Não há manhã que o cenário no céu seja diferente. Andorinhas e periquitos esvoaçantes desenham no céu manobras várias que nos levariam anos a apurar a técnica num caça da Força Aérea ou uma fração de segundos a imaginar-nos ser um pássaro e ver o chão de um patamar mais acima.
Tirar os pés do chão e ter a sensação de levitar é agora possível no Alter G, uma passadeira altamente sofisticada cuja capacidade permite retirar peso a quem nela andar. O desejo é simples, recriar o peso humano na lua e ter apenas 20% do peso real, ou ir até Marte e manter-se nos 40% desse mesmo peso. O Pedro é o estudante de Medicina que aceita o desafio de ser astronauta em Marte ou na lua, consoante Nelson Vinagre, professor de Motricidade Humana, reprograma a passadeira para que esta tenha mais ou menos percentagem cósmica. Engane-se quem pensa que esta passadeira é apenas aposta espacial, esta é uma forma avançada de tratar doentes em pós-operatório com diversas lesões musculares e ósseas, explica-me Nelson Vinagre, enquanto o Pedro continua a ser alvo de todos os olhares e flashes naquele espaço que é o último grande lançamento da Faculdade de Medicina da Universidade de Lisboa.
O CEMA – Centro de Estudos de Medicina Aeroespacial foi sonho acarinhado de duas mentes cujo voo alcança o Espaço, Edson Oliveira, neurocirurgião e assistente em Neuroanatomia e Neurocirurgia e Fausto Pinto, Diretor da Faculdade de Medicina. A este projeto embrionário juntava-se depois Thaís Russomano, médica brasileira formada em Medicina Aeroespacial e atualmente professora na mesma Faculdade.
Ser astronauta não era só vontade sua de criança, a verdade é que Edson dos Santos Oliveira contactou com a Medicina Aeroespacial, desenvolvendo uma investigação sobre a síndrome neuro-ocular induzida por voo espacial, um estudo que desenvolveu na NASA.
Já em jovem adulto tentou a sorte e o mérito de ser astronauta, mas não sendo esse o caminho viável, ficou o seu conhecido networking em tudo onde se envolve.
Dia 26 de abril juntavam-se vários parceiros para celebrar a concretização deste sonho. A Força Aérea Portuguesa e a Portugal Space como parceiros, Thaís Russomano e Edson Oliveira como coordenadores deste novo berço em Portugal que olha para o céu. A concretização, daquilo que poderia ser sonho ambicioso demais e desajustado, ouviu o apoiado sim de Fausto Pinto que lançava de resposta o desafio de se continuar a querer chegar mais longe, característica e ambição que tantas vezes falta aos portugueses, diz. A Edson Oliveira, Fausto Pinto acrescentou, “conhece o conceito Serendipity?”. Sinal de bons ventos que se traduziriam num investimento de cerca de 300 mil euros, só para a aquisição de aparelhos e desenvolvimento do CEMA.
Na celebração que recebeu especiais congratulações do Presidente da República Marcelo Rebelo de Sousa e inspirado incentivo do Reitor da Universidade de Lisboa, Luís Ferreira, várias foram as figuras que levaram a palco o tema do espaço. Guillaume Weerts, chefe da medicina espacial na European Space Agency (ESA), deu início às reflexões com a palestra Medical Challenges of Space Exploration. Seguiu-se a mesa redonda sobre “Os desafios da Medicina Aeroespacial em Portugal”, moderado por Fausto Pinto, onde marcaram presença o Ricardo Conde Presidente da Portugal Space, a Diretora de Centro de Medicina Aeronáutica, da Força Área Portuguesa, Marina Lopes e Edson Oliveira.
Numa antevisão da porta prestes a abrir, Thaís Russomano fazia a visita virtual, deixando antever um sonho prestes a começar.
Ligação ao Espaço extensível num acordo firmado entre a Faculdade de Medicina e a Portugal Space, através dos seus principais agentes, o compromisso tem em vista a colaboração na formação da medicina aeroespacial bem como na promoção de atividades nesta área
O CEMA não abriu a sua porta sem que antes se aplaudisse o descerramento da placa do novo e único centro de estudos em Portugal que estudará as reações do corpo humano face à alteração de gravidade.
Num fim de manhã de grande interação entre estudantes e Edson Oliveira, todos os modelos e máquinas foram testadas, fazendo o público levitar ou fisicamente, ou pela imaginação, pensando assim se qual será o próximo grupo a chegar ao céu. Perguntado a Edson Oliveira porquê investigar o Espaço num país como Portugal, a resposta foi “porque não?”.
Ligam entre a Terra e o Espaço uma distância de 8 minutos e 48 segundos. Dessa travessia e do que se passa no céu quanto à fisiologia humana, é aquilo que este centro vai estudar, em nome do futuro e da defesa de cada país.
Não podia pois ser mais certeiro o momento para Edson Oliveira celebrar, o dia em que o futuro entrou na Faculdade de Medicina.
Sejam bem-vindos ao futuro, nós já chegámos!
Fausto Pinto – Diretor da Faculdade de Medicina
“Temos de ser atores e nunca ficar satisfeitos com o que já temos, esse é o nosso papel nesta Instituição e como portugueses, não devemos achar nunca que somos menos”.
“Continuo a acreditar que a visão médica deve estar em permanente diálogo com a tecnologia”.
Marina Lopes – Diretora do Centro de Medicina Aeroespacial da Força Aérea
“A cada descoberta estamos mais perto de conquistar o Espaço”.
Ricardo Conde – Portugal Space
“A Europa tem um gap espacial face à América porque não tem capacidade ainda de lançar astronautas para o espaço. Nos EUA é a defesa que projeta os financiamentos do espaço. Mas a Europa precisa de mais resiliência no seu programa espacial. E as suas necessidades passam pela sua própria defesa e o Espaço faz parte desta dimensão ‘
“Aquilo que se pretende fazer no Espaço é colocar autocarros em órbita e alugar a estações militares espaciais, esta é uma forma de assegurar o batalhão bélico”.
“A grande aposta é o triângulo terra, lua e Marte que têm sistemas de posicionamento com constelações para permitir a construção de hubs”.
“Estamos a falar de uma nova economia em órbita”.
“A importância do machine learning vai permitir substituir o médico dos astronautas que estão no Espaço e precisam de feedback imediato e não de vários minutos de espera”.
Edson Oliveira – Neurocirurgião e Coordenador do Centro de Estudos de Medicina Aeroespacial
“A situação do corpo humano em órbita também nos dá uma perspetiva mais real do homem na Terra”.
“Hoje começa o futuro!”.
Joana Sousa
Equipa Editorial