol, 2011.
6. Hoekstra, M., et al., The peripheral blood mononuclear cell microRNA signature of coronary artery disease. Biochem Biophys Res Commun, 2010. 394(3): 792-7.
7. Hofbauer, L.C., et al., Vascular calcification and osteoporosis--from clinical observation towards molecular understanding. Osteoporos Int, 2007. 18(3): 251-9.
8. Wang, S., et al., Prevalence and extent of calcification over aorta, coronary and carotid arteries in patients with rheumatoid arthritis. J Intern Med, 2009. 266(5): 445-52.
9. Fonseca, J.E., et al., Interleukin-6 as a key player in systemic inflammation and joint destruction. Autoimmun Rev, 2009. 8(7): 538-42.
10. Persy, V. and P. D'Haese, Vascular calcification and bone disease: the calcification paradox. Trends Mol Med, 2009. 15(9): 405-16.
11. Cannata-Andia, J.B., P. Roman-Garcia, and K. Hruska, The connections between vascular calcification and bone health. Nephrol Dial Transplant, 2011. 26(11): 3429-36.
12. Rose, S., et al., A novel mouse model that develops spontaneous arthritis and is predisposed towards atherosclerosis. Ann Rheum Dis, 2013. 72(1): 89-95.
Diana Fernandes
Estudante de Doutoramento
Estes pacientes têm quase o dobro de episódios cardiovasculares que o resto da população, que contribuem para cerca de 40% das causas de morte nestes doentes [2, 3]. Por si só, este facto parece ser uma consequência da doença, reforçado por um aumento da prevalência de alguns factores de risco de CV [3-5].
A aterosclerose é uma doença inflamatória caracterizada pela acumulação de lípidos nos macrófagos infiltrados dentro da parede arterial provocando o seu espessamento [6]. A patogénese da aterosclerose inclui disfunção endotelial, edema intimal, formação de células espuma e migração de leucócitos e macrófagos, culminando na ruptura de uma placa e subsequente formação de trombos. [7]. A calcificação vascular, um processo controlado durante o qual os minerais são ectopicamente depositados nos vasos sanguíneos, é um marcador substituto para a aterosclerose e aumento de risco vascular. Pacientes com AR têm prevalência acrescida de calcificação vascular [8].
Existem várias características comuns entre o metabolismo ósseo e a aterosclerose, tais como o sistema RANK/RANKL/OPG, a via de sinalização Wnt ou as citoquinas pró-inflamatórias, como a interleucina (IL)-6 [9-11].
Tendo em consideração os dados actuais, a hipótese que avançamos é que, no caso de AR, as perturbações ósseas e vasculares têm mecanismos fisiopatológicos comuns, havendo ligação entre a progressão de ambas as condições.
Assim, o principal objectivo deste estudo é testar a associação entre o avanço da aterosclerose e as perturbações ósseas no contexto da AR e os efeitos do bloqueio das citoquinas na progressão da aterosclerose subclínica e perturbações ósseas.
De forma a atingirmos os nossos objectivos, iremos testar a associação entre a progressão de aterosclerose subclínica e os distúrbios metabólicos, estruturais e mecânicos do osso num modelo animal de artrite e aterosclerose. Depois testaremos o efeito do bloqueio de citoquinas na progressão de ambas as condições. Além disso, pretendemos avaliar a expressão de genes relacionados com a inflamação e de genes relacionados com o osso expressos em placas ateroscleróticas humanas e a sua correlação com marcadores séricos de inflamação e remodelação óssea.
Será produzido um modelo de ratinho com artrite e aterosclerose ministrando uma dieta à base de gordura aos ratinhos K/BxAg7, tal como descrito por Rose S. e colegas [12]. O modelo de ratinhos K/BxAg7 é um modelo de artrite que produz artrite inflamatória grave e expressa o receptor transgénico de células T (TCR) KRN e o complexo MHC de classe II alelo Ag7. ApoE-/- (um modelo de ratinho de aterosclerose espontânea) alimentado com dieta rica em gordura. Ratinhos K/Bx Ag7 alimentados com dieta padrão e ratinhos C57BL/6J alimentados com dieta rica em gordura serão utilizados como grupos de controlo. Usaremos 10 ratinhos (2 grupos de 5) de cada grupo. Os ratinhos iniciarão a dieta rica em gordura às 10 semanas de idade e serão eutanizados em vários momentos temporais (2, 4, 5, 6, 7 meses) a fim de acompanhar a progressão de ambas as doenças. A amostra de sangue será recolhida imediatamente para análise de biomarcadores séricos. As aortas serão removidas para quantificação de lesão aterosclerótica e também para histologia convencional. Utilizaremos igualmente as aortas para extracção de RNA e análise da expressão genética. Os ossos serão removidos para análise mecânica e estrutural e extracção de RNA.
A amostra de conveniência constituída por todos os pacientes consecutivos que serão submetidos a endarterectomia nos departamentos de Cirurgia Vascular do Hospital de Santa Maria (HSM) durante dois anos será analisada e esperamos recrutar 80 pacientes. Todas as cirurgias serão executadas recorrendo a técnicas cirúrgicas padrão e manipulação mínima da amostra. O estudo será realizado em conformidade com as normas relativas aos ensaios clínicos, como a Declaração de Helsínquia modificada em Edimburgo (2000), e aprovado pelas comissões de ética do HSM e HGO. Todos os pacientes assinarão um consentimento informado. Obteremos as placas ateroscleróticas carotídeas para análise da expressão genética, histologia e análise imuno-histoquímica. Recolheremos igualmente uma amostra de sangue de cada paciente para análise de biomarcadores séricos. Os pacientes serão igualmente submetidos a uma densitometria óssea por absorção de raios-X de dupla energia ((DXA) antes da intervenção cirúrgica.
A identificação de mecanismos comuns entre a evolução da aterosclerose e perturbações ósseas contribui para o conhecimento da fisiopatologia destas doenças. Assim, o presente estudo irá contribuir para a identificação de potenciais alvos para o desenvolvimento de novas estratégias de prevenção e/ou tratamento que visam um melhor controlo destas patologias, frequentemente associadas.
Referências Bibliográficas
1. Santos, M.J. and J.E. Fonseca, Metabolic syndrome, inflammation and atherosclerosis - the role of adipokines in health and in systemic inflammatory rheumatic diseases. Acta Reumatol Port, 2009. 34(4): 590-8.
2. Sidiropoulos, P.I., S.A. Karvounaris, and D.T. Boumpas, Metabolic syndrome in rheumatic diseases: epidemiology, pathophysiology, and clinical implications. Arthritis Res Ther, 2008. 10(3): 207.
3. Santos, M.J., et al., Cardiovascular risk profile in systemic lupus erythematosus and rheumatoid arthritis: a comparative study of female patients. Acta Reumatol Port, 2010. 35(3): 325-32.
4. Santos, M.J., et al., Body composition phenotypes in systemic lupus erythematosus and rheumatoid arthritis: a comparative study of Caucasian female patients. Clin Exp Rheumatol, 2011. 29.
5. Symmons, D.P. and S.E. Gabriel, Epidemiology of CVD in rheumatic disease, with a focus on RA and SLE. Nat Rev Rheumatol, 2011.
6. Hoekstra, M., et al., The peripheral blood mononuclear cell microRNA signature of coronary artery disease. Biochem Biophys Res Commun, 2010. 394(3): 792-7.
7. Hofbauer, L.C., et al., Vascular calcification and osteoporosis--from clinical observation towards molecular understanding. Osteoporos Int, 2007. 18(3): 251-9.
8. Wang, S., et al., Prevalence and extent of calcification over aorta, coronary and carotid arteries in patients with rheumatoid arthritis. J Intern Med, 2009. 266(5): 445-52.
9. Fonseca, J.E., et al., Interleukin-6 as a key player in systemic inflammation and joint destruction. Autoimmun Rev, 2009. 8(7): 538-42.
10. Persy, V. and P. D'Haese, Vascular calcification and bone disease: the calcification paradox. Trends Mol Med, 2009. 15(9): 405-16.
11. Cannata-Andia, J.B., P. Roman-Garcia, and K. Hruska, The connections between vascular calcification and bone health. Nephrol Dial Transplant, 2011. 26(11): 3429-36.
12. Rose, S., et al., A novel mouse model that develops spontaneous arthritis and is predisposed towards atherosclerosis. Ann Rheum Dis, 2013. 72(1): 89-95.
Diana Fernandes
Estudante de Doutoramento