É no Verão e principalmente nos países tropicais que se manifestam o maior número destas doenças como a febre amarela, o dengue ou o zika, entre outras. Nestas zonas, apesar de haver sempre a necessidade de cuidados e comportamentos preventivos contra estas doenças (como a eliminação de focos de mosquitos nas habitações, o uso de repelentes, programas de planeamento que permitem apoio nutritivo contribuindo para um maior reforço e resistência do organismo, programas de vacinação a nível comunitário e algumas vacinas para doenças tropicais negligenciadas), é imprescindível nesta época uma maior atenção para com as pessoas mais vulneráveis (idosos, crianças de tenra idade e grávidas) que podem sofrer destas doenças de uma forma mais crítica, tomando nestas situações uma atenção redobrada aos vários sintomas que poderão surgir e procurando ajuda médica imediata.
Sabe-se que as doenças apelidadas de “tropicais” já eram referidas em documentos médicos desde o século XIX. Esta designação foi-se estabelecendo à medida que eram identificados os microrganismos causadores dessas doenças e de como decorriam os seus contágios.
Ao longo dos séculos da expansão colonizadora realizada por vários países, como os Estados Unidos da América, a França ou a Inglaterra, dirigida maioritariamente para as zonas do Oceano Pacifico e para as Caraíbas, onde foram descobertos recursos até então desconhecidos e doenças estranhas para o mundo médico de então.
Como estas novas colónias se situavam nos trópicos, as doenças aí encontradas foram apelidadas de “doenças tropicais”.
Para melhorar o estudo destas doenças foram fundadas algumas sociedades médicas como a London School of Hygiene and Tropical Medicine fundada por Patrick Manson, em 1899, e The Society of Tropical Medicine of Philadelphia que passou a ser denominada a partir de 1903 por American Society of Tropical Medicine, ambas contribuíram para que a designação “doenças tropicais” se afirmasse.
Alguns cientistas oriundos dos trópicos recusavam esta denominação por considerarem que podia subentender “alguma maldição ou fatalidade biogeográfica”.
No início do século XX verificaram-se duas correntes opostas quanto à origem das “doenças tropicais”, os que referiam que “são doenças de populações colonizadas, exploradas, miseráveis, que por acaso se concentram nos trópicos” e os que defendiam que “são doenças de regiões insalubres, caniculares, sujas e propícias a todas as formas de doenças estranhas ao mundo civilizado”.
No entanto, hoje sabemos que muito provavelmente as referidas “doenças tropicais” são o resultado do “subdesenvolvimento, consequência tardia do colonialismo”, mas também por “certa fatalidade tropical, consequência da heterogeneidade das evoluções geológica e biológica”. A ciência refere que de uma forma geral todas as enfermidades de que o homem padece são caraterizadas como doenças tropicais (exceto todas as outras doenças que foram surgindo mais tarde), dado que a espécie humana teve origem nos trópicos.
As doenças tropicais encontram-se presentes em cerca de centena e meia de países, e atingem cerca de um bilião de seres humanos, afetando mais severamente as regiões tropicais, onde se concentram os países mais desprotegidos e em vias de desenvolvimento, causando nas populações sofrimento e deficiências.
Estas patologias progridem devido a dois fatores predominantes: ambientais e sociais. Estas doenças infeciosas são causadas por vírus, bactérias e protozoários, que se encontram nas regiões tropicais do globo, que por serem quentes e húmidas, encontram um habitat ideal para a sua propagação em comparação com as zonas de clima temperado, aliado à falta de saneamento e de acesso a água potável, que predominam nos países pobres.
Estas situações provocam condições precárias tanto nas pessoas ao nível do desenvolvimento económico e social (baixo nível de escolarização e intelectual das crianças, desenvolvimento humano, redução do trabalho e desigualdade entre os seus pares), como aos próprios países afetados.
A Organização Mundial de Saúde (OMS) refere as “doenças tropicais” como “doenças negligenciadas” por lhes terem sido atribuídas poucos investimentos. Esta falta de apoio aos cientistas originou pouca evolução nas investigações e possíveis resoluções.
Estas enfermidades são um grupo de doenças infeciosas endêmicas que se manifestam em regiões tropicais, especialmente entre as populações pobres da África, Ásia e América Latina, sendo o Brasil o país que reúne todas as doenças que constam na lista de doenças tropicais, realizada pela OMS.
São várias as doenças tropicais negligenciadas que integram esta lista, como a doença de Chagas, dengue, tripanossomíase africana (doença do sono), leishmaniose, hanseníase, bouba, febre amarela e leptospirose, entre outras. A tuberculose e a malária, embora não sejam consideradas doenças negligenciadas (de acordo com os recursos que lhes têm sido atribuídos) fazem parte deste núcleo por incidirem em várias regiões tropicais.
No entanto, tem-se verificado com maior frequência casos de doenças tropicais nos EUA. As autoridades de saúde apontam como causas para este problema, as alterações climáticas, um acréscimo de viagens para países onde estas doenças são comuns e a carência de vacinas.
Nos últimos dez anos foram realizadas várias diligências com a intenção de reduzirem os riscos, tanto no número de países como no número de pessoas afetadas, bem como na eliminação de pelo menos um tipo destas doenças.
Em 2012, com a Declaração de Londres sobre Doenças Tropicais Negligenciadas, realizou-se um programa para que até ao ano 2020 fosse possível controlar, eliminar ou erradicar, dez daquelas doenças, no entanto os objetivos propostos não foram concretizados, concluiu-se de que era necessário fazer mais e melhores atividades contra as Doenças Tropicais.
No dia 30 de janeiro de 2020, foi comemorado pela primeira vez o Dia Mundial das Doenças Tropicais Negligenciadas por mais de 280 instituições de pesquisa, empresas e organizações civis, de forma a alertar para a urgência de se reunirem esforços e investimentos, por forma a lutar contra um dos maiores problemas de saúde pública que provoca consequências muito graves tanto a nível social como a nível económico.
Tem-se constatado ao longo dos anos que os investimentos para a pesquisa e desenvolvimento dos produtos para combater estas doenças têm diminuído drasticamente. Segundo o relatório do G-Finder 2019, o investimento referente a 2018 foi quase 10% inferior ao de 2009. No século atual verifica-se que nenhum dos medicamentos que, entretanto chegaram ao mercado farmacêutico é indicado para combater qualquer uma das 20 doenças tropicais negligenciadas.
Em 2018, o Brasil apresentou mais de 28 mil novos casos da doença de hanseníase. Segundo o mesmo relatório entre 2007 e 2017 o financiamento caiu mais de 40% em todas as áreas e para esta doença houve uma queda de 95%.
Atualmente crê-se que cerca de 1 a 1,7 bilião de pessoas em todo o mundo seja afetado pelas doenças tropicais negligenciadas, que nem sempre provocam a morte, estimando-se que cerca de 19 milhões dos pacientes afetados por estas enfermidades sofram de doenças com invalidez ou morte prematura.
Recentemente, após ter sido efetuado um estudo com os países-membros da OMS (parceiros da agência, comunidade científica e acadêmicos), esta organização sugeriu o Plano “Acabando com a Negligência para Alcançar os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável”, composto por várias ações e programas a realizar até 2030. Este Plano tem como objetivo eliminar o sofrimento causado por este tipo de doenças, através da redução dos custos referentes aos cuidados de saúde assim como na introdução de tratamentos mais eficientes.
Em 1999, a diretora-geral da OMS, Dra. Gro Harlem Brundtland inaugurou na sede da OMS, em Genebra, um monumento por altura do 25ª aniversário do Programa de luta contra a oncocercose no continente africano.
Por isso, até ao ano de 2030, para que se atinja a meta a que se propõe (todas as zonas classificadas como endémicas terem acesso integral a água potável, saneamento e higiene), a OMS sugere com “urgência de novos paradigmas e ações multilaterais de cooperação em educação, ciência, saúde, tecnologia” para que haja uma redução de 90% no número de pessoas afetadas por doenças tropicais, que necessitam de tratamento; a extinção das doenças a dracunliasis e a bouba, que afeta a pele e os ossos; a diminuição em 75% da deficiência ajustada pelos anos de vida associada às doenças tropicais negligenciadas como a leishmaniose ou a dengue entre outras; e que pelo menos uma centena de países tenham a obrigação de extinguir no mínimo uma das doenças tropicais.
Esta instituição propõe ainda que após a conclusão do Plano, os dados relacionados com o género sejam separados, visto que a grande maioria das vítimas das doenças tropicais são do sexo feminino.
Tedros Ghebreyesus, diretor-geral da OMS, referiu em relação às doenças tropicais negligenciadas e sua erradicação, que “para acabar com o flagelo das doenças tropicais negligenciadas, é preciso mudar com urgência a abordagem atual e injetar nova energia na prevenção e tratamento”.
Referências bibliográficas:
- Conheça as principais doenças tropicais negligenciadas. Disponível em: http://www.fiocruz.br/ioc/cgi/cgilua.exe/sys/start.htm?infoid=1585&sid=32. [Acedido em 12-07-2021]
- Doenças tropicais. Disponível em: Doenças tropicais - doenças negligenciadas - InfoEscola. [Acedido em 12-07-2021]
- A luta contra as doenças tropicais negligenciadas continua. Disponível em: https://saude.abril.com.br/blog/com-a-palavra/a-luta-contra-as-doencas-tropicais-negligenciadas-continua/. [Acedido em 15-07-2021]
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OMS divulga plano de 10 anos para acabar com doenças tropicais negligenciadas. Disponível em: https://news.un.org/pt/story/2021/02/1740092. [Acedido em 12-07-2021]
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Que são doenças tropicais. Disponível em: https://www.news-medical.net/health/What-are-Tropical-Diseases-(Portuguese).aspx. [Acedido em 12-07-2021]
Lurdes Barata
Área de Biblioteca e Informação
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