Reportagem / Perfil
Entrevista com o Professor José Pereira Miguel - Director do Instituto de Medicina Preventiva
A Equipa Editorial da Faculdade de Medicina da Universidade de Lisboa foi entrevistar o Director do Instituto de Medicina Preventiva, o Professor José Pereira Miguel, que nos deu a conhecer este Instituto e todos aqueles que lá trabalham, o que por lá se faz e o que se deseja fazer.
" Pela minha parte, vejo a vida profissional como uma corrida de estafetas: corremos a nossa parte o melhor que podemos, passamos o testemunho em condições, e a corrida segue … desejavelmente, com brilho e êxito." J.P.M.
Newsletter: Caro Professor Pereira Miguel, a Newsletter tem vindo a dar a conhecer melhor a Faculdade aos seus leitores e, nesse sentido, gostaríamos de lhe pedir que nos falasse da génese do Instituto de Medicina Preventiva, quando foi fundado, os seus directores, principais acontecimentos e marcos históricos que gostasse de realçar.
Professor Pereira Miguel: A história da nossa área lectiva remonta ao final do século XIX e a uma disciplina da Escola Médico-Cirúrgica de Lisboa chamada Medicina Legal e Higiene. A Higiene estava ligada à Medicina Legal, por se entender que muitos aspectos da saúde pública eram acautelados pela legislação sanitária. Nessa época, Ricardo Jorge refugia-se em Lisboa. É perseguido e mal tratado no Porto, em consequência das medidas que tomara no combate a um surto de peste bubónica. Era já uma grande personalidade da saúde pública e a Escola, por isso, ofereceu-lhe a cátedra de Higiene, por desdobramento da anterior.
A situação manteve-se assim até à Reforma de 1911, de que estamos agora a comemorar o centenário. Essa reforma, já com a criação da Faculdade de Medicina de Lisboa, contempla uma cadeira de Higiene e um curso de Epidemiologia, também da responsabilidade do Professor Ricardo Jorge.
Ao longo do século XX há várias reformas do ensino e esta área curricular recebe sucessivamente as designações de Higiene e Epidemiologia, Higiene e Medicina Social e, mais tarde, após o 25 de Abril de 1974, a de Medicina Comunitária. Contudo, é Medicina Preventiva que acaba por ser a mais moderna designação oficial. Acompanhando esta evolução é criado, como unidade estrutural da Faculdade de Medicina de Lisboa, o Instituto de Medicina Preventiva (IMP).
Esta diversidade de designações foi, naturalmente, fruto dos vários contextos científicos e políticos mas, importa salientar, que o que tem caracterizado o nosso domínio é a abordagem das questões da saúde sobretudo numa perspectiva populacional e em termos de promoção da saúde e prevenção da doença.
Voltando ao IMP. Este foi, num primeiro tempo, dirigido pelo Professor Fernando Leal da Costa. Seguiu-se o Professor Artur Torres Pereira, que já tinha sido anos antes o Professor de Higiene e Medicina Social. Mais tarde, já como professor associado, foi-me confiada a direcção do Instituto.
Newsletter: Como caracterizaria agora a evolução em termos do ensino ministrado?
Professor Pereira Miguel: Embora cada um de nós tivesse preparação científica e abordagem pedagógica diferentes, houve considerável continuidade no trabalho académico realizado, tanto nas temáticas nucleares como nos valores e princípios transmitidos. Isto, apesar das necessárias adaptações a diferentes reformas curriculares. Neste aspecto, a principal inovação foi a progressiva presença da Medicina Preventiva do primeiro ao último ano do curso de medicina, permitindo, através de disciplinas obrigatórias ou opcionais, o estudo continuado da saúde populacional e da prevenção.
Foi assim que surgiram nos últimos anos novas áreas como a Epidemiologia, a Saúde Ambiental e Ocupacional, a Medicina Geral e Familiar, e, ultimamente, a própria Saúde Pública. Constituiu-se progressivamente um eixo de ensino longitudinal que tenta preparar o futuro médico para uma prática em que a prevenção tem cada vez mais relevo.
Entre os desenvolvimentos mais significativos, um deles, foi sem dúvida, a introdução, pelo Professor Artur Torres Pereira, do ensino da Medicina Geral e Familiar como disciplina académica, há cerca de 20 anos. Esta visa uma preparação particular em termos do exercício médico na comunidade, centrado na pessoa e no seu agregado familiar, tomando em consideração todo o contexto social. Esta actuação requer competências próprias, a nível da promoção da saúde, da prevenção e do tratamento, praticados neste nível de cuidados de saúde.
Mas, nunca é demais salientar a importância de todas as outras disciplinas na preparação do médico. A Epidemiologia é uma ciência absolutamente fundamental para a prática da Medicina Preventiva e da Saúde Pública – permite-nos medir a saúde/doença, identificar os factores de risco e as causas, avaliar as intervenções. Temos sempre insistido, tanto no ensino da Epidemiologia básica, como no das suas aplicações, em particular, à clínica (Epidemiologia Clínica). A Saúde Pública, é leccionada desde há dois anos com base nas suas funções essenciais, que todos os médicos devem conhecer e para as quais o seu contributo é imprescindível.
A Saúde Ambiental e Ocupacional são também duas dimensões muito importantes da Medicina Preventiva, cada vez mais na ordem do dia, pelo que se reconhece do ambiente físico em geral e das circunstâncias laborais como fortes determinantes da saúde. A Economia da Saúde, cada vez mais relevante pela necessidade de bem gerir recursos sempre limitados, tem sido também leccionada, como área opcional. No futuro, esperamos poder alargar estas ofertas formativas à nutrição e à saúde internacional (melhor designada hoje por “saúde global”).
Preocupei-me em mencionar primeiro o nosso contributo para a licenciatura em Medicina, hoje Mestrado Integrado. Contudo, não podemos esquecer o trabalho realizado nas outras licenciaturas em que a FMUL se envolveu: Nutrição, Microbiologia, Ciências da Saúde. Em todas assegurámos ou asseguramos áreas curriculares no campo do que atrás expus.
Newsletter: Falou-nos só do ensino pré-graduado. E na vertente pós-graduada, o que salienta do trabalho do IMP?
Professor Pereira Miguel: Ao longo dos anos temos feito muitas actividades mais pontuais, como cursos, seminários, palestras, etc, convidando prelectores nacionais e internacionais. Mas, as actividades mais sistemáticas e continuadas têm sido no âmbito de diversos mestrados da Faculdade. Os mais antigos foram os Mestrados de Saúde Escolar e de Gestão em Saúde. Nos últimos anos, o nosso maior esforço tem-se concentrado nos mestrados de Epidemiologia (preparamos a 5ª edição) e de Comunicação em Saúde (preparamos a 3ª edição).
No futuro, gostaríamos de ir mais longe, desenvolvendo um Doutoramento inter-faculdades na área da Epidemiologia/Medicina Preventiva/Saúde Pública. Já começámos negociações com os nossos possíveis parceiros de outras faculdades, mas o modelo ainda não está completamente estabelecido. Gostaríamos também de realizar mais actividades de formação pós-graduada em vários dos domínios científicos acima mencionados em que temos maior conhecimento.
Newsletter: Há outros domínios de actividade do IMP que ainda queira mencionar ?
Professor Pereira Miguel: No âmbito do ensino falta ainda referir a nossa participação em diversas outras disciplinas em que nos pedem colaboração. Sem querer ser exaustivo posso mencionar a História da Medicina, a Ética, a Introdução à Medicina, no Mestrado Integrado em Medicina e, ainda, em diversos módulos de outros cursos e mestrados.
Para além do ensino e, como é nossa missão, dedicamo-nos igualmente à investigação, e até à prestação de serviços à comunidade. É claro que os meios para fazer investigação são talvez menos do que aqueles que podemos dedicar ao ensino, mas mesmo assim conseguimos, ao longo dos anos, desenvolver uma unidade de investigação reconhecida pela Fundação para Ciência e Tecnologia. Temos algumas linhas de investigação, investigadores vinculados e recursos dirigidos a áreas científicas no âmbito da Medicina Preventiva e da Saúde Pública. Os domínios de investigação mais relevantes são a vigilância epidemiológica ambiental, a saúde ocupacional, a prevenção cardiovascular, a saúde dos migrantes, a nutrição, as questões de avaliação de impacto na saúde, entre outras. O IMP tem acolhido diversos doutorandos, mestrandos e alunos de Medicina na realização dos seus trabalhos de investigação.
Na prestação de serviços à comunidade, muito embora tenhamos desenvolvido diversas actividades ao longo dos anos, o contributo mais significativo tem sido a vigilância epidemiológica das estações de resíduos urbanos (em São João da Talha/Lisboa e na Meia Serra/Funchal). Há vários anos que acompanhamos as populações expostas às emissões destas estruturas industriais com o propósito de identificar precocemente eventuais efeitos sobre a sua saúde.
Talvez valha a pena acrescentar que todas estas actividades se apoiam em pequenas unidades que se foram constituindo no IMP com diversos colaboradores onde não posso deixar de salientar os muitos bolseiros e docentes livres que sempre têm dado um contributo muito significativo.
Importa, por último, mencionar o nosso Centro de Documentação. Orgulhamo-nos de ter reunido ao longo dos anos um acervo bibliográfico apreciável, dedicado às temáticas que cultivamos, integralmente informatizado e acessível a todos os interessados.
Newsletter: A gestão de um Instituto com estas características tem sido fácil ou problemática? Tem havido factores condicionantes que valha a pena referir?
Professor Pereira Miguel: Bem. Esta pergunta daria uma longa conversa. Qualquer unidade estrutural da Faculdade sofre a influência da forma como esta é gerida e dos recursos disponíveis. Tudo isto no contexto de uma determinada organização da Administração Pública (nem sempre facilitadora…).
Pessoalmente, creio que tudo quanto favoreça uma maior participação de todos nas decisões, maior rigor, transparência e diálogo, mais recursos para o ensino e investigação são factores potenciadores de sucesso. No passado, entre outras dificuldades nem de instalação adequada dispúnhamos – agora, uma vez instalados no Edifício Egas Moniz, não nos podemos queixar.
Um factor facilitador muito importante ao longo dos anos tem sido a Associação para a Investigação e Desenvolvimento da Faculdade de Medicina (AIDFM). É de toda a justiça fazer uma referência muito elogiosa.
Mas, o factor mais importante, têm sido as “pessoas”. Professores, assistentes, docentes livres, investigadores, administrativos, têm contribuído de forma relevante para que a missão do IMP se concretize.
Newsletter: Já referiu alguns dos possíveis desenvolvimentos futuros do IMP. Haverá ainda outros a referir, sobretudo no âmbito do Centro Académico de Medicina de Lisboa e das instituições que o integram ?
Professor Pereira Miguel: Encaramos todas essas colaborações como altamente desejáveis e, por isso, temos feito diversas sugestões e tentativas ao longo dos anos. A mais recente, e que ficou consignada no próprio estatuto do CAML, é a possibilidade deste integrar unidades de cuidados de saúde primários. A concretizar-se, este seria um enorme avanço para uma, cada vez mais adequada, preparação dos médicos, e, para o avanço da Medicina Geral e Familiar entre nós.
Outra vertente muito importante é a da colaboração fora de portas. Nas nossas áreas científicas, para lá da cooperação com instituições congéneres ou com objectivos convergentes, o exercício de funções diversas no sistema de saúde e a internacionalização são indispensáveis. Muitos colaboradores do IMP têm tido posições destacadas tanto a nível nacional como internacional. Isso tem sido muito importante para o ensino e para a investigação. Tem permitido uma actualização constante e uma integração dos temas mais relevantes na nossa actividade académica. Também temos recebido estagiários sobretudo dos países de língua portuguesa.
Sonhamos sempre com um IMP mais robusto, mais competente e interventivo. A competição com as outras áreas científicas, tanto básicas como clínicas, sempre foi e será omnipresente. É crítica para a sobrevivência, mas, também, para o progresso científico. Se acreditamos que há um lugar para a Medicina Preventiva e para a Saúde Pública nas Faculdades de Medicina, é muito sobre nós todos que recai o ónus de lutar pela excelência. Pela minha parte, vejo a vida profissional como uma corrida de estafetas: corremos a nossa parte o melhor que podemos, passamos o testemunho em condições, e a corrida segue… desejavelmente, com brilho e êxito.
" Pela minha parte, vejo a vida profissional como uma corrida de estafetas: corremos a nossa parte o melhor que podemos, passamos o testemunho em condições, e a corrida segue … desejavelmente, com brilho e êxito." J.P.M.
Newsletter: Caro Professor Pereira Miguel, a Newsletter tem vindo a dar a conhecer melhor a Faculdade aos seus leitores e, nesse sentido, gostaríamos de lhe pedir que nos falasse da génese do Instituto de Medicina Preventiva, quando foi fundado, os seus directores, principais acontecimentos e marcos históricos que gostasse de realçar.
Professor Pereira Miguel: A história da nossa área lectiva remonta ao final do século XIX e a uma disciplina da Escola Médico-Cirúrgica de Lisboa chamada Medicina Legal e Higiene. A Higiene estava ligada à Medicina Legal, por se entender que muitos aspectos da saúde pública eram acautelados pela legislação sanitária. Nessa época, Ricardo Jorge refugia-se em Lisboa. É perseguido e mal tratado no Porto, em consequência das medidas que tomara no combate a um surto de peste bubónica. Era já uma grande personalidade da saúde pública e a Escola, por isso, ofereceu-lhe a cátedra de Higiene, por desdobramento da anterior.
A situação manteve-se assim até à Reforma de 1911, de que estamos agora a comemorar o centenário. Essa reforma, já com a criação da Faculdade de Medicina de Lisboa, contempla uma cadeira de Higiene e um curso de Epidemiologia, também da responsabilidade do Professor Ricardo Jorge.
Ao longo do século XX há várias reformas do ensino e esta área curricular recebe sucessivamente as designações de Higiene e Epidemiologia, Higiene e Medicina Social e, mais tarde, após o 25 de Abril de 1974, a de Medicina Comunitária. Contudo, é Medicina Preventiva que acaba por ser a mais moderna designação oficial. Acompanhando esta evolução é criado, como unidade estrutural da Faculdade de Medicina de Lisboa, o Instituto de Medicina Preventiva (IMP).
Esta diversidade de designações foi, naturalmente, fruto dos vários contextos científicos e políticos mas, importa salientar, que o que tem caracterizado o nosso domínio é a abordagem das questões da saúde sobretudo numa perspectiva populacional e em termos de promoção da saúde e prevenção da doença.
Voltando ao IMP. Este foi, num primeiro tempo, dirigido pelo Professor Fernando Leal da Costa. Seguiu-se o Professor Artur Torres Pereira, que já tinha sido anos antes o Professor de Higiene e Medicina Social. Mais tarde, já como professor associado, foi-me confiada a direcção do Instituto.
Newsletter: Como caracterizaria agora a evolução em termos do ensino ministrado?
Professor Pereira Miguel: Embora cada um de nós tivesse preparação científica e abordagem pedagógica diferentes, houve considerável continuidade no trabalho académico realizado, tanto nas temáticas nucleares como nos valores e princípios transmitidos. Isto, apesar das necessárias adaptações a diferentes reformas curriculares. Neste aspecto, a principal inovação foi a progressiva presença da Medicina Preventiva do primeiro ao último ano do curso de medicina, permitindo, através de disciplinas obrigatórias ou opcionais, o estudo continuado da saúde populacional e da prevenção.
Foi assim que surgiram nos últimos anos novas áreas como a Epidemiologia, a Saúde Ambiental e Ocupacional, a Medicina Geral e Familiar, e, ultimamente, a própria Saúde Pública. Constituiu-se progressivamente um eixo de ensino longitudinal que tenta preparar o futuro médico para uma prática em que a prevenção tem cada vez mais relevo.
Entre os desenvolvimentos mais significativos, um deles, foi sem dúvida, a introdução, pelo Professor Artur Torres Pereira, do ensino da Medicina Geral e Familiar como disciplina académica, há cerca de 20 anos. Esta visa uma preparação particular em termos do exercício médico na comunidade, centrado na pessoa e no seu agregado familiar, tomando em consideração todo o contexto social. Esta actuação requer competências próprias, a nível da promoção da saúde, da prevenção e do tratamento, praticados neste nível de cuidados de saúde.
Mas, nunca é demais salientar a importância de todas as outras disciplinas na preparação do médico. A Epidemiologia é uma ciência absolutamente fundamental para a prática da Medicina Preventiva e da Saúde Pública – permite-nos medir a saúde/doença, identificar os factores de risco e as causas, avaliar as intervenções. Temos sempre insistido, tanto no ensino da Epidemiologia básica, como no das suas aplicações, em particular, à clínica (Epidemiologia Clínica). A Saúde Pública, é leccionada desde há dois anos com base nas suas funções essenciais, que todos os médicos devem conhecer e para as quais o seu contributo é imprescindível.
A Saúde Ambiental e Ocupacional são também duas dimensões muito importantes da Medicina Preventiva, cada vez mais na ordem do dia, pelo que se reconhece do ambiente físico em geral e das circunstâncias laborais como fortes determinantes da saúde. A Economia da Saúde, cada vez mais relevante pela necessidade de bem gerir recursos sempre limitados, tem sido também leccionada, como área opcional. No futuro, esperamos poder alargar estas ofertas formativas à nutrição e à saúde internacional (melhor designada hoje por “saúde global”).
Preocupei-me em mencionar primeiro o nosso contributo para a licenciatura em Medicina, hoje Mestrado Integrado. Contudo, não podemos esquecer o trabalho realizado nas outras licenciaturas em que a FMUL se envolveu: Nutrição, Microbiologia, Ciências da Saúde. Em todas assegurámos ou asseguramos áreas curriculares no campo do que atrás expus.
Newsletter: Falou-nos só do ensino pré-graduado. E na vertente pós-graduada, o que salienta do trabalho do IMP?
Professor Pereira Miguel: Ao longo dos anos temos feito muitas actividades mais pontuais, como cursos, seminários, palestras, etc, convidando prelectores nacionais e internacionais. Mas, as actividades mais sistemáticas e continuadas têm sido no âmbito de diversos mestrados da Faculdade. Os mais antigos foram os Mestrados de Saúde Escolar e de Gestão em Saúde. Nos últimos anos, o nosso maior esforço tem-se concentrado nos mestrados de Epidemiologia (preparamos a 5ª edição) e de Comunicação em Saúde (preparamos a 3ª edição).
No futuro, gostaríamos de ir mais longe, desenvolvendo um Doutoramento inter-faculdades na área da Epidemiologia/Medicina Preventiva/Saúde Pública. Já começámos negociações com os nossos possíveis parceiros de outras faculdades, mas o modelo ainda não está completamente estabelecido. Gostaríamos também de realizar mais actividades de formação pós-graduada em vários dos domínios científicos acima mencionados em que temos maior conhecimento.
Newsletter: Há outros domínios de actividade do IMP que ainda queira mencionar ?
Professor Pereira Miguel: No âmbito do ensino falta ainda referir a nossa participação em diversas outras disciplinas em que nos pedem colaboração. Sem querer ser exaustivo posso mencionar a História da Medicina, a Ética, a Introdução à Medicina, no Mestrado Integrado em Medicina e, ainda, em diversos módulos de outros cursos e mestrados.
Para além do ensino e, como é nossa missão, dedicamo-nos igualmente à investigação, e até à prestação de serviços à comunidade. É claro que os meios para fazer investigação são talvez menos do que aqueles que podemos dedicar ao ensino, mas mesmo assim conseguimos, ao longo dos anos, desenvolver uma unidade de investigação reconhecida pela Fundação para Ciência e Tecnologia. Temos algumas linhas de investigação, investigadores vinculados e recursos dirigidos a áreas científicas no âmbito da Medicina Preventiva e da Saúde Pública. Os domínios de investigação mais relevantes são a vigilância epidemiológica ambiental, a saúde ocupacional, a prevenção cardiovascular, a saúde dos migrantes, a nutrição, as questões de avaliação de impacto na saúde, entre outras. O IMP tem acolhido diversos doutorandos, mestrandos e alunos de Medicina na realização dos seus trabalhos de investigação.
Na prestação de serviços à comunidade, muito embora tenhamos desenvolvido diversas actividades ao longo dos anos, o contributo mais significativo tem sido a vigilância epidemiológica das estações de resíduos urbanos (em São João da Talha/Lisboa e na Meia Serra/Funchal). Há vários anos que acompanhamos as populações expostas às emissões destas estruturas industriais com o propósito de identificar precocemente eventuais efeitos sobre a sua saúde.
Talvez valha a pena acrescentar que todas estas actividades se apoiam em pequenas unidades que se foram constituindo no IMP com diversos colaboradores onde não posso deixar de salientar os muitos bolseiros e docentes livres que sempre têm dado um contributo muito significativo.
Importa, por último, mencionar o nosso Centro de Documentação. Orgulhamo-nos de ter reunido ao longo dos anos um acervo bibliográfico apreciável, dedicado às temáticas que cultivamos, integralmente informatizado e acessível a todos os interessados.
Newsletter: A gestão de um Instituto com estas características tem sido fácil ou problemática? Tem havido factores condicionantes que valha a pena referir?
Professor Pereira Miguel: Bem. Esta pergunta daria uma longa conversa. Qualquer unidade estrutural da Faculdade sofre a influência da forma como esta é gerida e dos recursos disponíveis. Tudo isto no contexto de uma determinada organização da Administração Pública (nem sempre facilitadora…).
Pessoalmente, creio que tudo quanto favoreça uma maior participação de todos nas decisões, maior rigor, transparência e diálogo, mais recursos para o ensino e investigação são factores potenciadores de sucesso. No passado, entre outras dificuldades nem de instalação adequada dispúnhamos – agora, uma vez instalados no Edifício Egas Moniz, não nos podemos queixar.
Um factor facilitador muito importante ao longo dos anos tem sido a Associação para a Investigação e Desenvolvimento da Faculdade de Medicina (AIDFM). É de toda a justiça fazer uma referência muito elogiosa.
Mas, o factor mais importante, têm sido as “pessoas”. Professores, assistentes, docentes livres, investigadores, administrativos, têm contribuído de forma relevante para que a missão do IMP se concretize.
Newsletter: Já referiu alguns dos possíveis desenvolvimentos futuros do IMP. Haverá ainda outros a referir, sobretudo no âmbito do Centro Académico de Medicina de Lisboa e das instituições que o integram ?
Professor Pereira Miguel: Encaramos todas essas colaborações como altamente desejáveis e, por isso, temos feito diversas sugestões e tentativas ao longo dos anos. A mais recente, e que ficou consignada no próprio estatuto do CAML, é a possibilidade deste integrar unidades de cuidados de saúde primários. A concretizar-se, este seria um enorme avanço para uma, cada vez mais adequada, preparação dos médicos, e, para o avanço da Medicina Geral e Familiar entre nós.
Outra vertente muito importante é a da colaboração fora de portas. Nas nossas áreas científicas, para lá da cooperação com instituições congéneres ou com objectivos convergentes, o exercício de funções diversas no sistema de saúde e a internacionalização são indispensáveis. Muitos colaboradores do IMP têm tido posições destacadas tanto a nível nacional como internacional. Isso tem sido muito importante para o ensino e para a investigação. Tem permitido uma actualização constante e uma integração dos temas mais relevantes na nossa actividade académica. Também temos recebido estagiários sobretudo dos países de língua portuguesa.
Sonhamos sempre com um IMP mais robusto, mais competente e interventivo. A competição com as outras áreas científicas, tanto básicas como clínicas, sempre foi e será omnipresente. É crítica para a sobrevivência, mas, também, para o progresso científico. Se acreditamos que há um lugar para a Medicina Preventiva e para a Saúde Pública nas Faculdades de Medicina, é muito sobre nós todos que recai o ónus de lutar pela excelência. Pela minha parte, vejo a vida profissional como uma corrida de estafetas: corremos a nossa parte o melhor que podemos, passamos o testemunho em condições, e a corrida segue… desejavelmente, com brilho e êxito.