Várias foram as vezes que a encontrámos ao longo destes últimos meses, diante de dias de chuva, ou sol, com um frio gélido, ou uma humidade tropical. Quem espera pela sua vez para fazer o teste Covid, percebe bem como as adversidades climatéricas interferem no seu estado físico de desconforto que, no entanto, nunca lhe tira a delicadeza de receber cada pessoa como se fosse a primeira vez.
Os testes que se iniciaram num espaço devidamente protegido dentro do Edifício Reynaldo dos Santos passariam pouco depois para a garagem, já que o volume de pessoas testadas aumentava exponencialmente.
Desde novembro de 2020 que o ritual lhe exige vestir o equipamento de proteção individual (EPI), para iniciar a testagem aos vários elementos da Faculdade de Medicina que têm tido acesso gratuito a testes periódicos.
O cabelo longo escuro, a contrastar com a pele clara ficam escondidos no fato que pretende protegê-la dos pés à cabeça, das gotículas e fluídos corporais de pessoas que podem ser potenciais infetados. Da Ana Catarina Laborinho passa a ver-se apenas os olhos e mesmo esses só através de duas barreiras que a protegem, mas distanciam-nos da expressão do sorriso e do calor que às vezes lhe causa rápida exaustão.
Técnica Superior de Diagnóstico e Terapêutica, em Análises Clínicas e Saúde Pública, Catarina Laborinho é Doutorada em Fisiologia pela Faculdade de Medicina da Universidade de Lisboa, no Instituto de Fisiologia, onde exerce essencialmente tarefas de investigação, colaborando em vários projetos nacionais e internacionais. Quem a convidou a entrar neste novo desafio da testagem Covid foi Isabel Aguiar, a Diretora de Serviços da FMUL que tem assegurado a organização geral destes testes, sob a orientação do Patologista Clínico, o Professor Thomas Hanscheid.
Em dias de maior afluência, a fila adensa-se até à rampa da garagem. A controlar a ordem de chegadas está, por vezes, a Isabel, colaboradora das Instalações, que vai separando os grupos por duas filas; a fila 1 para funcionários e professores, a fila 2 onde encontramos os estudantes.
O processo é rápido para quem vai ser testado, mas para quem permanece numa média diária de duas horas em pé e dentro de um fato completo, já não é assim tão fácil tolerar o frio, ou o calor, organizar pessoas, zaragatoas e informação, sempre a sorrir. Sempre preocupada com o bem-estar de quem entra e vai ser testado, quem é a pessoa que está atrás do hermético fato que mal a deixa ver?
Como decorre o processo de testagem?
Catarina Laborinho: Os testes de pesquisa de antigénio, desenvolvidos para o diagnóstico do SARS-CoV-2, visam detetar proteínas específicas do vírus produzidas no trato respiratório. A tecnologia envolvida é semelhante a um teste de gravidez.
O procedimento, simples e muito prático de fazer por profissionais qualificados, realizado de acordo com as recomendações do fabricante, consiste essencialmente num teste rápido da pesquisa de antigénio,através da colheita de amostras de exsudado, normalmente da nasofaringe, utilizando uma zaragatoa adequada.
Após a colheita da amostra, a mesma é colocada numa solução tampão específica, sendo o resultado obtido em 15 minutos. Posteriormente, deverão ser efetuados os controlos negativos e positivos para validação do nosso trabalho. Posteriormente, todos os resultados são analisados e validados pelo Patologista Clínico, Professor Thomas Hanscheid, para então se poder proceder à respetiva divulgação.
Este procedimento já era algo que dominasse, ou foi novo para si?
Catarina Laborinho: Este tipo de colheita e procedimento tem de ser efetuado por um profissional especializado. A minha Licenciatura em Análises Clínicas e Saúde Publica, permitiu-me a mim e aos meus colegas de equipa, encontrarmo-nos bem preparados para efetuar este tipo de colheitas. Consistem em procedimentos a que facilmente conseguimos adaptarmo-nos, embora não façam parte da minha rotina laboratorial.
Como foi passar os piores meses de frio numa garagem, a testar e testar pessoas? O que se foi passando consigo dentro do fato?
Catarina Laborinho: Foi uma experiência diferente, algum frio sim, alguns dias menos fáceis, mas com o procedimento e este equipamento vestido, raramente aconteceu ter frio, mais frequentemente tenho calor. Às vezes não é fácil, mas não é nada demais, isto porque não passo aqui muitas horas. Uma a duas horas no máximo. Penso sobretudo em outros profissionais de saúde que estão nos hospitais e lares, por exemplo, pois esses de facto são os nossos heróis. Pena a população não reconhecer os seus esforços e toda a dedicação que têm tido, as horas dedicadas ao combate à pandemia, as horas que não estiveram com as suas famílias.
Calculo que ao longo destes vários meses já tenha algumas situações caricatas para contar.
Catarina Laborinho: Tenho várias situações engraçadas e sempre com algum humor envolvido, tenho conhecido pessoas fantásticas, que de outro modo não me teria cruzado com elas, desde alunos a colaboradores. Às vezes apanho algumas pessoas algo assustadas e com receio de fazerem o teste, de ter um resultado positivo, ou do procedimento, mas tento sempre criar alguma empatia prévia com a pessoa a quem vou realizar o teste. Apanhei um ou outro caso de haver queixas e nem sequer tinha introduzido a zaragatoa, mas compreendo que o teste não seja agradável.
Tento que este procedimento não seja uma coisa penosa.
Neste período todo de contacto com tantas pessoas, nunca teve medo de ficar infetada?
Catarina Laborinho: Sim, claro que tive algum receio, tive receio sobretudo na altura inicial, em que se sabia pouco sobre o vírus, e essencialmente tenho um respeito enorme por todos os que combatem esta pandemia. Há sempre algum receio, porque é uma doença sobre a qual ainda haverá muito a descobrir, desconhecendo-se os efeitos a médio e a longo prazo.
Tive receio essencialmente de poder ser uma fonte de transmissão do vírus, mas sempre tivemos muito cuidado, nomeadamente usando todos os equipamentos de proteção individual necessários e cumprindo todos os protocolos de segurança, para evitar qualquer contágio.
Por outro lado, como profissional de saúde tenho que estar onde devo para cumprir as minhas funções, e neste momento não faria sentido eu não poder estar a fazer a minha parte.
Este projeto tem sido muito recompensador e tem funcionado muito bem, porque somos uma equipa fantástica e trabalhamos muito bem em equipa.
Joana Sousa
Equipa Editorial