A pandemia voltou a atingir um pico e os hospitais ressentiram-se. A pesar desta linhagem do SARS-CoV-2 ser menos grave, o índice de transmissibilidade é grande. Falámos com Anabela Oliveira, responsável da urgência do CHULN para saber como têm sido os últimos dias neste serviço.
Atualmente a ómicron é a variante predominante do vírus Covid-19, em circulação em território nacional. Mas a capacidade do vírus é de tal forma extraordinária que, dentro da variante, houve várias adaptações e atualmente a BA.5 é responsável pela maioria dos novos casos em circulação. Uma capacidade grande de transmissão, mas com uma expressão da doença menos acentuada, são as características mais visíveis da “nova fórmula” deste vírus, que não dá descanso à comunidade em geral e aos profissionais de saúde, em particular. Para nos dar um retrato da situação atual no serviço de urgências, falámos com Anabela Oliveira, diretora deste serviço no Hospital de Santa Maria.
Mais de dois anos depois do aparecimento do vírus SARS-Cov-2, continuamos a ter de lidar com as várias variantes e linhagens que, entretanto, têm vindo a aparecer. Com uma grande capacidade de adaptação, o vírus continua a manifestar-se e a ser motivo de preocupação. A ómicron, a variante predominante atualmente, vai agora na linhagem BA.5 e isto significa que tem conseguido adaptar-se de forma a ultrapassar a barreira de anticorpos criada, quer pelas vacinas, quer pela imunidade criada por quem já teve a doença, a chamada imunidade celular. E apesar da enorme capacidade de transmissibilidade, a verdade é que a manifestação da doença é agora menos acentuada.
Os números da infeção têm vindo a aumentar desde a semana a passada, mas a realidade de hoje é bem diferente da que se vivia há dois anos. Anabela Oliveira, diretora do serviço de urgência do Hospital de Santa Maria traça o quadro atual; “nós que estamos no terreno, percebemos perfeitamente que há muita diferença. Atualmente, a expressão de doença grave é francamente menor,” mas ainda assim, os números são altos. “Desde o dia 13 de maio que houve um aumento com situações de internamento que são positivos, a posteriori quando é feito o rastreio.” Isto leva a que as camas disponíveis, 21 atualmente, acabem por ficar ocupadas com estes doentes, tornando difícil receber mais casos nas urgências. “No fim de semana tivemos de pedir para não encaminharem mais doentes, sobretudo de outras áreas de residência, porque tínhamos sobrelotação do serviço.”
O cenário na urgência neste momento é muito diversificado; "Há muitas tipologias de doença: ortopédicas, psiquiátricas e idosos” que foi a razão que os levou à urgência, “mas o facto de estarem positivos, condiciona o seu tratamento, porque não há sitio onde os pôr", e acabam por se manter na urgência, ocupando as camas que fazem falta para este serviço.
A par do aumento de infetados a dar entrada nos hospitais junta-se a ausência de alguns profissionais de saúde que contraíram a doença, dando origem áquilo a que chama “a combinação perfeita para o caos”.
Realidade atual diferente do ano passado
Apesar do número de internamentos com SARS-CoV-2 ser alta, comparada com o ano passado, a realidade é muito diferente. “A maioria dos doentes não tem pneumonia à SARS-CoV-2”, muito embora manifestem sintomas associados como febre e tosse. Mesmo os idosos, “é espantoso vê-los sem terem expressão da doença.” Ao contrário do ano passado “em que tiveram manifestação grave e faleceram. Foi um flagelo.”
Mas a preocupação com os mais idosos mantem-se porque, "têm muitas patologias; doenças cardíacas, insuficiência respiratória e o SARS-CoV-2 condiciona a uma evolução desfavorável” destas doenças.
Houve uma grande adaptação do Hospital no momento mais critico da Covid-19 para fazer face ao número crescente de doentes e atualmente, "mantemos duas enfermarias na Medicina I e um II que estão dedicadas a doentes com o SARS-CoV-2, mas agora essas espaços não chegam para a avalanche de casos, porque em simultâneo houve afluência de outros doentes e temos de ter capacidade para os internar.”
Após mais de 2 anos a lidar com um vírus que não para de se adaptar e não dá tréguas, a verdade é que “estamos muito cansados destas dinâmicas, e concretizá-las no terreno nem sempre é fácil, mas temos de ter flexibilidade para nos adaptarmos.”
Os números de infetados continuam a aumentar, mas segundo os matemáticos e os investigadores que acompanham a evolução epidemiológica, já atingimos o pico.
Apesar das características serem muito diferentes das de 2020, “já não devíamos estar a viver isto outra vez,” conclui Anabela Oliveira.
Números da infeção
O número mais elevado de casos diários foi reportado a 16 de maio; 38.448 infetados. É preciso recuar até janeiro para termos números tão altos de infeção.
Quanto ao número de mortes foram registados mais de 30 óbitos entre os dias 20 e 23 de maio, consecutivamente. De acordo com um artigo do "Notícias ao minuto" de dia 24, nas últimas 24 horas tínhamos 37 mortes e o record foi batido no dia anterior, com 39 vítimas mortais, apesar de apenas 9821 testes terem dado positivo. E o "apenas" é aqui utilizado porque durante essa semana só num dia foram registados 36.143 casos de infeção, de acordo com o mesmo jornal.
Consequências da pandemia na economia
A par das consequências na saúde pública e na gestão do Serviço Nacional de Saúde (SNS) há ainda as consequências na economia portuguesa. Henrique Oliveira, matemático, em entrevista ao canal CNN Portugal dava conta do número de horas de trabalho perdidas e das consequências que isso tem no PIB do país. “Com uma média de 30 mil casos diários, ao fim de uma semana dá 210 mil casos. Assumindo que metade sejam indivíduos ativos, dá 105 mil pessoas que durante 7 dias ficaram sem trabalhar. Contas feitas chega-se a 30 milhões de horas perdidas com baixas por covid. “É muito dinheiro na economia portuguesa que se está a perder,” conclui.
O regresso dos testes nas farmácias
O uso da máscara deixou de ser obrigatório em abril, deixando de fora algumas exceções, que visam a salvaguarda dos mais vulneráveis. No entanto, o aumento dos casos diários, trouxe de regresso os testes feitos em farmácias, comparticipados pelo Governo, mas mediante prescrição médica. Para já ainda não estão previstas medidas restritivas. O bom senso deve imperar.
Dora Estevens Guerreiro
Equipa Editorial