Espaço Aberto
O Hospital de Dia do Serviço de Psiquiatria e Saúde Mental do Departamento de Neurociências do CHLN
Drª Paula Godinho (chefe de equipa do Hospital de Dia); Profº Drª Luisa Figueira (Directora do Serviço de Psiquiatria; Psicóloga Drª Maria João Centeno, Psicóloga Drª Teresa Fialho, Enfermeira Liliana Campos, Enfermeira Cristina Guerreiro.
O Hospital de Dia é uma Unidade Funcional do Serviço de Psiquiatria e Saúde Mental dirigido pela Professora Luísa Figueira e encontra-se integrado no Departamento de Neurociências do Centro Hospitalar Lisboa-Norte.
Com início em 1957, o Hospital de Dia foi a primeira unidade de internamento a entrar em funcionamento no Serviço de Psiquiatria deste Hospital. Ao longo dos anos tem-se afirmado como um dispositivo terapêutico e de formação pré e pós-graduada de referência em Portugal, designadamente no campo da aplicação dos princípios psicanalíticos e grupanalíticos às intervenções em Psiquiatria e Saúde Mental. É procurado para efeitos de tratamento e formação por pessoas provenientes de instituições de todo o país.
Uma meta-análise de 18 estudos publicados entre 1957 e 1997 permitiu concluir que a hospitalização parcial em hospitais de dia psiquiátricos é uma alternativa efectiva ao internamento a tempo completo (Horvitz-Lennon & al., 2001). Neste estudo os autores concluíram que “os resultados da hospitalização parcial não eram diferentes dos resultados do internamento completo”, tendo ainda verificado uma maior satisfação dos pacientes e famílias. Bateman & Fonagy (2008) estudaram o tratamento da perturbação de personalidade borderline em hospital de dia, e concluíram que a hospitalização parcial é efectiva comparativamente ao grupo de controle, na diminuição dos suicídios, auto-mutilações, reinternamentos e depressão, resultados que se mantêm num follow-up de 8 anos. Desde 2005 que a Organização Mundial de Saúde aponta a hospitalização parcial como uma alternativa custo-efectiva à hospitalização a tempo completo (Marshall, 2005).
População Tratada
O Hospital de Dia tem-se dedicado ao tratamento de adultos com descompensações agudas, verificando-se que a média de idades é de 30 anos. A constituição do grupo em termos de diagnóstico ICD-10 (WHO, 1992) tem variado ao longo dos anos: esquizofrenia perturbação esquizotípica e delirante (26%-38%), perturbações do humor (40%-50%), perturbações neuróticas relacionadas com o stress e somatoformes (15%-20%), síndromes do comportamento associadas a transtornos fisiológicos e factores físicos (4%–10%). Na maioria dos casos os doentes apresentam co-morbilidade com perturbação de personalidade e do comportamento (50%-60%).
Relativamente à situação profissional encontramos: desempregados sem qualificação profissional (21%-30%), profissionais qualificados e empregados por conta de outrem (28%-36%) e estudantes (20%-25%).
São de referir à data de alta e nos follow-ups realizados, resultados significativamente positivos na remissão sintomática e na melhoria mantida do funcionamento sócio-profissional (Neto, Fialho, Godinho & Centeno, 2010).
A Equipa e a Formação
A equipa é constituída por dois psiquiatras, (um dois quais apenas a tempo parcial) e duas psicólogas, com formação psicanalítica e/ou grupanalítica, duas enfermeiras e uma terapeuta ocupacional (a tempo parcial). Integram ainda a equipa uma média de 2 a 5 elementos em formação pertencentes a cada um dos seguintes grupos profissionais: Psiquiatria, Pedopsiquiatria, Psicologia Clínica e Enfermagem. Desde há 6 anos a equipa tem também contribuído para o ensino e formação de cerca de 35 alunos de Medicina, anualmente.
Através do seu funcionamento grupal, clínico e formativo indissociáveis, a equipa encoraja o conhecimento, o questionamento reflexivo e a curiosidade, levando à identificação e elaboração de diferentes perspectivas da mesma realidade observada. A atmosfera é de liberdade, espontaneidade e respeito mútuo, promovendo-se “o desenvolvimento e crescimento psíquico” dos elementos em formação (Neto, Fialho, Godinho & Centeno, 2010).
O Programa de Tratamento
O programa de tratamento compreende actividades terapêuticas de acção directa, nomeadamente: a entrevista de admissão, a psicoterapia de grupo, psicoterapia individual, grupo de medicação, treino de competências sociais, terapia ocupacional e intervenções familiares, incluindo psicoterapia de grupo multifamiliar . Para além destas actividades terapêuticas de acção directa, a equipa realiza reuniões clínicas e de supervisão indispensáveis para a manutenção da qualidade dos cuidados.
O Programa Terapêutico do Hospital de Dia tem vindo a ser progressivamente adaptado às necessidades dos pacientes e à realidade hospitalar. É assim que em 2001, a equipa inicia um grupo de Psicanálise Multifamiliar, (Garcia Badaracco ,2000) cujo modelo tem vindo a ser aplicado com bons resultados em diversos países da América e Europa. Salientamos também no nosso actual modelo terapêutico a importância dos trabalhos de Bateman e Fonagy (2008) sobre o tratamento com base na mentalização.
O Prémio Jane Abercrombie
Em 2008 a prática clínica e a actividade formativa realizadas, foram reconhecidas pelo prémio Jane Abercrombie, atribuído pela Group Analytic Society (London) às médicas psiquiatras Isaura Neto e Paula Godinho e às psicólogas clínicas Teresa Fialho e Maria João Centeno.
Jane Abercrombie (1909-1984) foi uma cientista e professora universitária inglesa que se interessou de modo aprofundado pela grupanálise. Abercrombie foi uma das fundadoras da Group Analytic Society e presidente da mesma durante o ano de 1981. Levou a cabo uma investigação pioneira no campo da aplicação dos conceitos grupanalíticos ao ensino em grupo, em particular com estudantes de Medicina, tornando-se em 1975 membro da direcção do Cambridge Groupwork on Higher Education.
Uma das suas principais conclusões foi que a discussão em grupo, quando bem conduzida, permite a aprendizagem activa e o pensamento criativo, com evidentes vantagens sobre a mera aceitação passiva da informação.
Face à importância dos seus contributos a Group Analytical Society (London), atribui desde 1984 a cada triénio um prémio que distingue trabalhos significativos na aplicação dos conceitos grupanalíticos ao ensino e formação.
Elementos da equipa e elementos em formação no Hospital de Dia do Serviço de Psiquiatria.
O Reconhecimento Internacional das Boas Práticas em Hospital de Dia
O trabalho desenvolvido pelo Hospital de Dia foi recentemente publicado no livro “Psychological Groupwork with Acute Psychiatric Inpatients”editado por um grupo de autores do Maudsley Hospital, Londres. Este trabalho foi apresentado pela sua autora Drª Isaura Neto, numa conferência organizada pelo Instituto de Psiquiatria (King’s College / Maudsley Hospital) em 18 de Março de 2010. Este livro tem por objectivo a promoção e disseminação internacional das boas práticas em psicoterapia de grupo com doentes psiquiátricos internados.
* Médica Psiquiatra Assistente Hospitalar Graduada. Chefe de Equipa do Hospital de Dia de Psiquiatria e Saúde Mental. Pós-graduada em Saúde Mental e Mestre em Bioética pela Faculdade de Medicina de Lisboa. hdiahsm@gmail.com
** Psicóloga Clínica. Técnica Superior de Saúde. Mestre em Psicologia Clínica. hdiahsm@gmail.com
***Psicóloga Educacional. Técnica Superior de Saúde. Grupanalista. Mestre em Psicologia Educacional. hdiahsm@gmail.com
Sala de Actividades Terapêuticas, Psicoterapeuticas e de Grupo e Psicoterapia Multifamiliar
Paula Godinho*;Teresa Fialho**Maria João Centeno***
Hospital de Dia do Serviço de Psiquiatria e Saúde Mental
do Departamento de Neurociências do CHLN
Directora do Serviço de Psiquiatria e Saúde Mental : Prof. Doutora Luísa Figueira
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Referências
Badaracco, J. G. (2000). Psicoanálisis Multifamiliar, Los Otros en Nosotros y el Descubrimiento del sí Mismo. Buenos Aires: Paidós.
Bateman, A., Fonagy, P. (2008). 8-year follow-up of patients treated for borderline personality disorder: mentalization-based treatment versus treatment as usual. American Journal of Psychiatry 165:631-638
Horvitz-Lennon, M., Normand, S-L.T., Gaccione, M.A. & Frank, R.G. (2001) Partial versus Full Hospitalization for Adults in Psychiatric Distress: A Systematic Review of the Published Literature (1957-1997). American journal of Psychiatry 158, 5, 676-685.
Marshall, M (2005). How effective are different types of day care services for people with severe mental disorders. Copenhagen, WHO Regional Office for Europe (Health Evidence Network report; http://www.euro.who.int/Document/E87317.pdf accessed May 2009.
Neto, I. M., Fialho, T., Godinho, P. & Centeno, M. J. (2010). Treating and Training: A 30 Year Experience of a Team with a Group-Analytic Framework: Part I. Group Analysis, March 2010; 43(1): 50-60.
Neto, I. M., Fialho, T., Godinho, P. & Centeno, M. J. (2010). Treating and Training: A 30 Year Experience of a Team with a Group-Analytic Framework: Part II. Group Analysis, June 2010; 43, (2): 107-126.
Neto, I. M., 2010 Moving groupwork into the day hospital setting. In, J. Radcliffe, K., Hajek, J. Carson & O Manor, (2010), Psychological Groupwork with Acute Psychiatric Inpatients (pp325-342). London: Whiting & Birch.