“A comunidade científica está globalmente a estudar todos os dados desta pandemia”
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senhora de cabelo curto

O Dia Mundial do Cérebro de 2020, que se assinala num ano marcado pela pandemia de Covid-19, foi o ponto de partida para o comentário de Luísa Lopes, Neurocientista, Professora Convidada na FMUL e investigadora principal no iMM, à SIC Notícias, em que explicou o que se sabe até ao momento sobre o impacto da doença provocada pelo novo coronavírus no cérebro.

Em entrevista à SIC Notícias, Luísa Lopes sublinhou que “estamos a viver a Ciência em tempo real”, sendo que a investigação desenvolvida até ao momento indica que as manifestações neurológicas da covid-19 estão relacionadas “com o processo inflamatório em si e não com a infeção do vírus”, à semelhança do que acontece com outras infeções virais que apresentam manifestações neurológicas, conforme explicou. “São casos raros”, denota Luísa Lopes, adiantando que “em relação à covid-19 há relatos, de facto, que pode haver um aumento do risco de enfartes, há portanto fatores de coagulação que estão de alguma forma mais exacerbados”, revela, mencionando um estudo recente realizado em Nova Iorque que parece corroborar a tese de um risco superior ao existente, por exemplo, na gripe. Quanto ao porquê ainda não se conhece informação rigorosa. “Nós sabemos que o SARS-Cov-2, em princípio, não infeta os neurónios, infeta sobretudo o trato respiratório superior. O cérebro é muito resguardado, é muito raro termos vírus que infetem diretamente o cérebro”. No entanto, “o que acontece é que, por causa de um processo inflamatório, a barreira hematoencefálica que impede que os vírus e agentes patogénicos entrem, pode ficar comprometida e, portanto, pode haver vírus no cérebro. Para além disso, a chamada tempestade de citocinas pode causar danos nos vasos e aumentar a probabilidade de existência de coágulos”.

Para além das consequências neurológicas, Luísa Lopes alertou para as consequências mentais da pandemia, derivadas do isolamento, da incerteza e do stress face à situação económica, apontando os vários estudos científicos atualmente em curso. “Nós sabemos que há um aumento da incidência das doenças mentais, sabemos que há uma linha de apoio que as pessoas podem usar, mas de facto só saberemos mais daqui a algum tempo”, sublinhado que se trata de uma realidade para a qual devemos “estar todos atentos e conscientes”.

Neste Dia Mundial do Cérebro, Luísa Lopes aproveitou também para reiterar a importância de suprimir o estigma na procura de ajuda para enfrentar esse tipo de problemáticas, partilhando algumas dicas para preservar a saúde mental em tempo de pandemia, nomeadamente, manter a interação social, “encontrar formas alternativas de ocupar o nosso tempo” (com o devido respeito pelas medidas de contenção e segurança) e “tentar tirar um bocadinho a nossa mente de tudo o que são notícias covid”.

A Professora que estuda como é que o envelhecimento afeta a memória destaca ainda, que a atual pandemia, “do ponto de vista académico, está muito ligada ao envelhecimento”. “Nós nunca falamos tanto em envelhecimento como agora, porque um dos factores de risco é, de facto, a idade. Parece haver mais recetores que são sensíveis ao vírus, além das complicações que as pessoas já têm”, tornando esse grupo da população mais frágil.

Luísa Lopes comentou os estudos que estão em curso, com o objetivo de compreender “se as pessoas mais idosas têm mais problemas mentais ou será que esta infeção aumenta o risco de doenças neurodegenerativas”, algo que só saberemos daqui a alguns anos. Entretanto, conforme declarou à SIC Notícias numa entrevista a rever aqui, “a comunidade científica está globalmente a estudar todos os dados desta pandemia”.