Realizou-se, no passado dia 1 de Março, na Reitoria da Universidade de Lisboa (UL), o segundo evento sobre o lema “Conhecer para Intervir”, intitulado “Interpelando Bolonha e a Pedagogia na UL”, organizado pelo Conselho de Garantia da Qualidade e pelo Gabinete de Garantia da Qualidade (www.ul.pt). Quatro painéis de trabalho preencheram o dia, com os seguintes sub-temas: (1) Concepção e construção dos currículos de formação; (2) Formas de acompanhamento dos estudantes; (3) Relações entre aprendizagem e avaliação; (4) Introdução às práticas e competências profissionais. Conseguiu-se criar um espaço de debate entre oradores e participantes muito profícuo.
Em representação do Presidente do Conselho Pedagógico da Faculdade de Medicina da Universidade de Lisboa (FMUL) participei, com muito gosto, na primeira mesa redonda, descrevendo o processo de criação, concepção e implementação do Mestrado Integrado em Medicina (MIM), que relato em seguida.
Em 2006, com a devida antecedência, os professores regentes das disciplinas da Licenciatura em Medicina souberam, pelo Director da FMUL, Professor José Fernandes e Fernandes, que iria decorrer uma avaliação externa ao curriculum e que, para tal, seriam entrevistados por uma Comissão Ad-Hoc constituída pelos Professores Joe S. Gonnella, M.D., Ph.D. Jefferson Univ; M. Alistair Warren, Ph.D., Univ Sheffield; e Fernando H. Lopes da Silva, M.D., Ph.D. Univ Amsterdam. A Comissão Ad-Hoc concluiu, após a avaliação, que o modelo de curriculum em vigor nessa data não era sustentável e deixou um conjunto de recomendações. Posteriormente, o Professor José Fernandes e Fernandes convidou os regentes, os representantes dos alunos e os representantes da área das ciências da saúde da UL para uma reunião de anúncio do novo paradigma a ser desenvolvido para o ensino/aprendizagem da medicina. Realçou a necessidade de sermos competitivos, tanto a nível nacional como internacional, sem deixar de aludir à exigência ministerial de aumentar o numerus clausus, notando que o mesmo não era proporcional a um incremento orçamental mas sim a diminuição. Anunciou ainda a estratégia a ser seguida para a elaboração e construção do novo curriculum, que contemplava grupos de reflexão entre os regentes das diferentes áreas científicas para a criação de propostas conducentes à nova organização curricular. O Director da FMUL solicitou colaboração aos discentes para apresentarem abordagens de ensino/aprendizagem baseadas no novo paradigma. Este assentava nos pilares da integração dos conhecimentos, na aproximação entre ciências básicas e clínicas para desenvolver áreas de ensino, o qual se objectivava centrado no aluno. Do conjunto dos contributos que recebeu, definiu os objectivos educacionais do futuro médico e o modelo da nova organização curricular. Quanto aos primeiros, o futuro médico deve: ter sólida formação científica; ter capacidades para (i) a auto – aprendizagem, (ii) a escolha informada da carreira profissional, (iii) saber responder aos desafios da Saúde, (iv) actuar com ética e (v) “lifelong learning”; ter competências em comunicação; ter aptidões para trabalhar em equipa e integrar de forma útil e criativa os Sistemas de Saúde.
O novo modelo curricular do MIM é composto por unidades curriculares (UC), identificadas com numeração romana, designadas por Módulos Integradores das Disciplinas e Troncos Comuns, numa organização multidisciplinar horizontal e vertical de cooperação ciência básica / medicina clínica, em articulação com Troncos Opcionais. Em cada UC está estabelecido um sistema de integração de conhecimentos. A cada UC é atribuído um número de European Credit Transfer Sistem (ECTS) em função das horas de trabalho do discente (28h = 1ECTS).
O programa curricular é distribuído por 10 semestres (5 anos) e mais dois semestres de estágio clínico profissionalizante. Ao fim de 6 semestres é atribuído o grau de Licenciado em Estudos Básicos de Medicina. A implementação faseada do MIM, iniciou-se em 2007 para os 1º, 4º e 5º anos, em 2008 para o 2º ano e em 2009 para o 3º ano. Para o desenvolvimento e sucesso do novo modelo pedagógico inovador e ambicioso, o Director da FMUL criou, em 2007, para a avaliação interna, uma Comissão de Implementação e Acompanhamento da Reforma Curricular e para a avaliação externa, a Comissão Internacional - Comissão Ad-Hoc de Aconselhamento para a Reforma Curricular. A avaliação interna da Reforma Curricular é ainda efectuada a nível de (i) cada UC pelo Coordenador de Módulo, Tronco Comum e Tronco Opcional, (ii) da Coordenação Pedagógica de ano composta pelo coordenador pedagógico de ano, pelos docentes coordenadores e discentes da Comissão de Ano curricular, (iii) pelo Conselho Pedagógico e (iv) pelo Departamento de Educação Médica.
Nos anos de 2008 e 2009, o Gabinete de Planeamento e Avaliação (estrutura dependente do Director da FMUL) procedeu à avaliação da Reforma Curricular e à elaboração dos respectivos relatórios. No ano de 2010, o Conselho Pedagógico continuou essa missão.
Em 2009, a Comissão Internacional - Comissão Ad-Hoc de Aconselhamento para a Reforma Curricular veio à FMUL para avaliar. A análise sobre a evolução da reforma do currículo encontra-se descrita pelo Professor Lopes da Silva na news@fmul nº5, de Abril de 2009.
Da leitura do conjunto dos relatórios acima referidos, e que constituem o acervo da avaliação da Reforma Curricular, foi possível listar os pontos fortes, os pontos fracos, os constrangimentos e as oportunidades (ver aqui). Com esta análise final procurei dar o mote para a discussão de algumas das questões previamente anunciadas no programa do evento (ver aqui). Este momento proporcionou-me acrescentar outras vivências da FMUL associadas à formação pré-graduada, nomeadamente da mobilidade Programa ERASMUS, do Programa “Educação pela Ciência” (GAPIC) e dos protocolos com as Instituições Afiliadas.
Em conclusão, a Reforma Curricular conducente ao MIM, na FMUL, decorreu com uma avaliação inicial da Licenciatura em Medicina que levou à mudança, cuja organização se processou nos modos de comunicação top-down e bottom-up, que conduziu à implementação do novo currículo, cuja avaliação em acção origina ajustamentos para melhorar a qualidade.
Carlota Saldanha
carlotasaldanha@fm.ul.pt