Estamos onde tu estás.
A Biblioteca à distância de um clique.
Nunca os slogans há muito usados pela área de Biblioteca e Informação, para divulgar a Biblioteca Digital, fizeram tanto sentido. Nos últimos anos, o investimento feito em recursos eletrónicos (que complementam a coleção em papel) fez desta Biblioteca uma das melhores bibliotecas de saúde do país, colocando-a numa posição confortável também no panorama internacional. Tudo isto tornou-a capaz de lidar com os desafios mais inesperados, incluindo uma pandemia como esta que hoje nos assola.
Somos uma Biblioteca híbrida, com um espólio riquíssimo, cuja história remete para a Livraria Cirúrgica da Escola de Cirurgia (1815), antecedendo a própria criação da Real Escola de Cirurgia em 1825. Orgulhosa do seu passado, mas com uma visão dirigida para o futuro, a Biblioteca posiciona-se como um serviço de suporte, alinhando a sua estratégia de atuação com os objetivos definidos para a FMUL e de acordo com os níveis de excelência e qualidade promovidos pela ULisboa.
A equipa tem por lema “trabalhar sempre em prol das necessidades do utilizador e dos seus interesses, chamando a si a responsabilidade de desenvolver incessantemente as suas capacidades profissionais e de relacionamento humano, revelando interesse pelo evoluir das tecnologias da informação, pesquisando novas fontes de informação em saúde, de modo a estabelecer com o utilizador uma cumplicidade profissional que conduza à excelência dos serviços prestados”.
No momento atípico que se vive, mais do que nunca, assumimos a responsabilidade e o compromisso de garantir a melhor resposta às necessidades criadas por este novo e estranho quotidiano.
Quando, a meio de março, encerrámos os espaços físicos, passando a assumir funções em teletrabalho, foi para nós um desafio, mas também uma oportunidade. Não sabíamos o que nos esperava, por quanto tempo a pandemia iria constringir as nossas vidas, como nos iríamos adaptar a esta nova realidade. Em boa verdade, ainda o não sabemos. O que sabíamos era que tínhamos os recursos e as competências necessárias para manter o apoio ao utilizador e assim cumprir a nossa missão. Tivemos, pois, que nos reorganizar e tirar partido de todas as valências de que dispomos. Passámos a planear a curto prazo, semana a semana, mês a mês, num exercício de adaptação e motivação constantes. Fisicamente distantes, mas sempre em equipa, sempre com a consciência de que estamos todos no mesmo barco (curiosamente, a palavra equipa deriva do francês équipe, que remete para a noção de um grupo de pessoas que tem um fim comum, referindo-se habitualmente à tripulação de um esquife, mas também para os meios necessários – o equipamento – para que alguém possa exercer a sua atividade).
Neste sentido, reforçar a estratégia de comunicação foi essencial para que todos soubessem que continuamos abertos mesmo que fechados, presentes mesmo que ausentes, enfim, ligados a um, ninguém, cem mil, por um fio, por uma rede, por uma internet (ironicamente, eis que fomos recordados da velha noção de internet, isto é, um sistema global específico de redes com o propósito de servir utilizadores de todo o mundo), à distância de um clique, um e-mail, um telefonema ou uma sessão Zoom.
Ultrapassadas as primeiras dificuldades que alguns utilizadores sentiram na configuração da VPN e no acesso remoto aos recursos – eBooks, publicações periódicas, bases de dados de apoio ao ensino, investigação e prática clínica, outros desafios se impuseram. Para além da Covid-19, a pandemia fez emergir novos perigos. A explosão de informação atingiu dimensões nunca antes vista, e deu-nos uma responsabilidade maior: separar o trigo do joio e minimizar os efeitos da “infodemia” instalada. Nunca a Ciência esteve tão exposta, nunca o acesso a informação científica credível foi tão essencial. Por todo o mundo, as bibliotecas de saúde e os seus profissionais assumem um papel relevante na identificação e divulgação de recursos, no estabelecimento de protocolos de colaboração com editores, no apoio à pesquisa de informação e formação de utilizadores que, pela primeira vez, passámos a fazer à distância, concretizando um objetivo antigo, tantas vezes adiado.
Nesta fase, tornou-se mais visível o trabalho da equipa da Unidade de Difusão da Informação e Biblioteca Digital e da Unidade de Apoio ao Ensino e Investigação. No entanto, importa salientar que o trabalho ligado à Biblioteconomia, Arquivo Histórico e Património Museológico, continuou a ser feito, garantindo resposta a áreas que, embora mais tradicionais e menos visíveis, são igualmente importantes.
E porque a Biblioteca não se encerra em si mesma, a rede de colaboração interna e externa também foi reforçada. Alguns de nós integram a equipa de apoio ao ensino à distância, acompanhando aulas e exames. Outros, participam no projeto de responsabilidade social Ajude esta Causa! O apoio a outras bibliotecas nacionais e internacionais é também uma constante. A colaboração com a rede de Bibliotecas parceiras da European Association of Health Information Libraries permitiu-nos, por exemplo, apoiar colegas da Biblioteca do Hospital Policlínico de San Matteo, em Pavia, Itália, num momento especialmente difícil e que ficará para sempre na nossa memória como uma experiência gratificante.
Enquanto as condições de segurança assim o exijam, continuaremos maioritariamente em teletrabalho, com o enfoque nos recursos digitais. Contudo, para responder às necessidades pontuais de acesso a documentação não disponível em formato digital, nomeadamente documentos do arquivo histórico, o atendimento presencial continua a ser possível, mediante marcação prévia e no cumprimento das normas de higiene e segurança. Nenhum utilizador ficará sem resposta.
Creio que esta experiência deixará marcas profundas nas nossas vidas pessoais e profissionais, na forma como se faz, se disponibiliza, se acede e avalia a Ciência, nas metodologias de ensino e aprendizagem, e no papel que as bibliotecas e os bibliotecários de saúde têm no apoio à comunidade académica. Os desafios são grandes, mas as oportunidades serão proporcionais, ou pelo menos do tamanho da nossa resiliência, motivação e disponibilidade para a mudança.
Quando olharmos para trás, e esse momento chegará, certamente que nem tudo terá sido perfeito, podíamos ter feito diferente, mais ou melhor, mas tenho a certeza que o balanço será positivo e que seremos gratos pelas condições que nos foram garantidas e pela forma como a nossa escola soube responder a estes tempos difíceis. Porque, como dizia, somos uma equipa que está no mesmo barco a remar no mesmo sentido, com todos os meios necessários para que o rumo seja cumprido, ainda que o sentimento atual seja aquele que tão bem Otto Neurath descreveu: “Somos como marinheiros que têm de reconstruir o seu barco em alto mar sem nunca dispor de uma doca seca para o desmantelar e o reconstruir com os melhores materiais.” Somos Biblioteca, somos FMUL.
Susana Oliveira Henriques
Bibliotecária - Chefe de Divisão da Área de Biblioteca e Informação