Os nossos, na primeira pessoa (Parte IV)
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“O meu nome é Vasco Lança e completei agora o meu primeiro ano na Faculdade de Medicina. Sendo eu natural de Beja tive que me tornar “deslocado” para embarcar neste desafio, neste sonho de, um dia, vir a ser médico. Felizmente, a minha ida para Lisboa foi bastante fácil, uma vez que, tendo eu dois irmãos mais velhos, também eles a estudar na FML, bastou-me levar as minhas coisas e integrar as rotinas diárias da nossa casa. Embora para mim tenha sido uma questão muito acessível de resolver, muitos dos estudantes universitários não têm esta sorte. O ser “deslocado” pode parecer assustador, ao início, mas o misto de adrenalina, êxtase e vontade de explorar o que é novo fazem desta experiência algo único.”

três rapazes abraçados a pousar para fotografia em frente de Hospital
Da esquerda para a direita: Pedro, Vasco, Miguel. São os meus dois irmãos. O Pedro passou agora para o 5º ano e o Miguel acabou o curso este ano e está a preparar-se para a PNA.

 

Como foi este primeiro ano em que uma pandemia mudou a realidade do presencial na Faculdade, para o virtual. Como correu? Onde passaste a maior parte do tempo? Era assim que esperavas que fosse o 1º ano?​

“Este primeiro ano foi, para todos nós, algo atípico. A pandemia marcou os nossos tempos, marcou a entrada para a faculdade, marcou o nosso primeiro ano de caloiros, marcou as nossas aulas, as nossas vivências, as nossas experiências, marcou tudo! Sermos os pioneiros destes descobrimentos é algo que não é fácil, mas o encarar desta nova realidade é algo que, do meu ponto de vista, só depende de nós. Que ia ser diferente todos sabíamos. Mas a bola ficou do nosso lado. “Vais condenar este primeiro ano e viver em angústia? Ou vais fazer deste ano um ano incrível, apesar de tudo?” – esta era a pergunta que eu me fazia a mim mesmo. Nem sempre foi fácil escolher a 2ª opção, devo reconhecer. Mas, se há coisa que aprendi este ano, é que a vida nem sempre vai ser fácil, nem sempre se vão abrir todas as portas para nós, nem sempre vamos ver o nosso esforço reconhecido, nem sempre vai correr tudo bem; mas aprendi também que com um sorriso na cara tudo fica mais leve. Aprendi ainda a dar ainda mais valor aos pequenos gestos, aos pequenos encontros, às pequenas conversas, às pequenas ajudas, porque um ano passa e os grandes momentos são esporádicos, mas os pequenos momentos são inúmeros...

A pandemia mudou a realidade do presencial, na Faculdade, para o virtual. Para mim e para muitos dos meus colegas, esta não foi uma mudança: foi um conhecer uma realidade, a única diferença é que esta era desconhecida por toda a gente. Enquanto que para os alunos mais velhos teve que haver uma adaptação, para nós, alunos de 1º ano, teve que haver uma aprendizagem de raiz. Rapidamente percebi que estudar muito tempo em casa, para mim, não é a melhor opção. Juntamente com os meus irmãos e alguns amigos, adotei as salas de estudo como opção primária para o meu estudo. Caleidoscópio, Piso 6, Anatomia, Piso 3 e Aquários (e até a Cantina, quando já não havia lugares em lado nenhum), foram as minhas segundas casas.

O que eu esperava deste primeiro ano torna-se uma questão um pouco relativa. Conhecia já bastantes histórias devido aos meus irmãos e, por isso, num ano “normal” saberia o que esperar. Mas sendo este o ano que todos sabemos que foi, procurei sempre não criar expetativas (talvez seja uma estratégia algo defensiva, porque quanto mais se soube, maior é a queda).”

 

Conseguiste criar uma amizade com os novos colegas? Como se foram conhecendo? Ajudou já ter irmãos na Faculdade?

“A nível pessoal e social sinto que foi todo um novo mundo que tive de descobrir. Tive que me adaptar, ou mesmo reinventar, porque estava a conhecer pessoas novas, muitas delas em que a única coisa em comum era a faculdade onde estudávamos. Conhecer pessoas do 1º ano era um constante desafio, porque, com a maior parte, víamo-nos 1 vez por semana. Tenho a sorte de poder dizer que fiz alguns amigos com os quais falo regularmente e com os quais sinto que posso mesmo contar! Passaram de colegas a amigos e essa transição dá toda uma nova perspetiva a cada uma das relações interpessoais.

Ter irmãos na faculdade foi, sem dúvida, uma grande bênção. Não é possível dizer por palavras o quão bom foi. Não o digo pela facilidade que tinha em esclarecer dúvidas, pedir informações ou mesmo por todos os materiais. Digo-o sim por todas as conversas, por todas as pausas para café, por todas as (intermináveis) sessões de estudo, por todos os momentos que partilhámos e, sobretudo, pela amabilidade como cada um deles me acolheu no seu núcleo, no seu grupo de amigos, no seu grupo de estudo. Essa atitude deu-me um conforto e uma segurança que não consigo descrever. Obrigado ao Miguel e ao Pedro por isso. Foi a minha maior sorte neste 1º ano, sem pensar duas vezes.”

 

“Aos alunos do futuro 1º ano, só quero desejar-vos um ano cheio de felicidade e de muita aprendizagem. Deem valor aos pequenos momentos. Lembrem-se de dar prioridade àquilo que vos faz felizes e de se empenharem ao máximo. O vosso 1º ano só depende de vocês. Let the journey begin!”