Espaço Ciência
Como os eventos inflamatórios iniciais afectam as nano-propriedades ósseas
Como os eventos inflamatórios iniciais afectam as nano-propriedades ósseas no início da artrite reumatóide
Resumo
A artrite reumatóide é uma doença auto-imune inflamatória crónica que se caracteriza principalmente pela destruição das articulações e dos ossos. Com base em resultados anteriores num modelo de artrite de ratinho que sugerem um efeito directo da inflamação no osso nas propriedades mecânicas do osso e renovação e organização de colagénio, existe a hipótese de os passos iniciais conducentes a fragilidade óssea serem determinados pelas alterações precoces na organização de colagénio tipo I capazes de interferir com as propriedades intrínsecas do tecido ósseo. Estas são nano-propriedades do osso, independentes da arquitectura óssea global, e dependem directamente da forma como as células ósseas, o colagénio e os cristais de cálcio interagem. O objectivo principal deste projecto é identificar, na fase muito precoce da artrite e recorrendo a um modelo animal, as principais alterações na nano estrutura óssea. Além disso, a presença dessas perturbações será testada, numa fase posterior da artrite, em amostras de osso humano com AR.
Objectivos
Na nossa Unidade de Investigação em Reumatologia temos vindo a desenvolver investigação translacional na área da artrite reumatóide e osso. O objectivo principal do meu projecto é verificar, numa fase muito precoce da artrite, a forma como a inflamação afecta a actividade celular do osso e a organização de colagénio de tipo I e a sua interferência com as propriedades intrínsecas do tecido ósseo
Objectivo específico 1: Verificarei especificamente a influência da artrite no seguinte: a) microestrutura do osso; b) grau de mineralização e distribuição da mineralização; c) disposição de moléculas de colagénio e cristais; d) propriedades mecânicas ao nível dos tecidos; e) actividade celular.
Objectivo específico 2: Usando um fármaco antagonista do TNF, verificarei se a intervenção precoce irá revogar os efeitos verificados no objectivo 1.
Objectivo específico 3: Utilizando a informação recolhida com o modelo animal, identificarei os distúrbios ósseos que realmente ocorrem em pacientes com AR, e avaliarei amostras de cirurgia das articulações usando os mesmos procedimentos técnicos acima referidos.
A identificação precoce de distúrbios da célula óssea e colagénio como primeiro passo para o reconhecimento de insuficiência óssea e das articulações pode mudar a estratégia de gestão desta doença, acentuando a necessidade de controlo precoce da actividade inflamatória assim como a importância em controlar as propriedades intrínsecas dos ossos, após o início da doença, através de abordagens inovadoras de tratamento específico dos ossos que poderiam basear-se nos conceitos desenvolvidos neste projecto.
Estudos em modelos animais
Neste projecto utilizarei o modelo de artrite induzida por adjuvante em ratos para estudar os efeitos da inflamação no osso na fase muito precoce da artrite.
As conclusões deste grupo de artrite serão comparadas com um grupo de controlo sem artrite induzida.
Serão colhidas amostras de sangue para medir os marcadores de remodelação óssea (P1NP e CTX) e os níveis de citoquinas (TNF, RANKL, OPG, IL1, IL17 e IL6).
Amostras de osso serão submetidas a vários procedimentos técnicos;
a) realização de micro tomografia computadorizada (micro-CT). Baseado em centenas de visualizações angulares adquiridas enquanto a amostra gira, permitindo a obtenção de uma imagem 3D, obter-se-á micro estrutura óssea em conformidade com os parâmetros estabelecidos pela American Society for Bone and Mineral Research.
b) A estrutural óssea total e o grau de mineralização e osteóide serão igualmente avaliados através de histologia e histomorfometria convencional.
c) O padrão de distribuição de mineralização será complementado por imagens quantitativas de electrões retro-difundidos.
e) A estrutura e disposição das moléculas de colagénio e a distribuição de cristais serão avaliadas por microscopia de força atómica (MFA). A nanoidentação testará as características mecânicas do tecido ósseo.
f) A função celular óssea e a expressão de RNA serão analisados.
Será feita uma intervenção terapêutica precoce com um fármaco antagonista de TNF para avaliar a consequência inicial deste tratamento nos efeitos da artrite no osso que caracterizámos anteriormente.
Avaliação de amostras humanas
Aplicar-se-ão os mesmos procedimentos a amostras de osso retiradas a pacientes com artrite reumatóide submetidos a cirurgia de substituição total da anca.
Nos últimos 4 anos, a nossa unidade estabeleceu uma colaboração com o Departamento de Ortopedia do Hospital de Santa Maria através da qual todas as cabeças femorais extraídas de pacientes submetidos a cirurgia de substituição de articulação nos são enviadas para investigação. Para este projecto, todos os pacientes submetidos a artroplastia no Departamento de Ortopedia do HSM serão avaliados para potencial inclusão.
Após darem o seu consentimento informado, os pacientes serão entrevistados a fim de recolher informação clínica de acordo com um questionário previamente publicado, e serão submetidos a uma densitometria óssea por absorção de raios-X de dupla energia (DXA). Serão recolhidas amostras de sangue e urina para determinar os parâmetros laboratoriais metabólicos ósseos, marcadores inflamatórios e de remodelação óssea.
Com base nas estatísticas do Departamento de Ortopedia e no nosso trabalho prévio de colaboração, esperamos recrutar cerca de 300 cabeças femorais, das quais 20 provenientes de pacientes com AR. A avaliação clínica de pacientes com AR, o Índice de Actividade da Doença e o Questionário de Avaliação de Saúde serão realizados. O factor reumatóide (FR) e anticorpos contra peptídeos citrulinados cíclicos (anti-CCP) serão determinados. Do resto da amostra seleccionaremos um grupo de controlo de pacientes submetidos a cirurgia de substituição da anca devido a osteoartrite (uma condição não inflamatória, não associada à osteoporose), pareados por sexo e idade com o grupo com AR, e que apresentem densidade mineral óssea (DMO) normal e ausência de factores de risco de fractura. A existência de qualquer doença óssea ou inflamatória constituirá critério de exclusão. Esperamos recrutar cerca de 20 destas pessoas do grupo de controlo.
Dadas as limitações óbvias para a obtenção de um verdadeiro controlo saudável e considerando que as avaliações que conduziremos não podem ser feitas em amostras de cadáveres, esta apresenta-se como a melhor forma possível de estabelecer uma comparação entre osso com AR e osso não afectado nem por inflamação nem por doença metabólica. Será feita uma segunda comparação entre o grupo com AR e um grupo de pacientes submetidos a artroplastia devido a fractura por fragilidade da anca pareados em termos de sexo, idade, factores de risco de fractura e DMO. Esperamos recrutar cerca de 20 destas pessoas com osteoporose. Este grupo permitirá igualmente comparar amostras de AR com uma população correspondente em risco de fractura em que a única diferença reside na ausência de doença inflamatória.
Amostras de osso destes 3 grupos serão sujeitas aos procedimentos técnicos descritos acima.
Em resumo, espero que este trabalho possa constituir um contributo importante para uma doença frequente e debilitante através da identificação dos mecanismos iniciais de colapso ósseo na AR, e fornecer novos alvos potenciais para tratamentos futuros, cumprindo assim uma necessidade médica ainda não satisfeita.
Bruno Vidal
Estudante de doutoramento
Resumo
A artrite reumatóide é uma doença auto-imune inflamatória crónica que se caracteriza principalmente pela destruição das articulações e dos ossos. Com base em resultados anteriores num modelo de artrite de ratinho que sugerem um efeito directo da inflamação no osso nas propriedades mecânicas do osso e renovação e organização de colagénio, existe a hipótese de os passos iniciais conducentes a fragilidade óssea serem determinados pelas alterações precoces na organização de colagénio tipo I capazes de interferir com as propriedades intrínsecas do tecido ósseo. Estas são nano-propriedades do osso, independentes da arquitectura óssea global, e dependem directamente da forma como as células ósseas, o colagénio e os cristais de cálcio interagem. O objectivo principal deste projecto é identificar, na fase muito precoce da artrite e recorrendo a um modelo animal, as principais alterações na nano estrutura óssea. Além disso, a presença dessas perturbações será testada, numa fase posterior da artrite, em amostras de osso humano com AR.
Objectivos
Na nossa Unidade de Investigação em Reumatologia temos vindo a desenvolver investigação translacional na área da artrite reumatóide e osso. O objectivo principal do meu projecto é verificar, numa fase muito precoce da artrite, a forma como a inflamação afecta a actividade celular do osso e a organização de colagénio de tipo I e a sua interferência com as propriedades intrínsecas do tecido ósseo
Objectivo específico 1: Verificarei especificamente a influência da artrite no seguinte: a) microestrutura do osso; b) grau de mineralização e distribuição da mineralização; c) disposição de moléculas de colagénio e cristais; d) propriedades mecânicas ao nível dos tecidos; e) actividade celular.
Objectivo específico 2: Usando um fármaco antagonista do TNF, verificarei se a intervenção precoce irá revogar os efeitos verificados no objectivo 1.
Objectivo específico 3: Utilizando a informação recolhida com o modelo animal, identificarei os distúrbios ósseos que realmente ocorrem em pacientes com AR, e avaliarei amostras de cirurgia das articulações usando os mesmos procedimentos técnicos acima referidos.
A identificação precoce de distúrbios da célula óssea e colagénio como primeiro passo para o reconhecimento de insuficiência óssea e das articulações pode mudar a estratégia de gestão desta doença, acentuando a necessidade de controlo precoce da actividade inflamatória assim como a importância em controlar as propriedades intrínsecas dos ossos, após o início da doença, através de abordagens inovadoras de tratamento específico dos ossos que poderiam basear-se nos conceitos desenvolvidos neste projecto.
Estudos em modelos animais
Neste projecto utilizarei o modelo de artrite induzida por adjuvante em ratos para estudar os efeitos da inflamação no osso na fase muito precoce da artrite.
As conclusões deste grupo de artrite serão comparadas com um grupo de controlo sem artrite induzida.
Serão colhidas amostras de sangue para medir os marcadores de remodelação óssea (P1NP e CTX) e os níveis de citoquinas (TNF, RANKL, OPG, IL1, IL17 e IL6).
Amostras de osso serão submetidas a vários procedimentos técnicos;
a) realização de micro tomografia computadorizada (micro-CT). Baseado em centenas de visualizações angulares adquiridas enquanto a amostra gira, permitindo a obtenção de uma imagem 3D, obter-se-á micro estrutura óssea em conformidade com os parâmetros estabelecidos pela American Society for Bone and Mineral Research.
b) A estrutural óssea total e o grau de mineralização e osteóide serão igualmente avaliados através de histologia e histomorfometria convencional.
c) O padrão de distribuição de mineralização será complementado por imagens quantitativas de electrões retro-difundidos.
e) A estrutura e disposição das moléculas de colagénio e a distribuição de cristais serão avaliadas por microscopia de força atómica (MFA). A nanoidentação testará as características mecânicas do tecido ósseo.
f) A função celular óssea e a expressão de RNA serão analisados.
Será feita uma intervenção terapêutica precoce com um fármaco antagonista de TNF para avaliar a consequência inicial deste tratamento nos efeitos da artrite no osso que caracterizámos anteriormente.
Avaliação de amostras humanas
Aplicar-se-ão os mesmos procedimentos a amostras de osso retiradas a pacientes com artrite reumatóide submetidos a cirurgia de substituição total da anca.
Nos últimos 4 anos, a nossa unidade estabeleceu uma colaboração com o Departamento de Ortopedia do Hospital de Santa Maria através da qual todas as cabeças femorais extraídas de pacientes submetidos a cirurgia de substituição de articulação nos são enviadas para investigação. Para este projecto, todos os pacientes submetidos a artroplastia no Departamento de Ortopedia do HSM serão avaliados para potencial inclusão.
Após darem o seu consentimento informado, os pacientes serão entrevistados a fim de recolher informação clínica de acordo com um questionário previamente publicado, e serão submetidos a uma densitometria óssea por absorção de raios-X de dupla energia (DXA). Serão recolhidas amostras de sangue e urina para determinar os parâmetros laboratoriais metabólicos ósseos, marcadores inflamatórios e de remodelação óssea.
Com base nas estatísticas do Departamento de Ortopedia e no nosso trabalho prévio de colaboração, esperamos recrutar cerca de 300 cabeças femorais, das quais 20 provenientes de pacientes com AR. A avaliação clínica de pacientes com AR, o Índice de Actividade da Doença e o Questionário de Avaliação de Saúde serão realizados. O factor reumatóide (FR) e anticorpos contra peptídeos citrulinados cíclicos (anti-CCP) serão determinados. Do resto da amostra seleccionaremos um grupo de controlo de pacientes submetidos a cirurgia de substituição da anca devido a osteoartrite (uma condição não inflamatória, não associada à osteoporose), pareados por sexo e idade com o grupo com AR, e que apresentem densidade mineral óssea (DMO) normal e ausência de factores de risco de fractura. A existência de qualquer doença óssea ou inflamatória constituirá critério de exclusão. Esperamos recrutar cerca de 20 destas pessoas do grupo de controlo.
Dadas as limitações óbvias para a obtenção de um verdadeiro controlo saudável e considerando que as avaliações que conduziremos não podem ser feitas em amostras de cadáveres, esta apresenta-se como a melhor forma possível de estabelecer uma comparação entre osso com AR e osso não afectado nem por inflamação nem por doença metabólica. Será feita uma segunda comparação entre o grupo com AR e um grupo de pacientes submetidos a artroplastia devido a fractura por fragilidade da anca pareados em termos de sexo, idade, factores de risco de fractura e DMO. Esperamos recrutar cerca de 20 destas pessoas com osteoporose. Este grupo permitirá igualmente comparar amostras de AR com uma população correspondente em risco de fractura em que a única diferença reside na ausência de doença inflamatória.
Amostras de osso destes 3 grupos serão sujeitas aos procedimentos técnicos descritos acima.
Em resumo, espero que este trabalho possa constituir um contributo importante para uma doença frequente e debilitante através da identificação dos mecanismos iniciais de colapso ósseo na AR, e fornecer novos alvos potenciais para tratamentos futuros, cumprindo assim uma necessidade médica ainda não satisfeita.
Bruno Vidal
Estudante de doutoramento