
É só no dia 1 de dezembro que a data é assinalada, mas todos os dias são dias importantes para recordar que a SIDA não desapareceu, apesar de não estar na agenda do dia.
Os últimos dados relativos ao HIV estão publicados na página do Ministério da Saúde e referem que em 2020 foram 870 os novos casos, seguidos de 923 no ano seguinte. Mas há mais dados, “a maioria (71,8%) dos novos casos de infeção em adolescentes e adultos (≥ 15 anos) registou-se em homens (2,5 casos por cada caso em mulheres) e a mediana das idades à data do diagnóstico foi de 39 anos. Em 63,6% dos novos casos as pessoas tinham entre 25 e 49 anos e em 27,6% tinham idade igual ou superior a 50 anos. No período em análise foram notificados 4 casos de infeção VIH em crianças (2 em 2020 e 2 em 2021).”
A Cristina Calca é um dos rostos do HIV em Portugal e não tem pudor em contar a sua história. Não consegue situar o momento em que soube que era portadora, mas aponta para 2015, quando uma sucessão de infeções e uma pneumonia levaram-na a procurar um médico. As análises vieram pouco depois e o diagnóstico caiu-lhe em cima como uma bomba.
Contar aos pais foi difícil, mas foram os primeiros a saber. Lidar com o peso da doença não foi fácil e nos primeiros tempos decidiu ignorar. Faltou às consultas, mas protegeu-se sempre nas relações, afinal, não queria fazer aos outros, o que lhe fizeram a ela. Cristina conta que foi deliberado. “Ele não queria ficar comigo, mas queria marcar-me” e marcou. Na altura, “não sabia que isto era crime, se não teria feito alguma coisa.”
Depois do primeiro embate, começou a ir às consultas, a fazer a medicação e hoje toma apenas dois comprimidos, “que optei por tomar à noite” e esclarece, “não faço parte da velha guarda que tomava 10 ou 20 comprimidos por dia com todos os efeitos secundários que isso acarreta”, mas admite, “hoje é mais fácil viver com a doença.” O que não mudou foi o estigma e os olhares ainda desconfiados e moralistas. “Mesmo nos hospitais sinto isso”, admite.
O HIV e a SIDA continuam a fazer vítimas, apesar da realidade de hoje ser completamente da que havia há 20 anos. Receber um diagnóstico destes era quase uma sentença de morte e hoje transformou-se numa doença crónica, onde os retrovirais permitem manter uma carga viral tão baixa que inviabiliza o contágio.
A aposta na prevenção continua a ser a palavra chave e por isso é tão importante falar na doença e relembrar que continua a existir e que todos somos um alvo potencial.
A Cristina Calca está ligada a Associação Abraço que recebeu uma equipa do CHULN para gravar o seu testemunho que vai fazer de uma série de outros, que vão ser divulgados mais próximo do Dia Mundial de Luta contra a SIDA.