Espaço Aberto
Ecocardiografia de Esforço
A elevada prevalência de doença coronária conduziu ao desenvolvimento de técnicas complementares de diagnóstico não invasivas, fiáveis e acessíveis para o seu diagnóstico e avaliação. Entre estas, a prova de esforço clássica em tapete rolante, embora amplamente utilizada, apresenta limitações para o diagnóstico de isquémia, o que motivou o desenvolvimento de novos métodos não invasivos de diagnóstico. Dentre estes, a ecocardiografia de esforço (EE) é aceite como método valioso de detecção de doença coronária. Esta forma de sobrecarga é actualmente efectuada no nosso centro, sendo o esforço efectuado em tapete rolante a forma preferencial. A sobrecarga farmacológica é sobretudo utilizada quando se pretende avaliar viabilidade ou quando o doente não pode efectuar esforço.
Respeitando as “Guidelines” da Sociedade Europeia de Cardiologia (1) utilizamos, sempre que o doente pode fazer esforço, em primeiro lugar, a ecocardiografia de esforço. Só quando o doente não pode fazer esforço, por exemplo, por problemas do foro ortopédico, ou quando a prova de esforço ou ecocardiograma de esforço foi inconclusivo por incompetência cronotrópica, é que fazemos ecocardiograma de sobrecarga farmacológica.
Apesar da preferência que procuramos dar à EE, a ecocardiografia de sobrecarga farmacológica ultrapassa ligeiramente os 40% dos ecocardiogramas de sobrecarga que efectuamos.
Para além do facto de a realização de ecocardiografia de esforço ser imperativa para respeitarmos as “Guidelines”, existem razões relativas à segurança que nos obrigam a dar preferência, sempre que possível, à EE. Um registo com 85.997 exames (2) encontrou uma taxa de eventos graves de 1 para 6.574 EE, 1 para 1.294 ecocardiogramas de sobrecarga com dipiridamol e 1 evento para cada 557 ESD, demonstrando de forma clara – mesmo tendo em conta a possível influência dos critérios de referência para cada tipo de sobrecarga – a maior segurança do esforço. Julgamos também que os efeitos acessórios dos fármacos – aparentemente ignorados nos laboratórios de ecocardiografia – devem conduzir à realização, sempre que possível, de ecocardiografia de esforço em detrimento da sobrecarga farmacológica.
Metodologia da ecocardiografia de esforço (3,4)
Prova de esforço: Os doentes são interrogados relativamente aos seus sintomas, antecedentes cardiológicos e factores de risco para doença coronária. Após explicação e preparação para o procedimento, por parte do técnico cardiopneumografista, é obtido um ECG de 12 derivações. O protocolo de esforço habitualmente utilizado no nosso centro é o de Bruce, sendo critérios para interrupção da prova: fadiga, angor em crescendo ou tonturas, infradesnivelamento de ST > que 3 mm, disritmias ventriculares complexas, pressão arterial sistólica > 240mmHg e ou diastólica > que 130 mmHg. O aparecimento de alterações da contractilidade bem como a sua extensão não constituem habitualmente critério para interrupção da prova.
Ecocardiografia de esforço: É efectuado ecocardiograma em decúbito lateral esquerdo com aquisição de imagens em pelo menos quatro planos: para esternal eixo longo, paraesternal eixo curto, apical quatro câmaras e apical duas câmaras, antes do inicio da prova de esforço. Após a interrupção da prova de esforço o doente é rapidamente colocado em decúbito lateral esquerdo e adquiridas imagens nos mesmos planos (nos primeiros 90 segundos). São arquivadas imagens em cine loop em repouso e imediatamente após o final da prova. No nosso centro é também efectuado ecocardiograma em pé, no decurso da prova de esforço, com aquisição de cine loop no pico de esforço. Para efeitos de análise é utilizada a segmentação da ASE que divide o ventrículo esquerdo em 16 segmentos. Considera-se haver isquémia quando ocorrem alterações da contractilidade “de novo”, com aparecimento de zonas de hipocinésia, acinésia ou discinésia (uma zona acinética que se torna discinética não é considerado sinal de isquémia). A ausência de hipercinésia, sobretudo se localizada, também é considerada sinal de isquémia e, portanto, de positividade do ecocardiograma de esforço. A gravidade da isquémia é determinada pela extensão da isquémia, avaliada pelo número de segmentos afectados, mas também pela precocidade do seu aparecimento. A maior duração das alterações da contractilidade após o final do esforço também constitui sinal de maior gravidade.
Utilizando a metodologia descrita efectuamos, anualmente, no nosso centro, várias centenas de ecocardiogramas de esforço. Estes são sobretudo efectuados para diagnóstico de isquémia e no seguimento de doentes submetidos a procedimentos de revascularização. Uma significativa percentagem de exames é efectuada no estudo de patologia valvular, na avaliação da pressão sistólica da artéria pulmonar, no estudo de próteses valvulares, na pesquisa de gradientes intraventriculares em atletas (5) (Figura 1) , na síndrome X (6) e em doentes com miocardiopatia hipertrófica (7) .
As técnicas de imagem alternativas, como a cintigrafia de perfusão miocárdica, cuja capacidade diagnostica é semelhante à ecocardiografia de sobrecarga, devem ser preteridas de acordo com a legislação europeia (8,9), que nos obriga a utilizar métodos complementares de diagnóstico que não utilizem radiação, quando existem alternativas, sem radiação. Assim, motivos de ordem ética e legal obrigam à disseminação da ecocardiografia de sobrecarga como método preferencial para o estudo dos nossos doentes. As recomendações (1) e o bem-estar dos doentes que podem fazer esforço, bem como a quantidade e qualidade da informação obtida, obrigam-nos a utilizar preferencialmente o esforço.
Carlos Cotrim
Serviço de Cardiologia do Hospital Garcia de Orta
carlosadcotrim@hotmail.com
Bibliografia
1. Fox K, Garcia MAA, Ardissimo D, et al. “Guidelines on the management of stable angina pectoris”. European Heart Journal, disponível em http://eurheartj.oxfordjournals.org/content/27/11/1341.full
2. Varga A, Garcia MAR, Picano E. “Safety of stress echocardiography”. American Journal of Cardiology. 2006; 98:541-543.
3. Roger VL, Pellikka PA, Oh JK, Miller FA, Sewward JB, Tajik AJ. “Stress echocardiography. Part I Exercise echocardiography: techniques, implementation, clinical aplications, and correlations”. Mayo Clinic Proceedings 1995;70:5-15.
4. Carlos Cotrim, Manuel Carrageta. “Ecocardiografia de Sobrecarga – Esforço”. Revista Portuguesa de Cardiologia, 2000;19(3):345-350.
5. Cotrim C, Almeida AG, Carrageta M. “Clinical significance of intraventricular gradient during effort in an adolescent karate player”. Cardiovascular Ultrasound, 2007,5:39
6. Cotrim C, Almeida AG, Carrageta M, “Exercise-induced intra-ventricular gradients as a frequent potential cause of myocardial ischemia in cardiac syndrome X patients”.Cardiovascular Ultrasound 2008; 6:3.
7. Picano E. “Stress echocardiography in hypertrophic cardiomyopathy”. In Picano E. ed., Stress echocardiography. 5th Edition. Springer-Verlag Berlin Heidelberg. 2009:479-486.
8. “European Commission Medical Imaging Guidelines”, 2001. incompleto
9. Euratom directive 97/43. Referência incompleta, sugiro :
COUNCIL DIRECTIVE 97/43/EURATOM of 30 June 1997 on health protection of individuals against the dangers of ionizing radiation in relation to medical exposure…, disponivel em
http://ec.europa.eu/energy/nuclear/radioprotection/doc/legislation/9743_en.pdf
10. Picano E. Stress echocardiography in hypertrophic cardiomyopathy. In Picano E.ed. Stress echocardiography. 5th Edition. Springer-Verlag Berlin Heidelberg. 2009:479-486.
11. European Comission Medical Imaging Guidelines (2001).
12. Euratom directive 97/43.
Respeitando as “Guidelines” da Sociedade Europeia de Cardiologia (1) utilizamos, sempre que o doente pode fazer esforço, em primeiro lugar, a ecocardiografia de esforço. Só quando o doente não pode fazer esforço, por exemplo, por problemas do foro ortopédico, ou quando a prova de esforço ou ecocardiograma de esforço foi inconclusivo por incompetência cronotrópica, é que fazemos ecocardiograma de sobrecarga farmacológica.
Apesar da preferência que procuramos dar à EE, a ecocardiografia de sobrecarga farmacológica ultrapassa ligeiramente os 40% dos ecocardiogramas de sobrecarga que efectuamos.
Para além do facto de a realização de ecocardiografia de esforço ser imperativa para respeitarmos as “Guidelines”, existem razões relativas à segurança que nos obrigam a dar preferência, sempre que possível, à EE. Um registo com 85.997 exames (2) encontrou uma taxa de eventos graves de 1 para 6.574 EE, 1 para 1.294 ecocardiogramas de sobrecarga com dipiridamol e 1 evento para cada 557 ESD, demonstrando de forma clara – mesmo tendo em conta a possível influência dos critérios de referência para cada tipo de sobrecarga – a maior segurança do esforço. Julgamos também que os efeitos acessórios dos fármacos – aparentemente ignorados nos laboratórios de ecocardiografia – devem conduzir à realização, sempre que possível, de ecocardiografia de esforço em detrimento da sobrecarga farmacológica.
Metodologia da ecocardiografia de esforço (3,4)
Prova de esforço: Os doentes são interrogados relativamente aos seus sintomas, antecedentes cardiológicos e factores de risco para doença coronária. Após explicação e preparação para o procedimento, por parte do técnico cardiopneumografista, é obtido um ECG de 12 derivações. O protocolo de esforço habitualmente utilizado no nosso centro é o de Bruce, sendo critérios para interrupção da prova: fadiga, angor em crescendo ou tonturas, infradesnivelamento de ST > que 3 mm, disritmias ventriculares complexas, pressão arterial sistólica > 240mmHg e ou diastólica > que 130 mmHg. O aparecimento de alterações da contractilidade bem como a sua extensão não constituem habitualmente critério para interrupção da prova.
Ecocardiografia de esforço: É efectuado ecocardiograma em decúbito lateral esquerdo com aquisição de imagens em pelo menos quatro planos: para esternal eixo longo, paraesternal eixo curto, apical quatro câmaras e apical duas câmaras, antes do inicio da prova de esforço. Após a interrupção da prova de esforço o doente é rapidamente colocado em decúbito lateral esquerdo e adquiridas imagens nos mesmos planos (nos primeiros 90 segundos). São arquivadas imagens em cine loop em repouso e imediatamente após o final da prova. No nosso centro é também efectuado ecocardiograma em pé, no decurso da prova de esforço, com aquisição de cine loop no pico de esforço. Para efeitos de análise é utilizada a segmentação da ASE que divide o ventrículo esquerdo em 16 segmentos. Considera-se haver isquémia quando ocorrem alterações da contractilidade “de novo”, com aparecimento de zonas de hipocinésia, acinésia ou discinésia (uma zona acinética que se torna discinética não é considerado sinal de isquémia). A ausência de hipercinésia, sobretudo se localizada, também é considerada sinal de isquémia e, portanto, de positividade do ecocardiograma de esforço. A gravidade da isquémia é determinada pela extensão da isquémia, avaliada pelo número de segmentos afectados, mas também pela precocidade do seu aparecimento. A maior duração das alterações da contractilidade após o final do esforço também constitui sinal de maior gravidade.
Utilizando a metodologia descrita efectuamos, anualmente, no nosso centro, várias centenas de ecocardiogramas de esforço. Estes são sobretudo efectuados para diagnóstico de isquémia e no seguimento de doentes submetidos a procedimentos de revascularização. Uma significativa percentagem de exames é efectuada no estudo de patologia valvular, na avaliação da pressão sistólica da artéria pulmonar, no estudo de próteses valvulares, na pesquisa de gradientes intraventriculares em atletas (5) (Figura 1) , na síndrome X (6) e em doentes com miocardiopatia hipertrófica (7) .
As técnicas de imagem alternativas, como a cintigrafia de perfusão miocárdica, cuja capacidade diagnostica é semelhante à ecocardiografia de sobrecarga, devem ser preteridas de acordo com a legislação europeia (8,9), que nos obriga a utilizar métodos complementares de diagnóstico que não utilizem radiação, quando existem alternativas, sem radiação. Assim, motivos de ordem ética e legal obrigam à disseminação da ecocardiografia de sobrecarga como método preferencial para o estudo dos nossos doentes. As recomendações (1) e o bem-estar dos doentes que podem fazer esforço, bem como a quantidade e qualidade da informação obtida, obrigam-nos a utilizar preferencialmente o esforço.
Carlos Cotrim
Serviço de Cardiologia do Hospital Garcia de Orta
carlosadcotrim@hotmail.com
Bibliografia
1. Fox K, Garcia MAA, Ardissimo D, et al. “Guidelines on the management of stable angina pectoris”. European Heart Journal, disponível em http://eurheartj.oxfordjournals.org/content/27/11/1341.full
2. Varga A, Garcia MAR, Picano E. “Safety of stress echocardiography”. American Journal of Cardiology. 2006; 98:541-543.
3. Roger VL, Pellikka PA, Oh JK, Miller FA, Sewward JB, Tajik AJ. “Stress echocardiography. Part I Exercise echocardiography: techniques, implementation, clinical aplications, and correlations”. Mayo Clinic Proceedings 1995;70:5-15.
4. Carlos Cotrim, Manuel Carrageta. “Ecocardiografia de Sobrecarga – Esforço”. Revista Portuguesa de Cardiologia, 2000;19(3):345-350.
5. Cotrim C, Almeida AG, Carrageta M. “Clinical significance of intraventricular gradient during effort in an adolescent karate player”. Cardiovascular Ultrasound, 2007,5:39
6. Cotrim C, Almeida AG, Carrageta M, “Exercise-induced intra-ventricular gradients as a frequent potential cause of myocardial ischemia in cardiac syndrome X patients”.Cardiovascular Ultrasound 2008; 6:3.
7. Picano E. “Stress echocardiography in hypertrophic cardiomyopathy”. In Picano E. ed., Stress echocardiography. 5th Edition. Springer-Verlag Berlin Heidelberg. 2009:479-486.
8. “European Commission Medical Imaging Guidelines”, 2001. incompleto
9. Euratom directive 97/43. Referência incompleta, sugiro :
COUNCIL DIRECTIVE 97/43/EURATOM of 30 June 1997 on health protection of individuals against the dangers of ionizing radiation in relation to medical exposure…, disponivel em
http://ec.europa.eu/energy/nuclear/radioprotection/doc/legislation/9743_en.pdf
10. Picano E. Stress echocardiography in hypertrophic cardiomyopathy. In Picano E.ed. Stress echocardiography. 5th Edition. Springer-Verlag Berlin Heidelberg. 2009:479-486.
11. European Comission Medical Imaging Guidelines (2001).
12. Euratom directive 97/43.
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