A FMUL manifesta o seu profundo pesar pelo desaparecimento da Professora Maria de Sousa, apresentando as suas condolências à família enlutada
Sólida cientista, professora e autora de diversas publicações, a prodigiosa aluna da Faculdade de Medicina da Universidade de Lisboa, que se formaria em 1963, viria a tornar-se referência mundial na área da Imunologia.
Maria de Sousa morreu esta madrugada não resistindo à infeção contraída pelo vírus SARS-COV-2. Tinha 81 anos. Aclamada Professora Catedrática de Imunologia do Instituto de Ciências Biomédicas Abel Salazar, no Porto e elemento integrante do júri do Prémio Pessoa, desde 1984, atribuiu, juntamente com Francisco Pinto Balsemão, Mário Soares, Eduardo Souto de Moura ou Clara Ferreira Alves, o Prémio que pretendia homenagear em vida aqueles que apresentam obra única e de mérito. Mérito esse que reclamou ainda há poucos meses junto de uma plateia no Grande Auditório João Lobo Antunes, na FMUL, composta por grandes nomes da ciência e do ensino médico, afirmando que “era lamentável que as pessoas não sejam devidamente recordadas com a importância que merecem” e em vida.
Mas Maria de Sousa conseguiu essa aclamação bem cedo e por mérito próprio. Um ano após a sua formação em Medicina, ganhou uma bolsa da Fundação Calouste Gulbenkian. Entre 1964 e 1966, seguiu então para Londres onde frequentou os Laboratórios de Biologia Experimental do Imperial Cancer Research Fund, fazendo assim uma das coisas que mais alimentava a sua alma, a investigação científica. Passou pela Universidade de Glasgow, na Escócia, onde em 1972 fez o doutoramento em Imunologia. Só a partir de 72 muda-se para os Estados Unidos e torna-se investigadora na área do cancro.
Mudaria o rumo do conhecimento geral do mundo quando verificou que os linfócitos, que se julgavam ser apenas originários do timo (glândula do sistema imunológico junto ao coração e que produz os linfócitos T), não era a única forma de “subsistência” desses linfócitos. Em experiências de laboratório, com ratinhos, ao tirar-lhes o timo, verificou que havia na mesma migração de linfócitos, mesmo sem timo, e que os órgãos linfáticos periféricos continuavam a ter estas células. No entanto, nos casos em que se tinha retirado o timo, apresentavam-se espaços vazios que deveriam ser ocupados pelos linfócitos do timo. Foi aí que percebeu que havia áreas concretas nos órgãos linfáticos periféricos apenas para os linfócitos T, atualmente conhecidas por áreas T.
Portugal não abraçava o ritmo inovador que se praticava na ciência lá fora. Talvez essa missão de implementar no ensino aquilo que a própria aprendera fez com que Maria de Sousa regressasse a Portugal em 1984, num período em que já se respirava livremente e sem tantos entraves políticos. Na última vez que a Faculdade de Medicina a recebeu como uma das figuras máximas da Ciência, Maria de Sousa fez questão de mostrar que há muito ainda a fazer, afirmando que “há muitos legados desta casa (FMUL), e que seria bom tê-los todos juntos e ter deles o seu melhor, pois cada um de nós tem uma esfera de influência, mas ela sozinha não é tão forte, precisa de investimento. Esta é a verdadeira criação das Escolas, uma atmosfera onde os outros possam verdadeiramente respirar o que é importante”.
Em 2010, é-lhe atribuído o título de Professor Emérito da Universidade do Porto. Em 2012 o Presidente da República, Cavaco Silva, distingue-a como Grande-Oficial da Ordem Militar de Sant'Iago de Espada. E em 2016, Maria de Sousa é elevada a Grã-Cruz, já na Presidência de Marcelo Rebelo de Sousa, recebendo assim uma das mais altas distinções atribuídas por mérito científico.
Em jeito de mensagem de despedida, a mulher que poderia querer abraçar o mundo a si, como se fosse detentora máxima do conhecimento, fez questão de terminar com uma mensagem de esperança, esperança que deposita no sangue novo. “São muito importantes os movimentos que se fazem de baixo para cima. Entre os 35 e 45 anos é quando as pessoas se devem afirmar enquanto líderes, mas o sistema não tem gente nova a liderar. É preciso informar bem a Ciência. E nós só a falamos para nós próprios, mas não vêm pessoas de fora saber o que já fizemos”.
Talvez menosprezando demais o seu papel e importância, uma coisa lhe negamos, o mundo conhece-a sim, porque contribuiu nos avanços de descobertas importantes e essas estão assinadas nos livros do mundo e nos tantos artigos científicos que publicou. Quanto às homenagens em vida, não só as proporcionou a muitas, como as recebeu nobremente, dos mais altos cargos deste país que hoje lamenta profundamente a sua perda.
A sua Faculdade de origem e aquela que tanto se orgulha de a ter como referência desde o seu berço de olhar atento para o mundo, lamenta a sua partida, mas acima disso louva-a e homenageia-a agradecendo-lhe, em nome do Ensino, em nome da Ciência.