Parto inédito com grávida em coma por Covid-19
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Diogo Ayres de Campos, Diretor de Obstetrícia de Santa Maria e Professor da FMUL foi o responsável por parto inédito com grávida em coma por Covid-19

 

Como é que é possível fazer um parto em coma, a uma mulher infetada por SARS CoV-2? O Professor Diogo Ayres de Campos e a sua equipa explicam todos os pormenores numa grande reportagem do Observador, que nos conduz aos bastidores de uma operação inédita.

registo de nascimento de recém-nascido
Créditos da imagem: Observador

 

O nascimento, raro no mundo, ocorreu numa circunstância igualmente invulgar, com a grávida em coma induzido, ligada a um ventilador e pulmão artificial.

Os médicos do Hospital de Santa Maria responsáveis pelo parto, e os pais que protagonizaram esta história singular no mundo, contam agora, ao pormenor, como tudo aconteceu e revelam as principais dificuldades e também, receios que sentiram antes e depois de uma decisão, sobre a qual pesava a incerteza de um final feliz.

Em entrevista ao Observador, o Prof. Diogo Ayres de Campos, Diretor de Obstetrícia do Hospital Santa Maria, revelou que partiu de si a difícil decisão sobre o momento em que se faria a cesariana. Não havia certezas se mãe e filho iriam sobreviver, já que o risco de hemorragia era muito elevado, mas esperar mais tempo podia ser um risco para ambos, explicou em entrevista ao Observador.

“Dentro do possível, fomos adiando a decisão durante 10 dias, com uma pressão muito grande de toda a equipa, porque estava nervosa”, revelou, salientando a “pouquíssima experiência com grávidas em ECMO e grávidas em ECMO com Covid-19 a nível mundial”.

Com a “pressão diária” para o término da gravidez, a opção foi “ir pelo seguro, em termos de oxigenação do bebé”. “Pode ter mais algum risco de complicações, mas pelo menos não tem uma complicação grave «in útero»”, afirmou o Professor na reportagem, que mostra a sala cirúrgica utilizada para grávidas com SARS CoV-2.

Elisângela foi infetada às 27 semanas de gestação. Acordou do coma quando o filho tinha já 16 dias, altura em que o viu pela primeira vez numa videochamada.

“O vírus atingiu a família em outubro, na sequência de um gesto de altruísmo e de uma imprudência. O pai [Adalberto] recebeu um telefonema de um amigo doente, a perguntar se podia ir à farmácia comprar-lhe medicamentos, e disse-lhe que sim. Mas entrou em casa do amigo sem pôr a máscara. A mulher pressentiu logo que tinha sido um erro e disse-lho: "Estás feito, já estás infetado. Se ele tem febre há três dias e não baixa, esquece, já está...", pode ler-se na reportagem do Observador.

Transferida para o Hospital de Santa Maria por falta de vagas no hospital Beatriz Ângelo, em Loures, onde deu entrada primeiramente, os médicos perceberam que tinham em mãos um caso complexo e um desafio muito sério. Não obstante a ausência de fatores de risco e tratar-se de uma mulher jovem e saudável, a situação de Elisângela agravou-se muito rapidamente, obrigando os médicos a ligá-la a um ventilador.

homem segura bebé ao colo sob olhar atento da mulher
Adalberto com o filho ao colo sob o olhar de Elisângela, no dia em que tiveram alta do Hospital Santa Maria, a 8 de janeiro<br /> Créditos da imagem: Observador

 

De acordo com a literatura científica, há cerca de cinco dezenas de casos em todo o mundo de aplicação de ECMO em grávidas, cita o Observador. Contudo, todos esses casos foram verificados antes da pandemia de Covid-19 e em diferentes períodos de gestação.

No contexto da atual pandemia, foi registado um caso na Polónia em que a mãe infetada deu à luz também ligada ao aparelho. De facto, pode ter havido outros casos semelhantes ao de Elisângela, mas não foram ainda divulgados publicamente. E por se tratar de uma situação rara a nível mundial, os especialistas de Santa Maria preparam agora um artigo científico com o intuito de servir de exemplo noutros países.

Saiba mais detalhes sobre esta operação única no mundo e conheça, AQUI, a incrível história do bebé Neves.